blogue-fora-nada. homo socius ergo blogus [sum]. homem social logo blogador. em sociobloguês nos entendemos. o port(ug)al dos (por)tugas. a prova dos blogue-fora-nada. a guerra colonial. a guiné. do chacheu ao boe. de bissau a bambadinca. os cacimbados. o geba. o corubal. os rios. o macaréu da nossa revolta. o humor nosso de cada dia nos dai hoje.lá vamos blogando e rindo. e venham mais cinco (camaradas). e vieram tantos que isto se transformou numa caserna. a maior caserna virtual da Net!
21 abril 2006
Guiné 63/74 - DCCXXIII: Apresenta-se o Imediato da NRP Orion (1966/68) e 1º tenente da reserva naval Lema Santos
O Lema Santos de ontem (1º tenente da marinha em 1972, que serviu como Imediato na NRP Orion, na Guiné, entre 1966 e 1968) e o de hoje (2004), empresário, residente em Massamá.
Julgo que é o Lema Santos é o primeiro oficial da classe de marinha que nos contacta e pede licença para entrar na nossa caserna... de tropa-macaca. É óbvio que o vamos receber de braços abertos: estamos todos de acordo que a história da guerra da Guiné só pode fazer-se juntando a malta dos três ramos das Forças Armadas Portugueses mais os nossos queridos turras. Até à data, e nas vésperas de completarmos um ano de existência, as tropas especiais, bem como a malta da marinha e da força aérea, está ainda subrepresentada na nossa tertúlia. Seria interessante tentar saber porquê...
Ao falar com este camarada pelo telefone, constatei que ele conhece todos os rios da Guiné, é um excelente contador de histórias, tem uma memória fotográfica e possui uma vasta rede de contactos pessoais e sociais... Welcome to board, captain!
© Lema Santos (2006)
1. Texto do Manuel Lema Santos, que me foi enviado em 5 de Abril de 2006 e que só agora, por razões de agenda (leia-se: engarrafamento de tráfego...), chega ao conhecimento dos nossos tertulianos (com o pedido de desculpas ao próprio, com quem já tinha tido uma longa e agradável conversa ao telefone).
Prezado Luis Graça,
Tenho seguido com atenção cuidada a descoberta do Blogueforanada e tenho de te cumprimentar porque, com esforço e determinação, conduzes naquele andamento tão espinhosa tarefa.
Estão satisfeitos, por certo, todos os bloguistas pela disponibilidade que lhes facultaste de se exprimirem livremente, sobre tão sensíveis quanto subjectivos temas, criticando, opinando, partilhando, mas também revivendo épocas tão conturbadas como controversas.
Também eles estão de parabéns porque o fazem por vontade própria, sem reservas, servindo uma causa comum: pesquisa e regresso ao passado, com esclarecimento e sem fantasmas.
Resumidamente, escreve-se história. Muitas vezes, tão do foro intímo de cada um que a exposição pública se torna penosa e de difícil conciliação pessoal.
Para mim não é diferente e daí o ter procurado o teu - quão difícil é assumir este teu - contacto pessoal telefónico para me apresentar previamente, no rigoroso respeito da ideia de quem, sabendo que pode partilhar igualmente informação interessante, sente alguma inibição em levar essa colaboração à prática.
Diga-se, em abono da verdade, que passei a estar em dívida contigo, pelo teu tempo pessoal disponibilizado à nossa conversa e simultaneamente à minha apresentação.
Guiné é tema único e também lá estive, envolvido naquela dramática vivência!
Não consigo compreender, no meu modesto entendimento e sem noções concertadas de estratégia militar, como é possível escrever a estória da Guiné sem estar a ela associada a própria história da Marinha de Guerra, conjuntamente com a história dos outros dois ramos das Forças Armadas.
Fui oficial da Marinha de Guerra da Reserva Naval, o que equivalia, em termos práticos, aos seus pares congéneres milicianos do exército. Não mais do que universitários, licenciados ou em vias disso, que, tendo de cumprir num horizonte próximo e ao serviço da cidadania o serviço militar obrigatório, optavam pela inscrição nesse ramo das Forças Armadas, vindo posteriormente a ser seleccionados ou não, de acordo com as exigências e os resultados dos testes prestados no ramo.
Fui apenas um entre os quase 3000 oficiais da Reserva Naval que, entre 1958 e 1982, desfilaram naquela Instituição; daqueles, cerca de um milhar terão desempenhado missões de serviço nas antigas colónias portuguesas, entre 1961 e 1975.
No meu caso, depois de um curso de seis meses na Escola Naval, a viagem de instrução de cadete e o juramento de bandeira com promoção a Aspirante (Outubro de 1965 a Maio de 1966) marcaram, em sucessão, instrução e formação, camaradagem, também crescimento.
Depois, já promovido a Subtenente, o destacamento para uma unidade naval na Guiné, o NRP Orion - P362 (LFG - Lancha de Fiscalização Grande) onde fui oficial Imediato de Maio de 1966 a Abril de 1968; uma unidade naval de 42 metros, com 2 oficiais, 4 sargentos e 22 praças entre outras 6 idênticas (Argos, Dragão, Hidra, Lira, Cassiopeia e Sagitário).
Seguiram-se inúmeras operações, apoios à navegação (LDG's, LDM's, LDP's, TT's, embarcações e batelões) e oceanografia, escoltas, fiscalização, transportes, ataques e respostas, evacuação de feridos, prisioneiros e até transporte de agentes da PIDE.
Na memória que o tempo em mim não apaga, esfumam-se relatos, acontecimentos, documentos, registos, afinal também História. Em tudo idêntica no tempo à que tenho vindo a ler no Blogueforanada mas, muito mais do que idêntica, complementando-se mutuamente.
Do Cacheu a Norte ao Cacine no Sul, com o Mansoa, Geba, Corubal, Grande de Buba, Tombali e Cumbijã pelo meio.
Numa enorme bolanha em que as marcas radar, a sonda e algumas vezes a sorte, nos serviam de anjos anti-encalhe.
Bijagós, mais um nome, mas num mundo à parte! Cabo Verde nas obrigatórias e periódicas docagens nos estaleiros.
Sem grande possibilidade de lhes soletrar os nomes que a memória aí não chega, o meu cumprimento a todos os militares do exército com quem convivi, especialmente no Cacheu, Barro, Ganturé (Bigene), Farim, Caió, Bissau, Nhacra, Mansoa, Bolama, Cacine, Cabedú e muitos outros locais, sem esquecer uma aventura radical na forma de uma ida a Cameconde, a 8 km de Cacine.
Foi ainda possível, vejam só, em 13 de Setembro de 1966 (alguém presente?) embarcar, em Cabedú, a companhia ali estacionada e, na LDM 307, transportá-la até à Ilha de Melo, efectuar um desembarque - nome de operação: SOL -, aguardar a praia-mar, voltar a reembarcar a companhia, levá-la de volta ao aquartelamento e regressar ao patrulha.
Éramos nómadas, mas nunca teria sido possível por o pé em terra em alguns locais sem lá estar o exército ou levarmos fuzileiros. Noutros, não teria sido possível lá passar, quem sabe?... sem o apoio dos T6 ou dos Fiat da FA. Na memória o som (a soundblaster possível na época) dos diferentes tipos de "instrumentação" utilizada nos "jogos de guerra", aquando das escoltas que efectuávamos nos abastecimentos ao aquartelamento de Bedanda (tenho material de som gravado).
Cafine, Cadique, Cufar, canhão sem recuo incluídos ou as peças anti-carro 57 mm com que éramos brindados na barra do Cacine, podiam ser bons exemplos mas os RPG's no Cacheu, a montante de Barro (Porto Coco, Jagali, Tancroal) e antes de Binta, também eram aperitivos a evitar.
Depois de 2500 horas de navegação e dois anos decorridos, o regresso ao Continente, já como 2º tenente. Família constituída e a necessidade de completar a minha formação académica e profissional levaram-me a prorrogar, por mais algum tempo, a minha permanência na Velha Escola. Em 1972, promovido a 1º tenente, pedi a passagem à disponibilidade.
Num passado comum a preservar, a minha homenagem pessoal a todo o enorme grupo de marinheiros da Marinha de Guerra que, ao longo de 13 anos, mantiveram bem alto a fasquia de valores pessoais e militares naquele território, lembrando especialmente aqueles para os quais, a implacável lei da vida, tornou o percurso mais curto.
Estarão sempre connosco.
Disponham do meu modesto conhecimento para qualquer colaboração entendida como útil.
Um abraço,
Lema Santos
Anexo: 2 fotos pessoais (1972 e 2004) - o facto de gostar de fotografia desde muito novo leva a que, de mim, a família tem poucas fotos.
2. Ficha pessoal do novo membro da nossa tertúlia, que me foi enviada nestes termos: "Na sequência da nossa conversa telefónica e para evitar complicações de apresentação, tomo a liberdade de te enviar uma ficha descritiva do meu perfil pessoal bem como os meus contactos. Grato pela disponibilidade e abertura que demonstraste. Um abraço e dispõe,
Manuel Lema Santos"
Nome > Manuel Lema Pires dos Santos (normalmente omito o Pires pelo facto de o não utilizar desde há muito)
Idade > 63 anos
Estado civil > Casado com Maria João Lema Santos, economista, com dois filhos de 21 e 17 anos respectivamente; 2 filhas de 1º casamento (37 e 36 anos respectivamente)
Formação académica:
(i) Liceu Pedro Nunes de 1952 a 1959; (ii) Curso de engenharia mecânica do IST, incompleto na licenciatura (6º ano da antiga reforma); (iii) Escola Naval (Curso Especial de Oficiais da Reserva Naval - 8 º CEORN) de Outubro de 1965 a Maio de 1966; (iv) Viagem de Instrução no NRP Corte Real em Abril de 1966, juramento de bandeira e promoção a Aspirante.
Formação Militar:
- Nomeado Imediato do NRP ORION - P 362 (guarnição de 2 oficiais, 4 sargentos e 22 praças), com promoção a SubTenente, em serviço na Guiné.
- Embarque para a Guiné em 31 de Maio de 1966.
- Permanência naquele lugar até 24 de Abril de 1968, cumpridas cerca de 2500 horas de navegação e algumas idas a Cabo Verde (Mindelo) para alagem (docagem).
- Promoção a 2º Tenente em 31 de Maio de 1967.
- No regresso e até Agosto de 1968, formador no Grupo nº 1 de Escolas da Armada (Vila Franca).
- De Agosto de 1968 a Maio de 1970, ajudante de Ordens do Comandante Naval do Continente e Base Naval de Lisboa
Formação Profissional:
- De Maio de 1970 a Novembro de 1972 dirigi, a pedido e como adjunto, o Serviço de Publicações do Estado Maior da Armada, primeiro estágio profissional na indústria gráfica, ramo que abracei até hoje.
- Promovido ao posto de 1º Tenente em Novembro de 1972, tendo pedido a passagem à disponibilidade.
- Final de 1972 - Admitido como Director de Produção da Livraria Bertrand (parque industrial da Venda Nova - Amadora); pedida a demissão em Fevereiro de 1977.
- Março de 1977 - Admitido como Chefe de Produção da Avery Portugal - B. Nascimento, Lda.; diversos estágios realizados na Alemanha, Dinamarca, Suécia e Espanha no âmbito da mesma indústria gráfica (serigrafia e etiquetagem). Pedida a demissão em Março de 1983.
- Entre 1984 e 1987 ainda passei em duas outras empresas em lugar equivalente (Selegrafe, Litografia Amorim e Copinaque);
Formação complementar:
- Desde aquela altura e até agora, primeiro como empresário em nome individual e depois em sociedade com a mulher, em M. Lema Santos - Comunicação Gráfica, Lda., pequeno estúdio gráfico, de índole familiar, na área digital/pré-impressão/Internet.
Actividades diversas:
- De 1969 a 1981, presidente da Direcção de uma associação cultural e desportiva (Clube Arte e Sport).
- Desde 1997 sócio e colaborador na AORN (Associação dos Oficiais da Reserva Naval) tendo aceite o lugar de vogal neste último elenco directivo; por divergências em questões de fundo afastei-me no final de 2004.
Contactos:
Pcta. Infanta D. Catarina, 7B
Massamá Norte
2605-659 Belas
Telefs.: 21 4377053 / 21 4387205
Guiné 63/74 - DCCXXIII: Apresenta-se o Imediato da NRP Orion (1966/68) e 1º tenente da reserva naval Lema Santos
O Lema Santos de ontem (1º tenente da marinha em 1972, que serviu como Imediato na NRP Orion, na Guiné, entre 1966 e 1968) e o de hoje (2004), empresário, residente em Massamá.
Julgo que é o Lema Santos é o primeiro oficial da classe de marinha que nos contacta e pede licença para entrar na nossa caserna... de tropa-macaca. É óbvio que o vamos receber de braços abertos: estamos todos de acordo que a história da guerra da Guiné só pode fazer-se juntando a malta dos três ramos das Forças Armadas Portugueses mais os nossos queridos turras. Até à data, e nas vésperas de completarmos um ano de existência, as tropas especiais, bem como a malta da marinha e da força aérea, está ainda subrepresentada na nossa tertúlia. Seria interessante tentar saber porquê...
Ao falar com este camarada pelo telefone, constatei que ele conhece todos os rios da Guiné, é um excelente contador de histórias, tem uma memória fotográfica e possui uma vasta rede de contactos pessoais e sociais... Welcome to board, captain!
© Lema Santos (2006)
1. Texto do Manuel Lema Santos, que me foi enviado em 5 de Abril de 2006 e que só agora, por razões de agenda (leia-se: engarrafamento de tráfego...), chega ao conhecimento dos nossos tertulianos (com o pedido de desculpas ao próprio, com quem já tinha tido uma longa e agradável conversa ao telefone).
Prezado Luis Graça,
Tenho seguido com atenção cuidada a descoberta do Blogueforanada e tenho de te cumprimentar porque, com esforço e determinação, conduzes naquele andamento tão espinhosa tarefa.
Estão satisfeitos, por certo, todos os bloguistas pela disponibilidade que lhes facultaste de se exprimirem livremente, sobre tão sensíveis quanto subjectivos temas, criticando, opinando, partilhando, mas também revivendo épocas tão conturbadas como controversas.
Também eles estão de parabéns porque o fazem por vontade própria, sem reservas, servindo uma causa comum: pesquisa e regresso ao passado, com esclarecimento e sem fantasmas.
Resumidamente, escreve-se história. Muitas vezes, tão do foro intímo de cada um que a exposição pública se torna penosa e de difícil conciliação pessoal.
Para mim não é diferente e daí o ter procurado o teu - quão difícil é assumir este teu - contacto pessoal telefónico para me apresentar previamente, no rigoroso respeito da ideia de quem, sabendo que pode partilhar igualmente informação interessante, sente alguma inibição em levar essa colaboração à prática.
Diga-se, em abono da verdade, que passei a estar em dívida contigo, pelo teu tempo pessoal disponibilizado à nossa conversa e simultaneamente à minha apresentação.
Guiné é tema único e também lá estive, envolvido naquela dramática vivência!
