08 outubro 2003

Estórias com mural ao fundo - III: O stresse do executivo

Esta é a fábula de um alto executivo de um grande banco (tirem o cavalinho da chuva, que não é o BCP!)... Stressado devido à enorme carga de trabalho a que tinha estado sujeito nos últimos meses em resultado da reestruturação dos serviços e do despedimento de algumas centenas de colaboradores, entrou em colapso nervoso e foi ao médico. Relatou ao psiquiatra o seu caso. Torturava-o a ideia de não ter escolhido as pessoas certas que, depois de uma vida dedicada ao Banco, foram mandadas para casa em situação de pré-reforma.



O médico, experiente, logo diagnosticou ansiedade, tensão, insegurança, culpa e outros sintomas de burnout. Disse ao paciente:

- O senhor engenheiro precisa se afastar, no mínimo por duas semanas, da sua actividade profissional. O ideal era sair de Lisboa, ir para o interior, desligar-se completamente dos negócios e procurar algumas actividades, de preferências físicas e ao ar livre, que o relaxem.



O nosso executivo procurou seguir à letra as orientações do médico. Deixou o telemóvel e o portátil em casa, pegou apenas em dois romances e nuns tantos CD de Mozart e partiu para a quinta da família no Alto Minho.



Passados os primeiros dias, o nosso executivo já havia lido os dois livros e ouvido quase todos os CD. Continuava deprimido. Pensou então que alguma actividade física seria um bom antídoto para a angústia que ainda o dominava, conforme expressa recomendação do psiquiatra.



Chamou o caseiro da quinta e pediu para fazer algo que o "fizesse suar e mortificar o corpo", uma expressão que lhe ocorreu e que lhe era familiar, ouvida muitas vezes da boca de um tio-avô que morrera no convento, um exemplo de santo e de asceta. O caseiro ficou pensativo até ver um monte de estrume que acabava de ser descarregado do tractor.



Disse ao nosso executivo:

- O Sr. Engenheiro se quer mesmo sujar as mãos, pode ir espalhando aquele – com a sua licença ! - estrume, em toda aquela área que estamos a preparar para o cultivo da batata. Ali junto ao laranjal...



Pensou para consigo: "Coitado do home, nem sabe onde se vai meter! É coisa para gastar dois ou três dias!". Puro engano. No dia seguinte o nosso turista já tinha espalhado o estrume por toda a área. Eufórico, pediu logo uma nova tarefa.



O caseiro então disse-lhe:

- Temos ainda muitas laranjas por apanhar... O Sr. Engenheiro, se não se importa, fará o favor de levar três cestos e ir distribuindo as laranjas por tamanho: pequenas, médias e grandes. Umas vão para o mercado e outras são para consumo cá da casa.



Ao fim do dia o senhor administrador ainda não tinha voltado do pomar.. Preocupado, o caseiro dirigiu-se ao local. A cena que viu foi a seguinte: estava o nosso homem com uma laranja na mão, os cabelos em pé, os cestos totalmente vazios, falando consigo mesmo:



- Esta é grande... Não, é média! Ou será pequena?

- Esta é pequena.... Não, é grande! Ou será média?

- Esta é média.... Não, é pequena! Ou será grande ?



Moral da história:



Foi o próprio caseiro da quinta quem tirou sabiamente as devidas ilações desta estória (com mural ao fundo):



- Fazer e espalhar merda, com a sua licença !, é fácil. O que é difícil na vida é tomar as decisões certas, pensando não no momento presente mas no futuro.

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