Não consigo compreender, no meu modesto entendimento e sem noções concertadas de estratégia militar, como é possível escrever a estória da Guiné sem estar a ela associada a própria história da Marinha de Guerra, conjuntamente com a história dos outros dois ramos das Forças Armadas.
Fui oficial da Marinha de Guerra da Reserva Naval, o que equivalia, em termos práticos, aos seus pares congéneres milicianos do exército. Não mais do que universitários, licenciados ou em vias disso, que, tendo de cumprir num horizonte próximo e ao serviço da cidadania o serviço militar obrigatório, optavam pela inscrição nesse ramo das Forças Armadas, vindo posteriormente a ser seleccionados ou não, de acordo com as exigências e os resultados dos testes prestados no ramo.
Fui apenas um entre os quase 3000 oficiais da Reserva Naval que, entre 1958 e 1982, desfilaram naquela Instituição; daqueles, cerca de um milhar terão desempenhado missões de serviço nas antigas colónias portuguesas, entre 1961 e 1975.
No meu caso, depois de um curso de seis meses na Escola Naval, a viagem de instrução de cadete e o juramento de bandeira com promoção a Aspirante (Outubro de 1965 a Maio de 1966) marcaram, em sucessão, instrução e formação, camaradagem, também crescimento.
Depois, já promovido a Subtenente, o destacamento para uma unidade naval na Guiné, o NRP Orion - P362 (LFG - Lancha de Fiscalização Grande) onde fui oficial Imediato de Maio de 1966 a Abril de 1968; uma unidade naval de 42 metros, com 2 oficiais, 4 sargentos e 22 praças entre outras 6 idênticas (Argos, Dragão, Hidra, Lira, Cassiopeia e Sagitário).
Seguiram-se inúmeras operações, apoios à navegação (LDG's, LDM's, LDP's, TT's, embarcações e batelões) e oceanografia, escoltas, fiscalização, transportes, ataques e respostas, evacuação de feridos, prisioneiros e até transporte de agentes da PIDE.
Na memória que o tempo em mim não apaga, esfumam-se relatos, acontecimentos, documentos, registos, afinal também História. Em tudo idêntica no tempo à que tenho vindo a ler no Blogueforanada mas, muito mais do que idêntica, complementando-se mutuamente.
Do Cacheu a Norte ao Cacine no Sul, com o Mansoa, Geba, Corubal, Grande de Buba, Tombali e Cumbijã pelo meio.
Numa enorme bolanha em que as marcas radar, a sonda e algumas vezes a sorte, nos serviam de anjos anti-encalhe.
Bijagós, mais um nome, mas num mundo à parte! Cabo Verde nas obrigatórias e periódicas docagens nos estaleiros.
Sem grande possibilidade de lhes soletrar os nomes que a memória aí não chega, o meu cumprimento a todos os militares do exército com quem convivi, especialmente no Cacheu, Barro, Ganturé (Bigene), Farim, Caió, Bissau, Nhacra, Mansoa, Bolama, Cacine, Cabedú e muitos outros locais, sem esquecer uma aventura radical na forma de uma ida a Cameconde, a 8 km de Cacine.
Foi ainda possível, vejam só, em 13 de Setembro de 1966 (alguém presente?) embarcar, em Cabedú, a companhia ali estacionada e, na LDM 307, transportá-la até à Ilha de Melo, efectuar um desembarque - nome de operação: SOL -, aguardar a praia-mar, voltar a reembarcar a companhia, levá-la de volta ao aquartelamento e regressar ao patrulha.
Éramos nómadas, mas nunca teria sido possível por o pé em terra em alguns locais sem lá estar o exército ou levarmos fuzileiros. Noutros, não teria sido possível lá passar, quem sabe?... sem o apoio dos T6 ou dos Fiat da FA. Na memória o som (a soundblaster possível na época) dos diferentes tipos de "instrumentação" utilizada nos "jogos de guerra", aquando das escoltas que efectuávamos nos abastecimentos ao aquartelamento de Bedanda (tenho material de som gravado).
Cafine, Cadique, Cufar, canhão sem recuo incluídos ou as peças anti-carro 57 mm com que éramos brindados na barra do Cacine, podiam ser bons exemplos mas os RPG's no Cacheu, a montante de Barro (Porto Coco, Jagali, Tancroal) e antes de Binta, também eram aperitivos a evitar.
Depois de 2500 horas de navegação e dois anos decorridos, o regresso ao Continente, já como 2º tenente. Família constituída e a necessidade de completar a minha formação académica e profissional levaram-me a prorrogar, por mais algum tempo, a minha permanência na Velha Escola. Em 1972, promovido a 1º tenente, pedi a passagem à disponibilidade.
Num passado comum a preservar, a minha homenagem pessoal a todo o enorme grupo de marinheiros da Marinha de Guerra que, ao longo de 13 anos, mantiveram bem alto a fasquia de valores pessoais e militares naquele território, lembrando especialmente aqueles para os quais, a implacável lei da vida, tornou o percurso mais curto.
Estarão sempre connosco.
Disponham do meu modesto conhecimento para qualquer colaboração entendida como útil.
Um abraço,
Lema Santos
Anexo: 2 fotos pessoais (1972 e 2004) - o facto de gostar de fotografia desde muito novo leva a que, de mim, a família tem poucas fotos.
2. Ficha pessoal do novo membro da nossa tertúlia, que me foi enviada nestes termos: "Na sequência da nossa conversa telefónica e para evitar complicações de apresentação, tomo a liberdade de te enviar uma ficha descritiva do meu perfil pessoal bem como os meus contactos. Grato pela disponibilidade e abertura que demonstraste. Um abraço e dispõe,
Manuel Lema Santos"
Nome > Manuel Lema Pires dos Santos (normalmente omito o Pires pelo facto de o não utilizar desde há muito)
Idade > 63 anos
Estado civil > Casado com Maria João Lema Santos, economista, com dois filhos de 21 e 17 anos respectivamente; 2 filhas de 1º casamento (37 e 36 anos respectivamente)
Formação académica:
(i) Liceu Pedro Nunes de 1952 a 1959; (ii) Curso de engenharia mecânica do IST, incompleto na licenciatura (6º ano da antiga reforma); (iii) Escola Naval (Curso Especial de Oficiais da Reserva Naval - 8 º CEORN) de Outubro de 1965 a Maio de 1966; (iv) Viagem de Instrução no NRP Corte Real em Abril de 1966, juramento de bandeira e promoção a Aspirante.
Formação Militar:
- Nomeado Imediato do NRP ORION - P 362 (guarnição de 2 oficiais, 4 sargentos e 22 praças), com promoção a SubTenente, em serviço na Guiné.
- Embarque para a Guiné em 31 de Maio de 1966.
- Permanência naquele lugar até 24 de Abril de 1968, cumpridas cerca de 2500 horas de navegação e algumas idas a Cabo Verde (Mindelo) para alagem (docagem).
- Promoção a 2º Tenente em 31 de Maio de 1967.
- No regresso e até Agosto de 1968, formador no Grupo nº 1 de Escolas da Armada (Vila Franca).
- De Agosto de 1968 a Maio de 1970, ajudante de Ordens do Comandante Naval do Continente e Base Naval de Lisboa
Formação Profissional:
- De Maio de 1970 a Novembro de 1972 dirigi, a pedido e como adjunto, o Serviço de Publicações do Estado Maior da Armada, primeiro estágio profissional na indústria gráfica, ramo que abracei até hoje.
- Promovido ao posto de 1º Tenente em Novembro de 1972, tendo pedido a passagem à disponibilidade.
- Final de 1972 - Admitido como Director de Produção da Livraria Bertrand (parque industrial da Venda Nova - Amadora); pedida a demissão em Fevereiro de 1977.
- Março de 1977 - Admitido como Chefe de Produção da Avery Portugal - B. Nascimento, Lda.; diversos estágios realizados na Alemanha, Dinamarca, Suécia e Espanha no âmbito da mesma indústria gráfica (serigrafia e etiquetagem). Pedida a demissão em Março de 1983.
- Entre 1984 e 1987 ainda passei em duas outras empresas em lugar equivalente (Selegrafe, Litografia Amorim e Copinaque);
Formação complementar:
- Desde aquela altura e até agora, primeiro como empresário em nome individual e depois em sociedade com a mulher, em M. Lema Santos - Comunicação Gráfica, Lda., pequeno estúdio gráfico, de índole familiar, na área digital/pré-impressão/Internet.
Actividades diversas:
- De 1969 a 1981, presidente da Direcção de uma associação cultural e desportiva (Clube Arte e Sport).
- Desde 1997 sócio e colaborador na AORN (Associação dos Oficiais da Reserva Naval) tendo aceite o lugar de vogal neste último elenco directivo; por divergências em questões de fundo afastei-me no final de 2004.
Contactos:
Pcta. Infanta D. Catarina, 7B
Massamá Norte
2605-659 Belas
Telefs.: 21 4377053 / 21 4387205
20 abril 2006
Guiné 63/74 - DCCXXII: Em louvor da AD - Acção para o Desenvolvimento (Bissau)
Guiné-Bissau > Bissau > AD - Acção para o Desenvolvimento > Foto da semana > 2005 > "O jovem fruticultor Ansumane, da tabanca de Faro Sadjuma, junto à estrada entre Guiledje e Bedanda, mostra com orgulho um dos exemplares de ananás da variedade Cayenne Lisa, que ele acabou de colher.
"Trata-se de um fruticultor moderno que pratica a indução floral, o que lhe permite ter, a partir de Fevereiro de cada ano, uma produção de ananás que escoa para Bissau, numa altura em que o mercado está carente deste fruto, uma vez que só começa a ser vendido no início da época das chuvas, em Junho.
"As más estradas e a falta de meios de transporte adaptados são um factor que dificulta o aumento da área de produção, tendo em conta que ele cultiva igualmente abacates, citrinos, bananas, cola e outras culturas".
© AD - Acção para o Desenvolvimento (2005) (com a devida vénia)
Amigos e camaradas da Guiné:
1. Não é meu hábito desviar a vossa atenção daquilo que nos une à volta do nosso Blogue-fora-nada, usando e abusando do privilégio de ser o seu editor... E muito menos impôr-vos a minha visão dos problemas da Guiné, tanto de hoje como do passado... Temos, contudo, em comum a solicitude, a solidariedade, a simpatia, a (com)paixão e a amizade para com a Guiné e o seu povo...O que se passa hoje, na Guiné, seja bom ou mau, não nos deixa indiferentes... Já demos várias provas disso, no nosso blogue ou através da troca de e-mails.
2. Apraz-me, por isso, registar com agrado as notícias que o nosso amigo Pepito nos mandou. Acabo de ler, com atenção, o relatório de actividade de 2005 da ONG que ele fundou e dirige, há 14 anos. A AD - Acção para o Desenvolvimento tem hoje uma imagem de liderança, seriedade, competência, qualidade e eficácia, dentro e fora do país, que honra a sua direcção e os seus colaboradores, e que constitui um motivo de esperança para a população que serve.
3. O trabalho da AD (substituindo-se muitas vezes a um Estado que não existe, ou que se demite ou que pura e simplesmente não funciona) merece o nosso respeito e admiração. Tomei, por isso, a liberdade de divulgar, pela tertúlia, o relatório da actividade do no de 2005 (disponível em linha, em formato.pdf) para que os nossos amigos e camaradas conheçam melhor o trabalho feito por esta ONG guineense, em prol da democracia, da cidadania, da participação comunitária, da protecção da natureza, do desenvolvimento sustentado e integrado da Guiné bem como da preservação da sua identidade histórica e cultural, nos mais diversos sectores e domínios.
Aqui ficam os meus parabéns pelos resultados alcançados e sobretudo pela ambição do Pepito e dos seus amigos e parceiros de fazer sempre muito mais e melhor, dentro dos difíceis condicionalismos da actual situação política, social e económica daquele país lusófono...
Registo também a coragem (física e moral) e a coerência do autor do relatório, ao identificar e denunicar os vários demónios que ameaçam o futuro da Guiné-Bissau, alguns dos quais estão associados a poderosos lobbies ou grupos de interesses. O relatório cita pelo menos quatro ou cinco grandes demónios cujo crescimento se tornou notório em 2005:
(i) o eleitoralismo, o populismo, a demagogia, a intolerância e a violência por parte dos grupos políticos em luta pelo controlo do aparelho de Estado;
(ii) a perda do sentido de Nação, a amnésia histórica, o retorno ao tchon, o tribalismo, ("omnipresente em quase todas as situações, análises, explicações e decisões do dia a dia", p. 2);
(iii) a irrupção do tráfico de droga, o enriquecimento fácil, a corrupção da juventude, o branqueamento do dinheiro, a demissão ou conivência do poder judicial;
(iv) a biopirataria, que volta a estar na ordem do dia com a "venda de golfinhos" (p. 3);
(v) a caixa de Pandora que pode vir a tornar-se a "questão do petróleo", considerada durante anos como tabu político...
4. Os guineenses têm direito, como qualquer outro povo, a serem felizes, livres, saudáveis... A AD, o Pepito e todos os seus demais colaboradores estão no terreno a fazer coisas bonitas, não apenas para mas tmabém com (e através de) os homens e as mulheres da Guiné, que finalmente poderão vir a ser donos do seu destino...
Ao comemorar os seus 14 anos de existência, "a AD assume-se como uma organização que quer viver os desafios do seu tempo: a luta pela instauração da democracia; a procura de caminhos alternativos ao neoliberalismo para um desenvolvimento justo e solidário; e a participação no combate internacional à globalização enquanto expressão de desigualdades, exclusão e pobreza" (p. 4).
5. Não vou aqui analisar emn detalhe as múltiplas actividades realizadas pela AD em 2005... Naquilo que também nos toca, por razões históricas e sentimentais, destaco o Projecto Guiledje... É feito no relatório o ponto da situação:
(i) A iniciativa arrancou em 2005;
(ii) Estão a ser prosseguidos dois objectivos: por um lado, afirmar a responsabilidade moral que a AD tem "no resgate da história do local que constitui o berço da nacionalidade e das primeiras zonas libertadas na luta pela independência"; por outro, valorizar o ecoturismo como elemento dinamizador do desenvolvimento do Cantanhez (cuja mata era um das mais míticas no nosso tempo de combatentes);
(iii) A salvaguarda da memória histórica está a feita por várias vias: por um lado, criação de um rede (informal) de antigos militares portugueses que já disponibilizaram mais de um centena de fotografias antigas de Guiledje, Medjo e Gandembel, a par de testemunhos escritos, relatórios miliares, mapas e outros documentos; por outro, o registo em vídeo das narrativas de antigos milícias e de elementos antiga população local de Guiledje, bem como de antigos guerrilheiros do PAIGC; também se está a fazer o levantamento dos antigos acampamentos de guerrilha espalhados pelas matas do Cantanhez;
(iv) Toda esta informação ficará depois à disposição dos interessados no futuro Centro de Documentação Histórica, Cultural e Ambiental do Cantanhez...
6. Eu, pessoalmente, gostaria de, no futuro, poder canalizar mais apoios (materiais e imateriais) para esta ONG. Talvez o Pepito nos possa ajudar, falando-nos das suas necessidades e prioridades... Mas, para já, aqui vai o meu grande abraço, o nosso grande abraço de amigos e camaradas da Guiné, ao Pepito e à sua equipa, um abraço longo de 4 mil quilómetros, que é a distância física que nos separa... O importante, o mais importante, é o traço de união que nos mantém ligados à Guiné e ao seu povo, pela história, pela cultura, pela língua e até pela dura experiência da guerra...
7. Com a modéstia, a sensibilidade e a honestidade intelectual que lhe são próprias, o Pepito acaba de nos mandar duas palavras de agradecimento. Aqui ficam, para conhecimento de todos. Aproveito também para lhe agradecer a referência (elogiosa) que ele faz, no supracitado relatório, ao discreto e modesto trabalho do nosso blogue:
"Amigo Luís: Muito obrigado por teres difundido o nosso relatório da AD e também pelas palavras que nos tocaram muito.
"Vindas de quem vêm e de quem muito consideramos, têm um especial valor e dão-nos aquela coragem para continuar e para acreditar.
"É no silêncio de nós próprios que as relembramos quando nos assaltam dúvidas e decidimos continuar a lutar.
"Obrigado. Abraços amigos. pepito"
Guiné 63/74 - DCCXXII: Em louvor da AD - Acção para o Desenvolvimento (Bissau)
Guiné-Bissau > Bissau > AD - Acção para o Desenvolvimento > Foto da semana > 2005 > "O jovem fruticultor Ansumane, da tabanca de Faro Sadjuma, junto à estrada entre Guiledje e Bedanda, mostra com orgulho um dos exemplares de ananás da variedade Cayenne Lisa, que ele acabou de colher.
"Trata-se de um fruticultor moderno que pratica a indução floral, o que lhe permite ter, a partir de Fevereiro de cada ano, uma produção de ananás que escoa para Bissau, numa altura em que o mercado está carente deste fruto, uma vez que só começa a ser vendido no início da época das chuvas, em Junho.
"As más estradas e a falta de meios de transporte adaptados são um factor que dificulta o aumento da área de produção, tendo em conta que ele cultiva igualmente abacates, citrinos, bananas, cola e outras culturas".
© AD - Acção para o Desenvolvimento (2005) (com a devida vénia)
Amigos e camaradas da Guiné:
1. Não é meu hábito desviar a vossa atenção daquilo que nos une à volta do nosso Blogue-fora-nada, usando e abusando do privilégio de ser o seu editor... E muito menos impôr-vos a minha visão dos problemas da Guiné, tanto de hoje como do passado... Temos, contudo, em comum a solicitude, a solidariedade, a simpatia, a (com)paixão e a amizade para com a Guiné e o seu povo...O que se passa hoje, na Guiné, seja bom ou mau, não nos deixa indiferentes... Já demos várias provas disso, no nosso blogue ou através da troca de e-mails.
2. Apraz-me, por isso, registar com agrado as notícias que o nosso amigo Pepito nos mandou. Acabo de ler, com atenção, o relatório de actividade de 2005 da ONG que ele fundou e dirige, há 14 anos. A AD - Acção para o Desenvolvimento tem hoje uma imagem de liderança, seriedade, competência, qualidade e eficácia, dentro e fora do país, que honra a sua direcção e os seus colaboradores, e que constitui um motivo de esperança para a população que serve.
3. O trabalho da AD (substituindo-se muitas vezes a um Estado que não existe, ou que se demite ou que pura e simplesmente não funciona) merece o nosso respeito e admiração. Tomei, por isso, a liberdade de divulgar, pela tertúlia, o relatório da actividade do no de 2005 (disponível em linha, em formato.pdf) para que os nossos amigos e camaradas conheçam melhor o trabalho feito por esta ONG guineense, em prol da democracia, da cidadania, da participação comunitária, da protecção da natureza, do desenvolvimento sustentado e integrado da Guiné bem como da preservação da sua identidade histórica e cultural, nos mais diversos sectores e domínios.
Aqui ficam os meus parabéns pelos resultados alcançados e sobretudo pela ambição do Pepito e dos seus amigos e parceiros de fazer sempre muito mais e melhor, dentro dos difíceis condicionalismos da actual situação política, social e económica daquele país lusófono...
Registo também a coragem (física e moral) e a coerência do autor do relatório, ao identificar e denunicar os vários demónios que ameaçam o futuro da Guiné-Bissau, alguns dos quais estão associados a poderosos lobbies ou grupos de interesses. O relatório cita pelo menos quatro ou cinco grandes demónios cujo crescimento se tornou notório em 2005:
(i) o eleitoralismo, o populismo, a demagogia, a intolerância e a violência por parte dos grupos políticos em luta pelo controlo do aparelho de Estado;
(ii) a perda do sentido de Nação, a amnésia histórica, o retorno ao tchon, o tribalismo, ("omnipresente em quase todas as situações, análises, explicações e decisões do dia a dia", p. 2);
(iii) a irrupção do tráfico de droga, o enriquecimento fácil, a corrupção da juventude, o branqueamento do dinheiro, a demissão ou conivência do poder judicial;
(iv) a biopirataria, que volta a estar na ordem do dia com a "venda de golfinhos" (p. 3);
(v) a caixa de Pandora que pode vir a tornar-se a "questão do petróleo", considerada durante anos como tabu político...
4. Os guineenses têm direito, como qualquer outro povo, a serem felizes, livres, saudáveis... A AD, o Pepito e todos os seus demais colaboradores estão no terreno a fazer coisas bonitas, não apenas para mas tmabém com (e através de) os homens e as mulheres da Guiné, que finalmente poderão vir a ser donos do seu destino...
Ao comemorar os seus 14 anos de existência, "a AD assume-se como uma organização que quer viver os desafios do seu tempo: a luta pela instauração da democracia; a procura de caminhos alternativos ao neoliberalismo para um desenvolvimento justo e solidário; e a participação no combate internacional à globalização enquanto expressão de desigualdades, exclusão e pobreza" (p. 4).
5. Não vou aqui analisar emn detalhe as múltiplas actividades realizadas pela AD em 2005... Naquilo que também nos toca, por razões históricas e sentimentais, destaco o Projecto Guiledje... É feito no relatório o ponto da situação:
(i) A iniciativa arrancou em 2005;
(ii) Estão a ser prosseguidos dois objectivos: por um lado, afirmar a responsabilidade moral que a AD tem "no resgate da história do local que constitui o berço da nacionalidade e das primeiras zonas libertadas na luta pela independência"; por outro, valorizar o ecoturismo como elemento dinamizador do desenvolvimento do Cantanhez (cuja mata era um das mais míticas no nosso tempo de combatentes);
(iii) A salvaguarda da memória histórica está a feita por várias vias: por um lado, criação de um rede (informal) de antigos militares portugueses que já disponibilizaram mais de um centena de fotografias antigas de Guiledje, Medjo e Gandembel, a par de testemunhos escritos, relatórios miliares, mapas e outros documentos; por outro, o registo em vídeo das narrativas de antigos milícias e de elementos antiga população local de Guiledje, bem como de antigos guerrilheiros do PAIGC; também se está a fazer o levantamento dos antigos acampamentos de guerrilha espalhados pelas matas do Cantanhez;
(iv) Toda esta informação ficará depois à disposição dos interessados no futuro Centro de Documentação Histórica, Cultural e Ambiental do Cantanhez...
6. Eu, pessoalmente, gostaria de, no futuro, poder canalizar mais apoios (materiais e imateriais) para esta ONG. Talvez o Pepito nos possa ajudar, falando-nos das suas necessidades e prioridades... Mas, para já, aqui vai o meu grande abraço, o nosso grande abraço de amigos e camaradas da Guiné, ao Pepito e à sua equipa, um abraço longo de 4 mil quilómetros, que é a distância física que nos separa... O importante, o mais importante, é o traço de união que nos mantém ligados à Guiné e ao seu povo, pela história, pela cultura, pela língua e até pela dura experiência da guerra...
7. Com a modéstia, a sensibilidade e a honestidade intelectual que lhe são próprias, o Pepito acaba de nos mandar duas palavras de agradecimento. Aqui ficam, para conhecimento de todos. Aproveito também para lhe agradecer a referência (elogiosa) que ele faz, no supracitado relatório, ao discreto e modesto trabalho do nosso blogue:
"Amigo Luís: Muito obrigado por teres difundido o nosso relatório da AD e também pelas palavras que nos tocaram muito.
"Vindas de quem vêm e de quem muito consideramos, têm um especial valor e dão-nos aquela coragem para continuar e para acreditar.
"É no silêncio de nós próprios que as relembramos quando nos assaltam dúvidas e decidimos continuar a lutar.
"Obrigado. Abraços amigos. pepito"
Guiné 63/74 - DCCXXI: Ainda o caso do Seni Candé (Pelotão de Milícias nº 143)
Texto do Hugo Moura Ferreira, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 1621 e CCAÇ 6 (1966/68)
Caros amigos:
Depois de algumas tentativas, baseando-me apenas na data de nascimento do Seni Candé, não esperando pela informação do nome dos pais, voltei ao Arquivo Geral do Exército onde localizei o seu processo individual (1).
Conclui, conjuntamente com a pessoa que me facultou as indicações, que ambos os números indicados nas nossas mensagens estavam correctos.
Também concluímos que ele nunca foi das companhias territoriais (CCAÇ 6), mas sim do Pelotão de Milícia nº 143, comandado pelo Alferes de 2ª linha, Tala Biú Djaló, meu grande amigo, morto em combate em Conakry, durante a Op Mar Verde, como furriel da 1ª Companhia de Comandos Africanos.
Conversando, oficiosamente, naquele serviço do Exército, foi-me dito, no que se refere à Pensão perdida pelo Seni, que havia a possibilidade de ele poder requerer a sua reactivação.
Mas aqui começam as dificuldades maiores. Para tal, teria que estar em Portugal, para poder solicitar pessoalmente a comparência a uma nova Junta Médica e, ao mesmo tempo, caso se ausentasse, teria que ter uma morada no território nacional para poder ser contactado, consoante a evolução do processo.
Neste último ponto, naturalmente que eu não poria qualquer entrave em que a minha morada pessoal fosse utilizada para tal fim, mas antes haveria que se proceder em conformidade e a presença dele seria imprescindível.
Claro que este é o caso vertente do Seni Candé, mas como ele deve haver muitos mais que gostariam que os seus processos fossem reabertos... E que nós bem gostaríamos de ajudar também.
Naturalmente, penso que uma tarefa destas se me afigura de possibilidades muito remotas, no entanto, quem sabe se poderemos vir a ajudar algum deles, ou mesmo o Seni Candé.
Essa possibilidade ficará, se me permitem o alvitre, sem querer chutar a bola no inicio do jogo à consideração e disponibilidade do Jorge Neto que, numa primeira análise, teria que conversar com o interessado a propósito da questão.
Uma abraço a todos.
Moura Ferreira
_____
Nota de L.G.,
(1) Vd. posts anteriores:
5 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCVII: A pensão do Seni Candé
10 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXVI: O Seni Candé da minha CCAÇ 6 (Moura Ferreira)
9 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DX: O abandono do Seni Candé (Zé Neto)
8 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DVI: As (des)venturas de Seni Candé (Jorge Neto)
Caros amigos:
Depois de algumas tentativas, baseando-me apenas na data de nascimento do Seni Candé, não esperando pela informação do nome dos pais, voltei ao Arquivo Geral do Exército onde localizei o seu processo individual (1).
Conclui, conjuntamente com a pessoa que me facultou as indicações, que ambos os números indicados nas nossas mensagens estavam correctos.
Também concluímos que ele nunca foi das companhias territoriais (CCAÇ 6), mas sim do Pelotão de Milícia nº 143, comandado pelo Alferes de 2ª linha, Tala Biú Djaló, meu grande amigo, morto em combate em Conakry, durante a Op Mar Verde, como furriel da 1ª Companhia de Comandos Africanos.
Conversando, oficiosamente, naquele serviço do Exército, foi-me dito, no que se refere à Pensão perdida pelo Seni, que havia a possibilidade de ele poder requerer a sua reactivação.
Mas aqui começam as dificuldades maiores. Para tal, teria que estar em Portugal, para poder solicitar pessoalmente a comparência a uma nova Junta Médica e, ao mesmo tempo, caso se ausentasse, teria que ter uma morada no território nacional para poder ser contactado, consoante a evolução do processo.
Neste último ponto, naturalmente que eu não poria qualquer entrave em que a minha morada pessoal fosse utilizada para tal fim, mas antes haveria que se proceder em conformidade e a presença dele seria imprescindível.
Claro que este é o caso vertente do Seni Candé, mas como ele deve haver muitos mais que gostariam que os seus processos fossem reabertos... E que nós bem gostaríamos de ajudar também.
Naturalmente, penso que uma tarefa destas se me afigura de possibilidades muito remotas, no entanto, quem sabe se poderemos vir a ajudar algum deles, ou mesmo o Seni Candé.
Essa possibilidade ficará, se me permitem o alvitre, sem querer chutar a bola no inicio do jogo à consideração e disponibilidade do Jorge Neto que, numa primeira análise, teria que conversar com o interessado a propósito da questão.
Uma abraço a todos.
Moura Ferreira
_____
Nota de L.G.,
(1) Vd. posts anteriores:
5 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCVII: A pensão do Seni Candé
10 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXVI: O Seni Candé da minha CCAÇ 6 (Moura Ferreira)
9 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DX: O abandono do Seni Candé (Zé Neto)
8 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DVI: As (des)venturas de Seni Candé (Jorge Neto)
Guiné 63/74 - DCCXXI: Ainda o caso do Seni Candé (Pelotão de Milícias nº 143)
Texto do Hugo Moura Ferreira, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 1621 e CCAÇ 6 (1966/68)
Caros amigos:
Depois de algumas tentativas, baseando-me apenas na data de nascimento do Seni Candé, não esperando pela informação do nome dos pais, voltei ao Arquivo Geral do Exército onde localizei o seu processo individual (1).
Conclui, conjuntamente com a pessoa que me facultou as indicações, que ambos os números indicados nas nossas mensagens estavam correctos.
Também concluímos que ele nunca foi das companhias territoriais (CCAÇ 6), mas sim do Pelotão de Milícia nº 143, comandado pelo Alferes de 2ª linha, Tala Biú Djaló, meu grande amigo, morto em combate em Conakry, durante a Op Mar Verde, como furriel da 1ª Companhia de Comandos Africanos.
Conversando, oficiosamente, naquele serviço do Exército, foi-me dito, no que se refere à Pensão perdida pelo Seni, que havia a possibilidade de ele poder requerer a sua reactivação.
Mas aqui começam as dificuldades maiores. Para tal, teria que estar em Portugal, para poder solicitar pessoalmente a comparência a uma nova Junta Médica e, ao mesmo tempo, caso se ausentasse, teria que ter uma morada no território nacional para poder ser contactado, consoante a evolução do processo.
Neste último ponto, naturalmente que eu não poria qualquer entrave em que a minha morada pessoal fosse utilizada para tal fim, mas antes haveria que se proceder em conformidade e a presença dele seria imprescindível.
Claro que este é o caso vertente do Seni Candé, mas como ele deve haver muitos mais que gostariam que os seus processos fossem reabertos... E que nós bem gostaríamos de ajudar também.
Naturalmente, penso que uma tarefa destas se me afigura de possibilidades muito remotas, no entanto, quem sabe se poderemos vir a ajudar algum deles, ou mesmo o Seni Candé.
Essa possibilidade ficará, se me permitem o alvitre, sem querer chutar a bola no inicio do jogo à consideração e disponibilidade do Jorge Neto que, numa primeira análise, teria que conversar com o interessado a propósito da questão.
Uma abraço a todos.
Moura Ferreira
_____
Nota de L.G.,
(1) Vd. posts anteriores:
5 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCVII: A pensão do Seni Candé
10 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXVI: O Seni Candé da minha CCAÇ 6 (Moura Ferreira)
9 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DX: O abandono do Seni Candé (Zé Neto)
8 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DVI: As (des)venturas de Seni Candé (Jorge Neto)
Caros amigos:
Depois de algumas tentativas, baseando-me apenas na data de nascimento do Seni Candé, não esperando pela informação do nome dos pais, voltei ao Arquivo Geral do Exército onde localizei o seu processo individual (1).
Conclui, conjuntamente com a pessoa que me facultou as indicações, que ambos os números indicados nas nossas mensagens estavam correctos.
Também concluímos que ele nunca foi das companhias territoriais (CCAÇ 6), mas sim do Pelotão de Milícia nº 143, comandado pelo Alferes de 2ª linha, Tala Biú Djaló, meu grande amigo, morto em combate em Conakry, durante a Op Mar Verde, como furriel da 1ª Companhia de Comandos Africanos.
Conversando, oficiosamente, naquele serviço do Exército, foi-me dito, no que se refere à Pensão perdida pelo Seni, que havia a possibilidade de ele poder requerer a sua reactivação.
Mas aqui começam as dificuldades maiores. Para tal, teria que estar em Portugal, para poder solicitar pessoalmente a comparência a uma nova Junta Médica e, ao mesmo tempo, caso se ausentasse, teria que ter uma morada no território nacional para poder ser contactado, consoante a evolução do processo.
Neste último ponto, naturalmente que eu não poria qualquer entrave em que a minha morada pessoal fosse utilizada para tal fim, mas antes haveria que se proceder em conformidade e a presença dele seria imprescindível.
Claro que este é o caso vertente do Seni Candé, mas como ele deve haver muitos mais que gostariam que os seus processos fossem reabertos... E que nós bem gostaríamos de ajudar também.
Naturalmente, penso que uma tarefa destas se me afigura de possibilidades muito remotas, no entanto, quem sabe se poderemos vir a ajudar algum deles, ou mesmo o Seni Candé.
Essa possibilidade ficará, se me permitem o alvitre, sem querer chutar a bola no inicio do jogo à consideração e disponibilidade do Jorge Neto que, numa primeira análise, teria que conversar com o interessado a propósito da questão.
Uma abraço a todos.
Moura Ferreira
_____
Nota de L.G.,
(1) Vd. posts anteriores:
5 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCVII: A pensão do Seni Candé
10 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXVI: O Seni Candé da minha CCAÇ 6 (Moura Ferreira)
9 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DX: O abandono do Seni Candé (Zé Neto)
8 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DVI: As (des)venturas de Seni Candé (Jorge Neto)
Guiné 63/74 - DCCXX: O cheiro fétido dos navios que transportavam 'carne para canhão'
Navio de carga Alenquer > Foi construído em Inglaterra em 1948. O seu comprimento era de cerca de 137 metros. A sua arqueação bruta não chegava às 5,3 mil toneladas. Armador: Sociedade Geral de Comércio, Indústria e Transportes, Lisboa. Velocidade de cruzeiro: 13 nós. Nº de tripulantes: 37. Foi nesta embarcação que o José Martins (CCAÇ 5, Canjadude, 1968/70) foi parar à Guiné...
Fonte: Navios Mercantes Portugueses (2000)
N/M Ana Mafalda > Foi neste luxuoso paquete da nossa marinha mercante colonial que companhias como a CART 1690 (Geba, 1967/69), do A. Marques Lopes, ou a CART 2339 (Mansambo, 1968/69), do Carlos Marques dos Santos, partiram de Lisboa com destino à Guiné ...
O Ana Mafalda era um navio misto, de carga e de passageiros, construído pela CUF - Companhia União Fabril, em Lisboa, em 1951 e abatido em 1975. O seu comprimento era de 103 metros. A sua arqueação bruta pouco ultrapassava as 3,3 mil toneladas. Teve dois armadores: Sociedade Geral de Comércio, Indústria e Transportes, Lisboa (1950-1972); e Companhia Nacional de Navegação, Lisboa (1972-1973). Velocidade de cruzeiro: 12 nós. Alojamentos para 16 passageiros em primeira classe, 24 em segunda e 12 em terceira classe, no total de 52 passageiros. Nº de tripulantes: 47.
Fonte: Navios Mercantes Portugueses (2000) (com a devida vénia)
1. A propósito do transporte de tropas para a Guiné (durante muito tempo, exclusivamente de barco), lancei para a tertúlia a seguinte questão, que não é inocente mas também não é provocatória:
- Vocês ainda se lembram do cheiro nauseabundo, fétido, do cheiro a merda e a vomitado, que vinha dos porões dos Niassas, dos Uíges e dos outros navios negreiros que transportavam a carne para canhão ?... Oficiais e sargentos iam em 1ª classe e em classe turística, já não se devem lembrar muito bem desses malditos, inconfundíveis e indescritíveis cheiros… Mas o pobre soldado, meu Deus!, esse seguramente que ainda hoje se lembra desse cheiro nauseabundo, tão característico dos navios da nossa marinha mercante que foram fretados pela tropa.... Enfim, estamos a falar das duras condições em que chegavamos à Guiné, o tal sítio que ficava longe do Vietname...
Alguns camaradas apressaram-se a responder-me, dando o seu testemunho, fazendo um comentário ou contando uma pequena estória... Estou-lhes grato.
2. Mensagem do David Guimarães, com data de ontem:
Amigo Luís:
Boa estada em Itália. Isso importa. Depois continuarás esta amálgama de guerra em que estamos... Ainda bem, pois vale a pena... Acho que parar não, muitas histórias há a contar e muitos barcos a explorar. Isso, aqueles que nos levaram e trouxeram à guerra, embora eu fosse já um dos primeiros que gozei o privilégio de voltar em Avião 707 dos TAM [Transportes Aéreos Militares]... Que luxo!
3. Mensagem do Carlos Marques Santos:
(...) Só de propores que se fale dos cheiros dos nossos paquetes, já estou com náuseas. Cinco dias intermináveis!
Nem de sargento de dia se podia fazer o porão, onde desgraçadamente iam amontoados os soldados.
Só vivido. Contado ninguém acredita.
Eu e os meus fomos no Ana Mafalda. Esse era um autêntico negreiro.
4. Texto do José Martins:
Caro Luís: Antes de mais faz uma boa viagem e goza esses dias de calmaria (?) em
Itália. Cuidado com os mafiosos!
Estórias da minha ida de barco, o Alenquer, é bastante soft. Levava apenas 12 passageiros. Creio que tenho algo escrito sobre a viagem. Em caso afirmativo irei enviar. Será uma estória fora do contexto normal.
Quanto à História (com H, grande) é fantástica. É digna de antologia, já que escritos como este não abundam. É pena porque estas histórias deviam/devem ser dadas à estampa.
Um abraço do José Martins (ex-furriel miliciano de transmissões, CCAÇ 5, Canjadude, 1968/70)
5. O Marques Lopes tem uma descrição realista mas bem-humorada da sua viagem no Ana Mafalda: vd post de 28 de Junho de 2005 > Guiné 69/71 - LXXXVII: A caminho da Guiné, no "Ana Mafalda" (1967)
Aqui vão alguns excertos, para recordar:
(...) "Os alferes, sargentos e furriéis foram distribuídos pelos beliches dos camarotes de segunda e terceira classe. Em primeira classe ficou o capitão da companhia, o comandante do navio, o imediato, o oficial das máquinas, certamente, e uns mangas que se penduraram em nós à boleia, que eu não sei quem eram nem procurei saber.
"O Zé Soldado, sempre o mais fodido nestas situações, foi para o porão onde estavam montados uns beliches de ferro com umas enxergas em cima, e onde casa de banho não havia.
"Largámos às 12h00 do dia 8 de Abril de 1967. Foi uma bela viagem, como devem calcular, com os baldes dos dejectos do porão a serem despejados borda fora de manhã e ao fim da tarde (ao menos haja regras). Mas os despejos começaram logo à saída da barra do Tejo. Eu, pessoalmente, nunca tinha chamado tantas vezes pelo Gregório" (...).
6. Eu próprio já aqui evoquei a minha viagem no Niassa, em finais de Maio de 1969: vd post de 23 de Junho de 2005 > Guiné 63/74 - LXXVI: (i) A bordo do Niassa; (ii) Chegada a Bissau
(...) "Excertos do Diário de um tuga. Luis Graça (ex-furriel miliciano Henriques CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, 1969/71).
(...) "Eis-nos nos tristes trópicos. Atravessámos hoje o Trópico de Câncer, com peixes voadores e alguns tubarões a acompanhar-nos (...).
"Alguém se lembrou de abrir uma garrafa de champagne como se tivéssemos atravessado o Equador em alegre cruzeiro pelo Atlântico Sul. Com um sorriso amarelo, também participei neste ritual de iniciação e ergui a minha taça:
- Afinal, estamos todos no mesmo barco!, - pensei.
"De resto, come-se e bebe-se o dia todo para matar o tédio da vida a bordo. Há os viciados da lerpa. Os oficiais superiores, esses, divertem-se com o tiro ao alvo na popa do navio, enquanto a malta da turística escreve cartas, aos pais, namoradas, noivas e mulheres, cartas que eu imagino já molhadas de lágrimas salgadas e de saudades. As praças, essas, vomitam nos porões. Todo o navio fede e no meio do cheiro nauseabundo há um desgraçado de um desertor que vai a ferros" (...).
7. Testemundo do Carlos Vinhal:
Caros camaradas.
Eu também foi um digno passageiro do Ana Mafalda.
Não há dúvida que o Ana Mafalda se fartou de levar gente para a Guiné. Parece que a grande maioria dos tertulianos viajaram nele.
Quando a minha Companhia embarcou no Ana Mafalda no Cais do Porto do Funchal, já ele vinha com lotação esgotada. Juro que é verdade. Trazia dos Açores uma Companhia açoriana e ainda lá conseguiram meter uma madeirense.
O navio já trazia uma vedação em madeira que dividia o barco a meio, para impedir que açorianos e madeirenses se juntassem e trocassem mimos entre eles. Ainda houve umas escaramuças através das grades, mas nada digno de registo ou que fosse contra o RDM. Só um pouco de álcool à mistura.
Confesso humildemente que nunca desci aos porões, porque não tive coragem. Espreitei uma vez cá de cima lá para baixo e chegou. Por sorte não me tocou nenhum Sargento de Dia a bordo.
Apesar de tudo a viagem foi tão pequena que o sofrimento não deve ter sido muito e apenas se dormiram 4 noites a bordo. Durante o dia o pessoal andava cá por cima.
Alguém falou de imundicie, e de fome ninguém fala? Eu já fui dos sortudos que vieram de avião, mas tenho amigos que regressaram também de navio e queixam-se de que a alimentação no regresso era inferior e de pior qualidade, comparada com a de ida. Subentende-se que para lá nos queriam gordinhos, para cá cada um que se desenrascasse - passe o termo pouco ortodoxo.
Cordiais saudações.
Carlos Vinhal
Fonte: Navios Mercantes Portugueses (2000)
N/M Ana Mafalda > Foi neste luxuoso paquete da nossa marinha mercante colonial que companhias como a CART 1690 (Geba, 1967/69), do A. Marques Lopes, ou a CART 2339 (Mansambo, 1968/69), do Carlos Marques dos Santos, partiram de Lisboa com destino à Guiné ...
O Ana Mafalda era um navio misto, de carga e de passageiros, construído pela CUF - Companhia União Fabril, em Lisboa, em 1951 e abatido em 1975. O seu comprimento era de 103 metros. A sua arqueação bruta pouco ultrapassava as 3,3 mil toneladas. Teve dois armadores: Sociedade Geral de Comércio, Indústria e Transportes, Lisboa (1950-1972); e Companhia Nacional de Navegação, Lisboa (1972-1973). Velocidade de cruzeiro: 12 nós. Alojamentos para 16 passageiros em primeira classe, 24 em segunda e 12 em terceira classe, no total de 52 passageiros. Nº de tripulantes: 47.
Fonte: Navios Mercantes Portugueses (2000) (com a devida vénia)
1. A propósito do transporte de tropas para a Guiné (durante muito tempo, exclusivamente de barco), lancei para a tertúlia a seguinte questão, que não é inocente mas também não é provocatória:
- Vocês ainda se lembram do cheiro nauseabundo, fétido, do cheiro a merda e a vomitado, que vinha dos porões dos Niassas, dos Uíges e dos outros navios negreiros que transportavam a carne para canhão ?... Oficiais e sargentos iam em 1ª classe e em classe turística, já não se devem lembrar muito bem desses malditos, inconfundíveis e indescritíveis cheiros… Mas o pobre soldado, meu Deus!, esse seguramente que ainda hoje se lembra desse cheiro nauseabundo, tão característico dos navios da nossa marinha mercante que foram fretados pela tropa.... Enfim, estamos a falar das duras condições em que chegavamos à Guiné, o tal sítio que ficava longe do Vietname...
Alguns camaradas apressaram-se a responder-me, dando o seu testemunho, fazendo um comentário ou contando uma pequena estória... Estou-lhes grato.
2. Mensagem do David Guimarães, com data de ontem:
Amigo Luís:
Boa estada em Itália. Isso importa. Depois continuarás esta amálgama de guerra em que estamos... Ainda bem, pois vale a pena... Acho que parar não, muitas histórias há a contar e muitos barcos a explorar. Isso, aqueles que nos levaram e trouxeram à guerra, embora eu fosse já um dos primeiros que gozei o privilégio de voltar em Avião 707 dos TAM [Transportes Aéreos Militares]... Que luxo!
3. Mensagem do Carlos Marques Santos:
(...) Só de propores que se fale dos cheiros dos nossos paquetes, já estou com náuseas. Cinco dias intermináveis!
Nem de sargento de dia se podia fazer o porão, onde desgraçadamente iam amontoados os soldados.
Só vivido. Contado ninguém acredita.
Eu e os meus fomos no Ana Mafalda. Esse era um autêntico negreiro.
4. Texto do José Martins:
Caro Luís: Antes de mais faz uma boa viagem e goza esses dias de calmaria (?) em
Itália. Cuidado com os mafiosos!
Estórias da minha ida de barco, o Alenquer, é bastante soft. Levava apenas 12 passageiros. Creio que tenho algo escrito sobre a viagem. Em caso afirmativo irei enviar. Será uma estória fora do contexto normal.
Quanto à História (com H, grande) é fantástica. É digna de antologia, já que escritos como este não abundam. É pena porque estas histórias deviam/devem ser dadas à estampa.
Um abraço do José Martins (ex-furriel miliciano de transmissões, CCAÇ 5, Canjadude, 1968/70)
5. O Marques Lopes tem uma descrição realista mas bem-humorada da sua viagem no Ana Mafalda: vd post de 28 de Junho de 2005 > Guiné 69/71 - LXXXVII: A caminho da Guiné, no "Ana Mafalda" (1967)
Aqui vão alguns excertos, para recordar:
(...) "Os alferes, sargentos e furriéis foram distribuídos pelos beliches dos camarotes de segunda e terceira classe. Em primeira classe ficou o capitão da companhia, o comandante do navio, o imediato, o oficial das máquinas, certamente, e uns mangas que se penduraram em nós à boleia, que eu não sei quem eram nem procurei saber.
"O Zé Soldado, sempre o mais fodido nestas situações, foi para o porão onde estavam montados uns beliches de ferro com umas enxergas em cima, e onde casa de banho não havia.
"Largámos às 12h00 do dia 8 de Abril de 1967. Foi uma bela viagem, como devem calcular, com os baldes dos dejectos do porão a serem despejados borda fora de manhã e ao fim da tarde (ao menos haja regras). Mas os despejos começaram logo à saída da barra do Tejo. Eu, pessoalmente, nunca tinha chamado tantas vezes pelo Gregório" (...).
6. Eu próprio já aqui evoquei a minha viagem no Niassa, em finais de Maio de 1969: vd post de 23 de Junho de 2005 > Guiné 63/74 - LXXVI: (i) A bordo do Niassa; (ii) Chegada a Bissau
(...) "Excertos do Diário de um tuga. Luis Graça (ex-furriel miliciano Henriques CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, 1969/71).
(...) "Eis-nos nos tristes trópicos. Atravessámos hoje o Trópico de Câncer, com peixes voadores e alguns tubarões a acompanhar-nos (...).
"Alguém se lembrou de abrir uma garrafa de champagne como se tivéssemos atravessado o Equador em alegre cruzeiro pelo Atlântico Sul. Com um sorriso amarelo, também participei neste ritual de iniciação e ergui a minha taça:
- Afinal, estamos todos no mesmo barco!, - pensei.
"De resto, come-se e bebe-se o dia todo para matar o tédio da vida a bordo. Há os viciados da lerpa. Os oficiais superiores, esses, divertem-se com o tiro ao alvo na popa do navio, enquanto a malta da turística escreve cartas, aos pais, namoradas, noivas e mulheres, cartas que eu imagino já molhadas de lágrimas salgadas e de saudades. As praças, essas, vomitam nos porões. Todo o navio fede e no meio do cheiro nauseabundo há um desgraçado de um desertor que vai a ferros" (...).
7. Testemundo do Carlos Vinhal:
Caros camaradas.
Eu também foi um digno passageiro do Ana Mafalda.
Não há dúvida que o Ana Mafalda se fartou de levar gente para a Guiné. Parece que a grande maioria dos tertulianos viajaram nele.
Quando a minha Companhia embarcou no Ana Mafalda no Cais do Porto do Funchal, já ele vinha com lotação esgotada. Juro que é verdade. Trazia dos Açores uma Companhia açoriana e ainda lá conseguiram meter uma madeirense.
O navio já trazia uma vedação em madeira que dividia o barco a meio, para impedir que açorianos e madeirenses se juntassem e trocassem mimos entre eles. Ainda houve umas escaramuças através das grades, mas nada digno de registo ou que fosse contra o RDM. Só um pouco de álcool à mistura.
Confesso humildemente que nunca desci aos porões, porque não tive coragem. Espreitei uma vez cá de cima lá para baixo e chegou. Por sorte não me tocou nenhum Sargento de Dia a bordo.
Apesar de tudo a viagem foi tão pequena que o sofrimento não deve ter sido muito e apenas se dormiram 4 noites a bordo. Durante o dia o pessoal andava cá por cima.
Alguém falou de imundicie, e de fome ninguém fala? Eu já fui dos sortudos que vieram de avião, mas tenho amigos que regressaram também de navio e queixam-se de que a alimentação no regresso era inferior e de pior qualidade, comparada com a de ida. Subentende-se que para lá nos queriam gordinhos, para cá cada um que se desenrascasse - passe o termo pouco ortodoxo.
Cordiais saudações.
Carlos Vinhal
Guiné 63/74 - DCCXX: O cheiro fétido dos navios que transportavam 'carne para canhão'
Navio de carga Alenquer > Foi construído em Inglaterra em 1948. O seu comprimento era de cerca de 137 metros. A sua arqueação bruta não chegava às 5,3 mil toneladas. Armador: Sociedade Geral de Comércio, Indústria e Transportes, Lisboa. Velocidade de cruzeiro: 13 nós. Nº de tripulantes: 37. Foi nesta embarcação que o José Martins (CCAÇ 5, Canjadude, 1968/70) foi parar à Guiné...
Fonte: Navios Mercantes Portugueses (2000)
N/M Ana Mafalda > Foi neste luxuoso paquete da nossa marinha mercante colonial que companhias como a CART 1690 (Geba, 1967/69), do A. Marques Lopes, ou a CART 2339 (Mansambo, 1968/69), do Carlos Marques dos Santos, partiram de Lisboa com destino à Guiné ...
O Ana Mafalda era um navio misto, de carga e de passageiros, construído pela CUF - Companhia União Fabril, em Lisboa, em 1951 e abatido em 1975. O seu comprimento era de 103 metros. A sua arqueação bruta pouco ultrapassava as 3,3 mil toneladas. Teve dois armadores: Sociedade Geral de Comércio, Indústria e Transportes, Lisboa (1950-1972); e Companhia Nacional de Navegação, Lisboa (1972-1973). Velocidade de cruzeiro: 12 nós. Alojamentos para 16 passageiros em primeira classe, 24 em segunda e 12 em terceira classe, no total de 52 passageiros. Nº de tripulantes: 47.
Fonte: Navios Mercantes Portugueses (2000) (com a devida vénia)
1. A propósito do transporte de tropas para a Guiné (durante muito tempo, exclusivamente de barco), lancei para a tertúlia a seguinte questão, que não é inocente mas também não é provocatória:
- Vocês ainda se lembram do cheiro nauseabundo, fétido, do cheiro a merda e a vomitado, que vinha dos porões dos Niassas, dos Uíges e dos outros navios negreiros que transportavam a carne para canhão ?... Oficiais e sargentos iam em 1ª classe e em classe turística, já não se devem lembrar muito bem desses malditos, inconfundíveis e indescritíveis cheiros… Mas o pobre soldado, meu Deus!, esse seguramente que ainda hoje se lembra desse cheiro nauseabundo, tão característico dos navios da nossa marinha mercante que foram fretados pela tropa.... Enfim, estamos a falar das duras condições em que chegavamos à Guiné, o tal sítio que ficava longe do Vietname...
Alguns camaradas apressaram-se a responder-me, dando o seu testemunho, fazendo um comentário ou contando uma pequena estória... Estou-lhes grato.
2. Mensagem do David Guimarães, com data de ontem:
Amigo Luís:
Boa estada em Itália. Isso importa. Depois continuarás esta amálgama de guerra em que estamos... Ainda bem, pois vale a pena... Acho que parar não, muitas histórias há a contar e muitos barcos a explorar. Isso, aqueles que nos levaram e trouxeram à guerra, embora eu fosse já um dos primeiros que gozei o privilégio de voltar em Avião 707 dos TAM [Transportes Aéreos Militares]... Que luxo!
3. Mensagem do Carlos Marques Santos:
(...) Só de propores que se fale dos cheiros dos nossos paquetes, já estou com náuseas. Cinco dias intermináveis!
Nem de sargento de dia se podia fazer o porão, onde desgraçadamente iam amontoados os soldados.
Só vivido. Contado ninguém acredita.
Eu e os meus fomos no Ana Mafalda. Esse era um autêntico negreiro.
4. Texto do José Martins:
Caro Luís: Antes de mais faz uma boa viagem e goza esses dias de calmaria (?) em
Itália. Cuidado com os mafiosos!
Estórias da minha ida de barco, o Alenquer, é bastante soft. Levava apenas 12 passageiros. Creio que tenho algo escrito sobre a viagem. Em caso afirmativo irei enviar. Será uma estória fora do contexto normal.
Quanto à História (com H, grande) é fantástica. É digna de antologia, já que escritos como este não abundam. É pena porque estas histórias deviam/devem ser dadas à estampa.
Um abraço do José Martins (ex-furriel miliciano de transmissões, CCAÇ 5, Canjadude, 1968/70)
5. O Marques Lopes tem uma descrição realista mas bem-humorada da sua viagem no Ana Mafalda: vd post de 28 de Junho de 2005 > Guiné 69/71 - LXXXVII: A caminho da Guiné, no "Ana Mafalda" (1967)
Aqui vão alguns excertos, para recordar:
(...) "Os alferes, sargentos e furriéis foram distribuídos pelos beliches dos camarotes de segunda e terceira classe. Em primeira classe ficou o capitão da companhia, o comandante do navio, o imediato, o oficial das máquinas, certamente, e uns mangas que se penduraram em nós à boleia, que eu não sei quem eram nem procurei saber.
"O Zé Soldado, sempre o mais fodido nestas situações, foi para o porão onde estavam montados uns beliches de ferro com umas enxergas em cima, e onde casa de banho não havia.
"Largámos às 12h00 do dia 8 de Abril de 1967. Foi uma bela viagem, como devem calcular, com os baldes dos dejectos do porão a serem despejados borda fora de manhã e ao fim da tarde (ao menos haja regras). Mas os despejos começaram logo à saída da barra do Tejo. Eu, pessoalmente, nunca tinha chamado tantas vezes pelo Gregório" (...).
6. Eu próprio já aqui evoquei a minha viagem no Niassa, em finais de Maio de 1969: vd post de 23 de Junho de 2005 > Guiné 63/74 - LXXVI: (i) A bordo do Niassa; (ii) Chegada a Bissau
(...) "Excertos do Diário de um tuga. Luis Graça (ex-furriel miliciano Henriques CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, 1969/71).
(...) "Eis-nos nos tristes trópicos. Atravessámos hoje o Trópico de Câncer, com peixes voadores e alguns tubarões a acompanhar-nos (...).
"Alguém se lembrou de abrir uma garrafa de champagne como se tivéssemos atravessado o Equador em alegre cruzeiro pelo Atlântico Sul. Com um sorriso amarelo, também participei neste ritual de iniciação e ergui a minha taça:
- Afinal, estamos todos no mesmo barco!, - pensei.
"De resto, come-se e bebe-se o dia todo para matar o tédio da vida a bordo. Há os viciados da lerpa. Os oficiais superiores, esses, divertem-se com o tiro ao alvo na popa do navio, enquanto a malta da turística escreve cartas, aos pais, namoradas, noivas e mulheres, cartas que eu imagino já molhadas de lágrimas salgadas e de saudades. As praças, essas, vomitam nos porões. Todo o navio fede e no meio do cheiro nauseabundo há um desgraçado de um desertor que vai a ferros" (...).
7. Testemundo do Carlos Vinhal:
Caros camaradas.
Eu também foi um digno passageiro do Ana Mafalda.
Não há dúvida que o Ana Mafalda se fartou de levar gente para a Guiné. Parece que a grande maioria dos tertulianos viajaram nele.
Quando a minha Companhia embarcou no Ana Mafalda no Cais do Porto do Funchal, já ele vinha com lotação esgotada. Juro que é verdade. Trazia dos Açores uma Companhia açoriana e ainda lá conseguiram meter uma madeirense.
O navio já trazia uma vedação em madeira que dividia o barco a meio, para impedir que açorianos e madeirenses se juntassem e trocassem mimos entre eles. Ainda houve umas escaramuças através das grades, mas nada digno de registo ou que fosse contra o RDM. Só um pouco de álcool à mistura.
Confesso humildemente que nunca desci aos porões, porque não tive coragem. Espreitei uma vez cá de cima lá para baixo e chegou. Por sorte não me tocou nenhum Sargento de Dia a bordo.
Apesar de tudo a viagem foi tão pequena que o sofrimento não deve ter sido muito e apenas se dormiram 4 noites a bordo. Durante o dia o pessoal andava cá por cima.
Alguém falou de imundicie, e de fome ninguém fala? Eu já fui dos sortudos que vieram de avião, mas tenho amigos que regressaram também de navio e queixam-se de que a alimentação no regresso era inferior e de pior qualidade, comparada com a de ida. Subentende-se que para lá nos queriam gordinhos, para cá cada um que se desenrascasse - passe o termo pouco ortodoxo.
Cordiais saudações.
Carlos Vinhal
Fonte: Navios Mercantes Portugueses (2000)
N/M Ana Mafalda > Foi neste luxuoso paquete da nossa marinha mercante colonial que companhias como a CART 1690 (Geba, 1967/69), do A. Marques Lopes, ou a CART 2339 (Mansambo, 1968/69), do Carlos Marques dos Santos, partiram de Lisboa com destino à Guiné ...
O Ana Mafalda era um navio misto, de carga e de passageiros, construído pela CUF - Companhia União Fabril, em Lisboa, em 1951 e abatido em 1975. O seu comprimento era de 103 metros. A sua arqueação bruta pouco ultrapassava as 3,3 mil toneladas. Teve dois armadores: Sociedade Geral de Comércio, Indústria e Transportes, Lisboa (1950-1972); e Companhia Nacional de Navegação, Lisboa (1972-1973). Velocidade de cruzeiro: 12 nós. Alojamentos para 16 passageiros em primeira classe, 24 em segunda e 12 em terceira classe, no total de 52 passageiros. Nº de tripulantes: 47.
Fonte: Navios Mercantes Portugueses (2000) (com a devida vénia)
1. A propósito do transporte de tropas para a Guiné (durante muito tempo, exclusivamente de barco), lancei para a tertúlia a seguinte questão, que não é inocente mas também não é provocatória:
- Vocês ainda se lembram do cheiro nauseabundo, fétido, do cheiro a merda e a vomitado, que vinha dos porões dos Niassas, dos Uíges e dos outros navios negreiros que transportavam a carne para canhão ?... Oficiais e sargentos iam em 1ª classe e em classe turística, já não se devem lembrar muito bem desses malditos, inconfundíveis e indescritíveis cheiros… Mas o pobre soldado, meu Deus!, esse seguramente que ainda hoje se lembra desse cheiro nauseabundo, tão característico dos navios da nossa marinha mercante que foram fretados pela tropa.... Enfim, estamos a falar das duras condições em que chegavamos à Guiné, o tal sítio que ficava longe do Vietname...
Alguns camaradas apressaram-se a responder-me, dando o seu testemunho, fazendo um comentário ou contando uma pequena estória... Estou-lhes grato.
2. Mensagem do David Guimarães, com data de ontem:
Amigo Luís:
Boa estada em Itália. Isso importa. Depois continuarás esta amálgama de guerra em que estamos... Ainda bem, pois vale a pena... Acho que parar não, muitas histórias há a contar e muitos barcos a explorar. Isso, aqueles que nos levaram e trouxeram à guerra, embora eu fosse já um dos primeiros que gozei o privilégio de voltar em Avião 707 dos TAM [Transportes Aéreos Militares]... Que luxo!
3. Mensagem do Carlos Marques Santos:
(...) Só de propores que se fale dos cheiros dos nossos paquetes, já estou com náuseas. Cinco dias intermináveis!
Nem de sargento de dia se podia fazer o porão, onde desgraçadamente iam amontoados os soldados.
Só vivido. Contado ninguém acredita.
Eu e os meus fomos no Ana Mafalda. Esse era um autêntico negreiro.
4. Texto do José Martins:
Caro Luís: Antes de mais faz uma boa viagem e goza esses dias de calmaria (?) em
Itália. Cuidado com os mafiosos!
Estórias da minha ida de barco, o Alenquer, é bastante soft. Levava apenas 12 passageiros. Creio que tenho algo escrito sobre a viagem. Em caso afirmativo irei enviar. Será uma estória fora do contexto normal.
Quanto à História (com H, grande) é fantástica. É digna de antologia, já que escritos como este não abundam. É pena porque estas histórias deviam/devem ser dadas à estampa.
Um abraço do José Martins (ex-furriel miliciano de transmissões, CCAÇ 5, Canjadude, 1968/70)
5. O Marques Lopes tem uma descrição realista mas bem-humorada da sua viagem no Ana Mafalda: vd post de 28 de Junho de 2005 > Guiné 69/71 - LXXXVII: A caminho da Guiné, no "Ana Mafalda" (1967)
Aqui vão alguns excertos, para recordar:
(...) "Os alferes, sargentos e furriéis foram distribuídos pelos beliches dos camarotes de segunda e terceira classe. Em primeira classe ficou o capitão da companhia, o comandante do navio, o imediato, o oficial das máquinas, certamente, e uns mangas que se penduraram em nós à boleia, que eu não sei quem eram nem procurei saber.
"O Zé Soldado, sempre o mais fodido nestas situações, foi para o porão onde estavam montados uns beliches de ferro com umas enxergas em cima, e onde casa de banho não havia.
"Largámos às 12h00 do dia 8 de Abril de 1967. Foi uma bela viagem, como devem calcular, com os baldes dos dejectos do porão a serem despejados borda fora de manhã e ao fim da tarde (ao menos haja regras). Mas os despejos começaram logo à saída da barra do Tejo. Eu, pessoalmente, nunca tinha chamado tantas vezes pelo Gregório" (...).
6. Eu próprio já aqui evoquei a minha viagem no Niassa, em finais de Maio de 1969: vd post de 23 de Junho de 2005 > Guiné 63/74 - LXXVI: (i) A bordo do Niassa; (ii) Chegada a Bissau
(...) "Excertos do Diário de um tuga. Luis Graça (ex-furriel miliciano Henriques CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, 1969/71).
(...) "Eis-nos nos tristes trópicos. Atravessámos hoje o Trópico de Câncer, com peixes voadores e alguns tubarões a acompanhar-nos (...).
"Alguém se lembrou de abrir uma garrafa de champagne como se tivéssemos atravessado o Equador em alegre cruzeiro pelo Atlântico Sul. Com um sorriso amarelo, também participei neste ritual de iniciação e ergui a minha taça:
- Afinal, estamos todos no mesmo barco!, - pensei.
"De resto, come-se e bebe-se o dia todo para matar o tédio da vida a bordo. Há os viciados da lerpa. Os oficiais superiores, esses, divertem-se com o tiro ao alvo na popa do navio, enquanto a malta da turística escreve cartas, aos pais, namoradas, noivas e mulheres, cartas que eu imagino já molhadas de lágrimas salgadas e de saudades. As praças, essas, vomitam nos porões. Todo o navio fede e no meio do cheiro nauseabundo há um desgraçado de um desertor que vai a ferros" (...).
7. Testemundo do Carlos Vinhal:
Caros camaradas.
Eu também foi um digno passageiro do Ana Mafalda.
Não há dúvida que o Ana Mafalda se fartou de levar gente para a Guiné. Parece que a grande maioria dos tertulianos viajaram nele.
Quando a minha Companhia embarcou no Ana Mafalda no Cais do Porto do Funchal, já ele vinha com lotação esgotada. Juro que é verdade. Trazia dos Açores uma Companhia açoriana e ainda lá conseguiram meter uma madeirense.
O navio já trazia uma vedação em madeira que dividia o barco a meio, para impedir que açorianos e madeirenses se juntassem e trocassem mimos entre eles. Ainda houve umas escaramuças através das grades, mas nada digno de registo ou que fosse contra o RDM. Só um pouco de álcool à mistura.
Confesso humildemente que nunca desci aos porões, porque não tive coragem. Espreitei uma vez cá de cima lá para baixo e chegou. Por sorte não me tocou nenhum Sargento de Dia a bordo.
Apesar de tudo a viagem foi tão pequena que o sofrimento não deve ter sido muito e apenas se dormiram 4 noites a bordo. Durante o dia o pessoal andava cá por cima.
Alguém falou de imundicie, e de fome ninguém fala? Eu já fui dos sortudos que vieram de avião, mas tenho amigos que regressaram também de navio e queixam-se de que a alimentação no regresso era inferior e de pior qualidade, comparada com a de ida. Subentende-se que para lá nos queriam gordinhos, para cá cada um que se desenrascasse - passe o termo pouco ortodoxo.
Cordiais saudações.
Carlos Vinhal
Guiné 63/74 - DCCXIX: Estórias do Zé Teixeira (7): Síndrome de guerra
Guiné-Bissau > Desenho inserido na publicação Conhecer para amar, amar para proteger: Rio Grande de Buba e Lagoa de Cufada. Bissau: Tiniguena. 1995.Imagem gentilmente cedida por José Teixeira (2006).
Aqui vão mais estórias do Zé Teixeira... Chamemos-lhe narrativas autobiográficas. Escrevê-las faz-lhe bem a ele; lê-las faz-nos bem a nós... Obrigado, Zé! Foste um herói, és um herói! (LG)
Síndrome de guerra
Passados uns meses do regresso, em plena Baixa do Porto, assisti a um embate de duas viaturas. O estrondo assustou-me e desatei a correr, parecia um carteirista logo após ter feito a maroteira de sacar a carteira a algum incauto.
Parei no Carmo a cerca de 800 metros, ofegante e desorientado, o meu corpo tremia todo. Sentei-me numa cadeira no Café piolho e pus-me a reflectir sobre o acontecido. Revi a cena e procurei compreender-me. As conclusões foram simples e rápidas: Vieram-me à memória as cenas de sangue que vivi na Guiné, o sangue ainda quente que senti nas minhas mãos, os feridos e mortos que entraram na minha vida como enfermeiro à força. Tive medo de que houvesse feridos e tudo voltasse a acontecer.
Ainda não sou capaz de parar junto de um acidente em estrada. Não dá para entender.
Passados uns anos sentia-me muito irritável. Tudo me angustiava. Reagia sobretudo com a família de forma menos correcta o que não era consentâneo com a minha maneira de pensar, ser e estar na vida.
Procurei um neurologista amigo. Falei largos minutos, mais de uma hora, talvez. A receita deixou-me de boca aberta:
- São efeitos secundários da guerra que viveste, e que estão a vir ao de cima. Os medicamentos não curam isso. Só o tempo te vai ajudar. -
E o tempo tem vinmdo, de facto, a ajudar. Aconselhou-me a deixar o tabaco, o que não era problema, pois desde que fui para a tropa que tinha saído dos meus hábitos. Deixar de tomar café, o que foi mais difícil. Aguentei oito dias e para comemorar, voltei . Só que felizmente foi ao fim da tarde e com estava em desintoxicação, passei a noite sem dormir e depois… aguentei mais de dez anos. Hoje tomo um por dia, da parte de manhã.
Aconselhou-me ainda a não abusar do álcool, o que também não era problema, pelo que ainda aqui estou.
Em 1999 tive de fazer um exame ao aparelho auditivo, devido a uns ruídos estranhos que sentia e por cá ficaram. Trata-se de artero-esclerose dos vasos capilares auditivos, que origina um ruído do sangue ao forçar a sua passagem nos vasos. Nada de grave, só que levarei esses ruídos para a cova um dia. Incomoda, mas não dói, nem afecta a saúde.
O estranho é a descoberta que o médico fez. Tenho uma quebra de audição nos sons agudos de cerca de 20%. Pergunta-me o médico:
- Andou na guerra ?
- Sim estive na Guiné entre 1968 a 1970.
- Mas andou mesmo nas zonas de combate ?
- Sim, sofri muitos ataques, acompanhei ataques, sofri emboscadas . . .
- Então está explicado a sua quebra de audição nos agudos. Chama-se síndrome de guerra e está dentro dos limites previstos, não se preocupe porque não vai evoluir, disse o médico.
Chega de estórias estranhas à guerra, mas que são reflexos da guerra que vivi.
Venham mais cinco, para contar mais estórias destas que as há por aí.
José Teixeira
(1º cabo enfermeiro Teixeira, da CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá, Empada, 1968/70).
Aqui vão mais estórias do Zé Teixeira... Chamemos-lhe narrativas autobiográficas. Escrevê-las faz-lhe bem a ele; lê-las faz-nos bem a nós... Obrigado, Zé! Foste um herói, és um herói! (LG)
Síndrome de guerra
Passados uns meses do regresso, em plena Baixa do Porto, assisti a um embate de duas viaturas. O estrondo assustou-me e desatei a correr, parecia um carteirista logo após ter feito a maroteira de sacar a carteira a algum incauto.
Parei no Carmo a cerca de 800 metros, ofegante e desorientado, o meu corpo tremia todo. Sentei-me numa cadeira no Café piolho e pus-me a reflectir sobre o acontecido. Revi a cena e procurei compreender-me. As conclusões foram simples e rápidas: Vieram-me à memória as cenas de sangue que vivi na Guiné, o sangue ainda quente que senti nas minhas mãos, os feridos e mortos que entraram na minha vida como enfermeiro à força. Tive medo de que houvesse feridos e tudo voltasse a acontecer.
Ainda não sou capaz de parar junto de um acidente em estrada. Não dá para entender.
Passados uns anos sentia-me muito irritável. Tudo me angustiava. Reagia sobretudo com a família de forma menos correcta o que não era consentâneo com a minha maneira de pensar, ser e estar na vida.
Procurei um neurologista amigo. Falei largos minutos, mais de uma hora, talvez. A receita deixou-me de boca aberta:
- São efeitos secundários da guerra que viveste, e que estão a vir ao de cima. Os medicamentos não curam isso. Só o tempo te vai ajudar. -
E o tempo tem vinmdo, de facto, a ajudar. Aconselhou-me a deixar o tabaco, o que não era problema, pois desde que fui para a tropa que tinha saído dos meus hábitos. Deixar de tomar café, o que foi mais difícil. Aguentei oito dias e para comemorar, voltei . Só que felizmente foi ao fim da tarde e com estava em desintoxicação, passei a noite sem dormir e depois… aguentei mais de dez anos. Hoje tomo um por dia, da parte de manhã.
Aconselhou-me ainda a não abusar do álcool, o que também não era problema, pelo que ainda aqui estou.
Em 1999 tive de fazer um exame ao aparelho auditivo, devido a uns ruídos estranhos que sentia e por cá ficaram. Trata-se de artero-esclerose dos vasos capilares auditivos, que origina um ruído do sangue ao forçar a sua passagem nos vasos. Nada de grave, só que levarei esses ruídos para a cova um dia. Incomoda, mas não dói, nem afecta a saúde.
O estranho é a descoberta que o médico fez. Tenho uma quebra de audição nos sons agudos de cerca de 20%. Pergunta-me o médico:
- Andou na guerra ?
- Sim estive na Guiné entre 1968 a 1970.
- Mas andou mesmo nas zonas de combate ?
- Sim, sofri muitos ataques, acompanhei ataques, sofri emboscadas . . .
- Então está explicado a sua quebra de audição nos agudos. Chama-se síndrome de guerra e está dentro dos limites previstos, não se preocupe porque não vai evoluir, disse o médico.
Chega de estórias estranhas à guerra, mas que são reflexos da guerra que vivi.
Venham mais cinco, para contar mais estórias destas que as há por aí.
José Teixeira
(1º cabo enfermeiro Teixeira, da CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá, Empada, 1968/70).
Guiné 63/74 - DCCXIX: Estórias do Zé Teixeira (7): Síndrome de guerra
Guiné-Bissau > Desenho inserido na publicação Conhecer para amar, amar para proteger: Rio Grande de Buba e Lagoa de Cufada. Bissau: Tiniguena. 1995.Imagem gentilmente cedida por José Teixeira (2006).
Aqui vão mais estórias do Zé Teixeira... Chamemos-lhe narrativas autobiográficas. Escrevê-las faz-lhe bem a ele; lê-las faz-nos bem a nós... Obrigado, Zé! Foste um herói, és um herói! (LG)
Síndrome de guerra
Passados uns meses do regresso, em plena Baixa do Porto, assisti a um embate de duas viaturas. O estrondo assustou-me e desatei a correr, parecia um carteirista logo após ter feito a maroteira de sacar a carteira a algum incauto.
Parei no Carmo a cerca de 800 metros, ofegante e desorientado, o meu corpo tremia todo. Sentei-me numa cadeira no Café piolho e pus-me a reflectir sobre o acontecido. Revi a cena e procurei compreender-me. As conclusões foram simples e rápidas: Vieram-me à memória as cenas de sangue que vivi na Guiné, o sangue ainda quente que senti nas minhas mãos, os feridos e mortos que entraram na minha vida como enfermeiro à força. Tive medo de que houvesse feridos e tudo voltasse a acontecer.
Ainda não sou capaz de parar junto de um acidente em estrada. Não dá para entender.
Passados uns anos sentia-me muito irritável. Tudo me angustiava. Reagia sobretudo com a família de forma menos correcta o que não era consentâneo com a minha maneira de pensar, ser e estar na vida.
Procurei um neurologista amigo. Falei largos minutos, mais de uma hora, talvez. A receita deixou-me de boca aberta:
- São efeitos secundários da guerra que viveste, e que estão a vir ao de cima. Os medicamentos não curam isso. Só o tempo te vai ajudar. -
E o tempo tem vinmdo, de facto, a ajudar. Aconselhou-me a deixar o tabaco, o que não era problema, pois desde que fui para a tropa que tinha saído dos meus hábitos. Deixar de tomar café, o que foi mais difícil. Aguentei oito dias e para comemorar, voltei . Só que felizmente foi ao fim da tarde e com estava em desintoxicação, passei a noite sem dormir e depois… aguentei mais de dez anos. Hoje tomo um por dia, da parte de manhã.
Aconselhou-me ainda a não abusar do álcool, o que também não era problema, pelo que ainda aqui estou.
Em 1999 tive de fazer um exame ao aparelho auditivo, devido a uns ruídos estranhos que sentia e por cá ficaram. Trata-se de artero-esclerose dos vasos capilares auditivos, que origina um ruído do sangue ao forçar a sua passagem nos vasos. Nada de grave, só que levarei esses ruídos para a cova um dia. Incomoda, mas não dói, nem afecta a saúde.
O estranho é a descoberta que o médico fez. Tenho uma quebra de audição nos sons agudos de cerca de 20%. Pergunta-me o médico:
- Andou na guerra ?
- Sim estive na Guiné entre 1968 a 1970.
- Mas andou mesmo nas zonas de combate ?
- Sim, sofri muitos ataques, acompanhei ataques, sofri emboscadas . . .
- Então está explicado a sua quebra de audição nos agudos. Chama-se síndrome de guerra e está dentro dos limites previstos, não se preocupe porque não vai evoluir, disse o médico.
Chega de estórias estranhas à guerra, mas que são reflexos da guerra que vivi.
Venham mais cinco, para contar mais estórias destas que as há por aí.
José Teixeira
(1º cabo enfermeiro Teixeira, da CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá, Empada, 1968/70).
Aqui vão mais estórias do Zé Teixeira... Chamemos-lhe narrativas autobiográficas. Escrevê-las faz-lhe bem a ele; lê-las faz-nos bem a nós... Obrigado, Zé! Foste um herói, és um herói! (LG)
Síndrome de guerra
Passados uns meses do regresso, em plena Baixa do Porto, assisti a um embate de duas viaturas. O estrondo assustou-me e desatei a correr, parecia um carteirista logo após ter feito a maroteira de sacar a carteira a algum incauto.
Parei no Carmo a cerca de 800 metros, ofegante e desorientado, o meu corpo tremia todo. Sentei-me numa cadeira no Café piolho e pus-me a reflectir sobre o acontecido. Revi a cena e procurei compreender-me. As conclusões foram simples e rápidas: Vieram-me à memória as cenas de sangue que vivi na Guiné, o sangue ainda quente que senti nas minhas mãos, os feridos e mortos que entraram na minha vida como enfermeiro à força. Tive medo de que houvesse feridos e tudo voltasse a acontecer.
Ainda não sou capaz de parar junto de um acidente em estrada. Não dá para entender.
Passados uns anos sentia-me muito irritável. Tudo me angustiava. Reagia sobretudo com a família de forma menos correcta o que não era consentâneo com a minha maneira de pensar, ser e estar na vida.
Procurei um neurologista amigo. Falei largos minutos, mais de uma hora, talvez. A receita deixou-me de boca aberta:
- São efeitos secundários da guerra que viveste, e que estão a vir ao de cima. Os medicamentos não curam isso. Só o tempo te vai ajudar. -
E o tempo tem vinmdo, de facto, a ajudar. Aconselhou-me a deixar o tabaco, o que não era problema, pois desde que fui para a tropa que tinha saído dos meus hábitos. Deixar de tomar café, o que foi mais difícil. Aguentei oito dias e para comemorar, voltei . Só que felizmente foi ao fim da tarde e com estava em desintoxicação, passei a noite sem dormir e depois… aguentei mais de dez anos. Hoje tomo um por dia, da parte de manhã.
Aconselhou-me ainda a não abusar do álcool, o que também não era problema, pelo que ainda aqui estou.
Em 1999 tive de fazer um exame ao aparelho auditivo, devido a uns ruídos estranhos que sentia e por cá ficaram. Trata-se de artero-esclerose dos vasos capilares auditivos, que origina um ruído do sangue ao forçar a sua passagem nos vasos. Nada de grave, só que levarei esses ruídos para a cova um dia. Incomoda, mas não dói, nem afecta a saúde.
O estranho é a descoberta que o médico fez. Tenho uma quebra de audição nos sons agudos de cerca de 20%. Pergunta-me o médico:
- Andou na guerra ?
- Sim estive na Guiné entre 1968 a 1970.
- Mas andou mesmo nas zonas de combate ?
- Sim, sofri muitos ataques, acompanhei ataques, sofri emboscadas . . .
- Então está explicado a sua quebra de audição nos agudos. Chama-se síndrome de guerra e está dentro dos limites previstos, não se preocupe porque não vai evoluir, disse o médico.
Chega de estórias estranhas à guerra, mas que são reflexos da guerra que vivi.
Venham mais cinco, para contar mais estórias destas que as há por aí.
José Teixeira
(1º cabo enfermeiro Teixeira, da CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá, Empada, 1968/70).
Guiné 63/74 - DCCXVIII: Estórias do Zé Teixeira (6): um atribulado regresso
Post nº 718 (DCCXVIII)
José Teixeira, ex- 1º cabo enfermeiro, CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá, Empada, 1968/70.
© José Teixeira (2006)
Atribulado regresso
Quando soubemos a data definitiva da partida de Bissau foi um alegre alvoroço (1). Cada um pensava como ia conseguir descortinar a família no cais de desembarque, em Lisboa, tal seria a multidão. Os Enfermeiros decidiram fazer um cartaz com uma cruz vermelha e a palavra Empada para se dar a reconhecer às respectivas famílias.
Escreveu-se para as famílias a dar a informação e a pedir para estas corresponderam da mesmo modo. Chegados ao cais, após uma noite não dormida no alto Tejo, com Lisboa à vista, há que desfraldar o cartaz e as famílias foram dando sinais, só a minha é que não aparecia. Fiquei sozinho com o cartaz, já enrolado e continuei a percorrer o barco de ponta a ponta com os olhos postos na enorme plateia de gente que acenava, chamava, gritava pelos nomes dos seus queridos, só eu, nada.
Lá vislumbrei a minha cunhada e o meu irmão. Saltei de alegria, comecei a dar pancadas na borda do barco com o pau da bandeira e nesse instante entrei num estado de amnésia. Desliguei-me desta cena e continuei a procura, por estranho que pareça, da minha família, que tinha acabado de localizar. Fui dos últimos a descer do barco, deixei os trastes, junto de um colega que estava já com os seus familiares e fui à procura de quem já tinha localizado, mas não me recordava.
Minha mãe e meus irmãos fixaram-se no sítio onde estavam e olhavam para mim lá em cima, estranhavam que não descesse e mais estranharam quando desembarquei, passei por duas vezes a cerca de dois metros deles, não os ouvia chamar por mim e continuava à sua procura.
Matosinhos > O Zé Teixeira, hoje, ex-gerente bancário, reformado, contador de estórias da Guiné, apaixonado pela Guiné e pelo seu povo... Voltou lá em 2005...© José Teixeira (2006)
Encontrei a minha namorada, hoje minha esposa, e lá continuamos à procura, até que sinto uma mão a agarrar-me. Era o meu irmão que tinha saltado a barreira de controlo. Claro que este momento de reencontro foi de extrema felicidade, mas notei por parte da minha mãe, alguma frieza que se alastrou a toda a família e que durou por cerca de 8 dias.
Argumentavam que eu os tinha localizado do barco. Eu negava. Insistiam que passei junto a eles já no Cais por duas vezes e chamavam por mim, que eu olhava e continuava em frente. Eu negava. Pois é, preocupava-me mais em procurar a namorada que a minha querida mãe. Estava aqui o busílis da questão.
,
reformado
© José Teixeira (2006)
O mal estar em surdina era profundo. Evitavam falar comigo. Pensei em sair de casa, apesar de estar sem cheta e desempregado. Um dia, minha irmã, que não tinha ido esperar-me, chegou da escola nocturna e sentou-se a beira da minha cama. Era a única que procurava entender-me. O assunto foi o que nos desunia. Começou por comigo refazer a história que eu negava. Dizia ela:
- Tu andavas no barco de um lado para o outro, fazias muitos gestos para as pessoas que estavam no Cais e, em determinado momento, localizaste a nossa família. Dizem que entraste em euforia, aos saltos e bateste com um pau na borda do barco.
Pegou na régua que trazia com ela e repetiu o gesto na borda da cama:
- Truz ! Truz ! Truz!
Três pancadas que senti na minha cabeça e fez-se luz, na minha memória. Revi num ápice todas as cenas que se passaram e era tudo verdadeiro o que minha mãe afirmava.
Saltei da cama e fui ter com ela que já dormia a sono solto.
Deixo aos prezados leitores a construção do imaginário que se seguiu.
© José Teixeira (2006)
Vd. também o Blogue > Os Maiorais de Empada
___________
Nota de L.G.
(1) Vd post de 14d e Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCXXVI: O meu diário (Zé Teixeira) (fim): Confesso que vi e vivi
José Teixeira, ex- 1º cabo enfermeiro, CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá, Empada, 1968/70.
© José Teixeira (2006)
Atribulado regresso
Quando soubemos a data definitiva da partida de Bissau foi um alegre alvoroço (1). Cada um pensava como ia conseguir descortinar a família no cais de desembarque, em Lisboa, tal seria a multidão. Os Enfermeiros decidiram fazer um cartaz com uma cruz vermelha e a palavra Empada para se dar a reconhecer às respectivas famílias.
Escreveu-se para as famílias a dar a informação e a pedir para estas corresponderam da mesmo modo. Chegados ao cais, após uma noite não dormida no alto Tejo, com Lisboa à vista, há que desfraldar o cartaz e as famílias foram dando sinais, só a minha é que não aparecia. Fiquei sozinho com o cartaz, já enrolado e continuei a percorrer o barco de ponta a ponta com os olhos postos na enorme plateia de gente que acenava, chamava, gritava pelos nomes dos seus queridos, só eu, nada.
Lá vislumbrei a minha cunhada e o meu irmão. Saltei de alegria, comecei a dar pancadas na borda do barco com o pau da bandeira e nesse instante entrei num estado de amnésia. Desliguei-me desta cena e continuei a procura, por estranho que pareça, da minha família, que tinha acabado de localizar. Fui dos últimos a descer do barco, deixei os trastes, junto de um colega que estava já com os seus familiares e fui à procura de quem já tinha localizado, mas não me recordava.
Minha mãe e meus irmãos fixaram-se no sítio onde estavam e olhavam para mim lá em cima, estranhavam que não descesse e mais estranharam quando desembarquei, passei por duas vezes a cerca de dois metros deles, não os ouvia chamar por mim e continuava à sua procura.
Matosinhos > O Zé Teixeira, hoje, ex-gerente bancário, reformado, contador de estórias da Guiné, apaixonado pela Guiné e pelo seu povo... Voltou lá em 2005...© José Teixeira (2006)
Encontrei a minha namorada, hoje minha esposa, e lá continuamos à procura, até que sinto uma mão a agarrar-me. Era o meu irmão que tinha saltado a barreira de controlo. Claro que este momento de reencontro foi de extrema felicidade, mas notei por parte da minha mãe, alguma frieza que se alastrou a toda a família e que durou por cerca de 8 dias.
Argumentavam que eu os tinha localizado do barco. Eu negava. Insistiam que passei junto a eles já no Cais por duas vezes e chamavam por mim, que eu olhava e continuava em frente. Eu negava. Pois é, preocupava-me mais em procurar a namorada que a minha querida mãe. Estava aqui o busílis da questão.
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reformado
© José Teixeira (2006)
O mal estar em surdina era profundo. Evitavam falar comigo. Pensei em sair de casa, apesar de estar sem cheta e desempregado. Um dia, minha irmã, que não tinha ido esperar-me, chegou da escola nocturna e sentou-se a beira da minha cama. Era a única que procurava entender-me. O assunto foi o que nos desunia. Começou por comigo refazer a história que eu negava. Dizia ela:
- Tu andavas no barco de um lado para o outro, fazias muitos gestos para as pessoas que estavam no Cais e, em determinado momento, localizaste a nossa família. Dizem que entraste em euforia, aos saltos e bateste com um pau na borda do barco.
Pegou na régua que trazia com ela e repetiu o gesto na borda da cama:
- Truz ! Truz ! Truz!
Três pancadas que senti na minha cabeça e fez-se luz, na minha memória. Revi num ápice todas as cenas que se passaram e era tudo verdadeiro o que minha mãe afirmava.
Saltei da cama e fui ter com ela que já dormia a sono solto.
Deixo aos prezados leitores a construção do imaginário que se seguiu.
© José Teixeira (2006)
Vd. também o Blogue > Os Maiorais de Empada
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Nota de L.G.
(1) Vd post de 14d e Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCXXVI: O meu diário (Zé Teixeira) (fim): Confesso que vi e vivi
Guiné 63/74 - DCCXVIII: Estórias do Zé Teixeira (6): um atribulado regresso
Post nº 718 (DCCXVIII)
José Teixeira, ex- 1º cabo enfermeiro, CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá, Empada, 1968/70.
© José Teixeira (2006)
Atribulado regresso
Quando soubemos a data definitiva da partida de Bissau foi um alegre alvoroço (1). Cada um pensava como ia conseguir descortinar a família no cais de desembarque, em Lisboa, tal seria a multidão. Os Enfermeiros decidiram fazer um cartaz com uma cruz vermelha e a palavra Empada para se dar a reconhecer às respectivas famílias.
Escreveu-se para as famílias a dar a informação e a pedir para estas corresponderam da mesmo modo. Chegados ao cais, após uma noite não dormida no alto Tejo, com Lisboa à vista, há que desfraldar o cartaz e as famílias foram dando sinais, só a minha é que não aparecia. Fiquei sozinho com o cartaz, já enrolado e continuei a percorrer o barco de ponta a ponta com os olhos postos na enorme plateia de gente que acenava, chamava, gritava pelos nomes dos seus queridos, só eu, nada.
Lá vislumbrei a minha cunhada e o meu irmão. Saltei de alegria, comecei a dar pancadas na borda do barco com o pau da bandeira e nesse instante entrei num estado de amnésia. Desliguei-me desta cena e continuei a procura, por estranho que pareça, da minha família, que tinha acabado de localizar. Fui dos últimos a descer do barco, deixei os trastes, junto de um colega que estava já com os seus familiares e fui à procura de quem já tinha localizado, mas não me recordava.
Minha mãe e meus irmãos fixaram-se no sítio onde estavam e olhavam para mim lá em cima, estranhavam que não descesse e mais estranharam quando desembarquei, passei por duas vezes a cerca de dois metros deles, não os ouvia chamar por mim e continuava à sua procura.
Matosinhos > O Zé Teixeira, hoje, ex-gerente bancário, reformado, contador de estórias da Guiné, apaixonado pela Guiné e pelo seu povo... Voltou lá em 2005...© José Teixeira (2006)
Encontrei a minha namorada, hoje minha esposa, e lá continuamos à procura, até que sinto uma mão a agarrar-me. Era o meu irmão que tinha saltado a barreira de controlo. Claro que este momento de reencontro foi de extrema felicidade, mas notei por parte da minha mãe, alguma frieza que se alastrou a toda a família e que durou por cerca de 8 dias.
Argumentavam que eu os tinha localizado do barco. Eu negava. Insistiam que passei junto a eles já no Cais por duas vezes e chamavam por mim, que eu olhava e continuava em frente. Eu negava. Pois é, preocupava-me mais em procurar a namorada que a minha querida mãe. Estava aqui o busílis da questão.
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reformado
© José Teixeira (2006)
O mal estar em surdina era profundo. Evitavam falar comigo. Pensei em sair de casa, apesar de estar sem cheta e desempregado. Um dia, minha irmã, que não tinha ido esperar-me, chegou da escola nocturna e sentou-se a beira da minha cama. Era a única que procurava entender-me. O assunto foi o que nos desunia. Começou por comigo refazer a história que eu negava. Dizia ela:
- Tu andavas no barco de um lado para o outro, fazias muitos gestos para as pessoas que estavam no Cais e, em determinado momento, localizaste a nossa família. Dizem que entraste em euforia, aos saltos e bateste com um pau na borda do barco.
Pegou na régua que trazia com ela e repetiu o gesto na borda da cama:
- Truz ! Truz ! Truz!
Três pancadas que senti na minha cabeça e fez-se luz, na minha memória. Revi num ápice todas as cenas que se passaram e era tudo verdadeiro o que minha mãe afirmava.
Saltei da cama e fui ter com ela que já dormia a sono solto.
Deixo aos prezados leitores a construção do imaginário que se seguiu.
© José Teixeira (2006)
Vd. também o Blogue > Os Maiorais de Empada
___________
Nota de L.G.
(1) Vd post de 14d e Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCXXVI: O meu diário (Zé Teixeira) (fim): Confesso que vi e vivi
José Teixeira, ex- 1º cabo enfermeiro, CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá, Empada, 1968/70.
© José Teixeira (2006)
Atribulado regresso
Quando soubemos a data definitiva da partida de Bissau foi um alegre alvoroço (1). Cada um pensava como ia conseguir descortinar a família no cais de desembarque, em Lisboa, tal seria a multidão. Os Enfermeiros decidiram fazer um cartaz com uma cruz vermelha e a palavra Empada para se dar a reconhecer às respectivas famílias.
Escreveu-se para as famílias a dar a informação e a pedir para estas corresponderam da mesmo modo. Chegados ao cais, após uma noite não dormida no alto Tejo, com Lisboa à vista, há que desfraldar o cartaz e as famílias foram dando sinais, só a minha é que não aparecia. Fiquei sozinho com o cartaz, já enrolado e continuei a percorrer o barco de ponta a ponta com os olhos postos na enorme plateia de gente que acenava, chamava, gritava pelos nomes dos seus queridos, só eu, nada.
Lá vislumbrei a minha cunhada e o meu irmão. Saltei de alegria, comecei a dar pancadas na borda do barco com o pau da bandeira e nesse instante entrei num estado de amnésia. Desliguei-me desta cena e continuei a procura, por estranho que pareça, da minha família, que tinha acabado de localizar. Fui dos últimos a descer do barco, deixei os trastes, junto de um colega que estava já com os seus familiares e fui à procura de quem já tinha localizado, mas não me recordava.
Minha mãe e meus irmãos fixaram-se no sítio onde estavam e olhavam para mim lá em cima, estranhavam que não descesse e mais estranharam quando desembarquei, passei por duas vezes a cerca de dois metros deles, não os ouvia chamar por mim e continuava à sua procura.
Matosinhos > O Zé Teixeira, hoje, ex-gerente bancário, reformado, contador de estórias da Guiné, apaixonado pela Guiné e pelo seu povo... Voltou lá em 2005...© José Teixeira (2006)
Encontrei a minha namorada, hoje minha esposa, e lá continuamos à procura, até que sinto uma mão a agarrar-me. Era o meu irmão que tinha saltado a barreira de controlo. Claro que este momento de reencontro foi de extrema felicidade, mas notei por parte da minha mãe, alguma frieza que se alastrou a toda a família e que durou por cerca de 8 dias.
Argumentavam que eu os tinha localizado do barco. Eu negava. Insistiam que passei junto a eles já no Cais por duas vezes e chamavam por mim, que eu olhava e continuava em frente. Eu negava. Pois é, preocupava-me mais em procurar a namorada que a minha querida mãe. Estava aqui o busílis da questão.
,
reformado
© José Teixeira (2006)
O mal estar em surdina era profundo. Evitavam falar comigo. Pensei em sair de casa, apesar de estar sem cheta e desempregado. Um dia, minha irmã, que não tinha ido esperar-me, chegou da escola nocturna e sentou-se a beira da minha cama. Era a única que procurava entender-me. O assunto foi o que nos desunia. Começou por comigo refazer a história que eu negava. Dizia ela:
- Tu andavas no barco de um lado para o outro, fazias muitos gestos para as pessoas que estavam no Cais e, em determinado momento, localizaste a nossa família. Dizem que entraste em euforia, aos saltos e bateste com um pau na borda do barco.
Pegou na régua que trazia com ela e repetiu o gesto na borda da cama:
- Truz ! Truz ! Truz!
Três pancadas que senti na minha cabeça e fez-se luz, na minha memória. Revi num ápice todas as cenas que se passaram e era tudo verdadeiro o que minha mãe afirmava.
Saltei da cama e fui ter com ela que já dormia a sono solto.
Deixo aos prezados leitores a construção do imaginário que se seguiu.
© José Teixeira (2006)
Vd. também o Blogue > Os Maiorais de Empada
___________
Nota de L.G.
(1) Vd post de 14d e Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCXXVI: O meu diário (Zé Teixeira) (fim): Confesso que vi e vivi
Guiné 63/74 - DCCXVII: Estórias cabralianas (9): Má chegada, pior partida
Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > 1970 > Jovem fula ou mandinga vestido o seu grandbubu, e protegemdo-se da canícula por intermédio do seu inseparável chapéu automático (dois luxos que chegavam à tabancas do interior, graças ao comércio dos djilas do tchon francês e ao patacon ganho na tropa) (LG).
Arquivo pessoal de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71).
© Humberto Reis (2006).
N/M Alfredo da Silva: foto obtida (com a devida vénia) do excelente sítio Navios Mercantes Portugueses, de visita obrigatória para quem quiser relembrar ou conhecer o nosso passado de potência marítima...
O Alfredo da Silva era um navio misto, de carga e de passageiros, construído pela CUF - Companhia União Fabril, em Lisboa, em 1949 e abatido em 1973. Ostenta de resto o nome do fundador daquele grupo económico cujos interesses, na Guiné, eram representados pela sua subsidiária, a famosa Casa Gouveia. O seu comprimento não chegava aos 103 metros. A sua arqueação bruta era de 3.374 toneladas. Teve dois armadores: Sociedade Geral de Comércio, Indústria e Transportes, Lisboa (1950-1972); e Companhia Nacional de Navegação, Lisboa (1972-1973). Velocidade de cruzeiro: 12 nós. Alojamentos para 20 passageiros em primeira classe e 68 em classe turística, num total de 88 passageiros. Nº de tripulantes: 45. Foi este navio da marinha mercante que levou até à Guiné o nosso amigo e camarada Jorge Cabral, em 1969.
Texto de Jorge Cabral (ex-Alferes Miliciano de Artilharia, comandante do Pel Caç Nat 63, destacado em Fá Mandinga e depois em Missirá, Sector L1 - Bambadinca, Zona Leste, 1969/71):
Má chegada, pior partida – mas sempre sob a ameaça de uma porrada
Com destino à Guerra, viajei no Alfredo da Silva, quase um cacilheiro, durante doze dias. Em primeira classe, sete oficiais e uma dona puta em pré-reforma habitavam um ambiente de opereta, jantando de gravata, com a estafada dama na mesa do comando. Depois havia a valsa… Cheirava a mofo, a decadência, ao fim do Império…
Cheguei à noite, sentindo logo a África, no calor, na cor, na humidade. A bordo subiram militares, e o putativo marido da senhora, cuja profissão nunca descobri. Um sargento gago carimbou-me a guia de marcha e assinalou:
- Pel. Caç. Nat. 63. - Bem lhe perguntei o significado da sigla e para onde ia, mas não sabia ou não quis dizer.
Desembarcado, apanhei uma boleia num camião militar carregado de batatas, que me deixou no Biafra, depósito de alferes em trânsito por Bissau.
Talvez para impressionarem o periquito, todos se mostraram totalmente apanhados. Quanto ao meu destino foram animadores…
- É pá, vais para um pelotão de nharros. É só embrulhar. Estás lixado.
Apresentado no Quartel-General, ordenaram-me a partida para o Xime. Tinha que tomar um Barco no dia seguinte, às tantas horas. Regressado ao Biafra, aconselharam-me a não ir:
- Recusa-te. Os Barcos são sempre atacados.
Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Fá Mandinga > 1970 > Um dia o Jorge Cabral sonhou que podia ser fula entre os fulas, mandinga entre os mandingas, guinéu entre os guinéus, homem entre os homens e até louco entre os loucos... Afinal, todos nós temos direito a um pouco de loucura e de humanidade, o que implica pôr-nos na pele do outro (LG).
© Jorge Cabral (2005)
Confiante na experiência dos velhinhos, falhei o embarque tendo voltado ao Q. G. Aí um Capitão barrigudo, passou-me a um Major nervoso, que me remeteu para um Tenente-Coronel que, quase apopléctico, me descompôs:
- Começa mal! Está a pedir uma porrada. As ordens são para cumprir. Desapareça da minha vista!
Desapareci, e o certo é que fui de avião para Bafatá.
Muitos dias, muitos meses, mais de dois anos passaram e eu continuei no mato. (As cunhas funcionavam na perfeição. Chegados a Bissau, em rendição individual, podiam ser encaixados, sem grande escândalo, em qualquer Repartição.) Tinha porém de ser rendido, e a solução foi encontrada a nível de Batalhão, substituindo-me por um alferes da Companhia de Mansambo.
Entretanto o meu Pelotão foi para a ponte do rio Undunduma e a Missirá voltou o Pel Caç Nat 52, tendo eu permanecido mais três semanas, e entrado ainda numa operação, na qual morreram dois soldados africanos que, indo a fumar o mesmo cigarro, accionaram uma mina anti-pessoal reforçada.
Finalmente, e após uns dias em Bambadinca, embarquei no Xime com destino a Bissau. Recusara à chegada, mas afinal regressava de barco… e ao Biafra. Agora eu era o velhinho e o apanhado.
No dia da partida, eu que cismara aparecer em Lisboa vestido com o grandbubu azul, bordado a ouro, que comprara a um djila senegalês em Missirá, resolvera mandar encurtar a vestimenta a um costureiro de rua. Enquanto esperava, passou por mim um furriel conhecido, que me alertou, o voo havia sido antecipado. À pressa, pego no fato, meto-me num táxi e vou para Bissalanca (toda a minha bagagem, fotografias, o meu diário, os versos que escrevi, ficaram no Biafra).
Chegado ao aeroporto enverguei o meu traje, causando o espanto e o riso dos passageiros, militares. Eis que sou cercado por um Coronel e dois Majores, os quais em coro me determinam:
– Não pode ir assim, é uma vergonha, lembre-se que é um oficial, blá, blá, blá…
Tento contestar:
- Se um fula pode embarcar com um fato europeu, porque não posso eu ir vestido à fula?
Nada feito, se persistir não vou e levarei uma porrada. Obrigado a obedecer, lá entro no avião, no qual segue também o Coronel, o que impediu de me fardar a bordo.
Teimoso porém, mal chego a Lisboa, envergo o grandbubu, e é com ele vestido que abraço a família. Franze o sobrolho o meu pai que me diz que o Carnaval ainda não chegou, que tenha juízo e não o faça passar vergonhas… Quanto à minha mãe, chora, talvez de alegria, mas muito mais de tristeza. Coitado do filho…enlouqueceu.
Num destes dias vou de novo vestir o meu grandbubu. Pode ser que tenha conquistado o direito a um pouco de loucura. Talvez…
Arquivo pessoal de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71).
© Humberto Reis (2006).
N/M Alfredo da Silva: foto obtida (com a devida vénia) do excelente sítio Navios Mercantes Portugueses, de visita obrigatória para quem quiser relembrar ou conhecer o nosso passado de potência marítima...
O Alfredo da Silva era um navio misto, de carga e de passageiros, construído pela CUF - Companhia União Fabril, em Lisboa, em 1949 e abatido em 1973. Ostenta de resto o nome do fundador daquele grupo económico cujos interesses, na Guiné, eram representados pela sua subsidiária, a famosa Casa Gouveia. O seu comprimento não chegava aos 103 metros. A sua arqueação bruta era de 3.374 toneladas. Teve dois armadores: Sociedade Geral de Comércio, Indústria e Transportes, Lisboa (1950-1972); e Companhia Nacional de Navegação, Lisboa (1972-1973). Velocidade de cruzeiro: 12 nós. Alojamentos para 20 passageiros em primeira classe e 68 em classe turística, num total de 88 passageiros. Nº de tripulantes: 45. Foi este navio da marinha mercante que levou até à Guiné o nosso amigo e camarada Jorge Cabral, em 1969.
Texto de Jorge Cabral (ex-Alferes Miliciano de Artilharia, comandante do Pel Caç Nat 63, destacado em Fá Mandinga e depois em Missirá, Sector L1 - Bambadinca, Zona Leste, 1969/71):
Má chegada, pior partida – mas sempre sob a ameaça de uma porrada
Com destino à Guerra, viajei no Alfredo da Silva, quase um cacilheiro, durante doze dias. Em primeira classe, sete oficiais e uma dona puta em pré-reforma habitavam um ambiente de opereta, jantando de gravata, com a estafada dama na mesa do comando. Depois havia a valsa… Cheirava a mofo, a decadência, ao fim do Império…
Cheguei à noite, sentindo logo a África, no calor, na cor, na humidade. A bordo subiram militares, e o putativo marido da senhora, cuja profissão nunca descobri. Um sargento gago carimbou-me a guia de marcha e assinalou:
- Pel. Caç. Nat. 63. - Bem lhe perguntei o significado da sigla e para onde ia, mas não sabia ou não quis dizer.
Desembarcado, apanhei uma boleia num camião militar carregado de batatas, que me deixou no Biafra, depósito de alferes em trânsito por Bissau.
Talvez para impressionarem o periquito, todos se mostraram totalmente apanhados. Quanto ao meu destino foram animadores…
- É pá, vais para um pelotão de nharros. É só embrulhar. Estás lixado.
Apresentado no Quartel-General, ordenaram-me a partida para o Xime. Tinha que tomar um Barco no dia seguinte, às tantas horas. Regressado ao Biafra, aconselharam-me a não ir:
- Recusa-te. Os Barcos são sempre atacados.
Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Fá Mandinga > 1970 > Um dia o Jorge Cabral sonhou que podia ser fula entre os fulas, mandinga entre os mandingas, guinéu entre os guinéus, homem entre os homens e até louco entre os loucos... Afinal, todos nós temos direito a um pouco de loucura e de humanidade, o que implica pôr-nos na pele do outro (LG).
© Jorge Cabral (2005)
Confiante na experiência dos velhinhos, falhei o embarque tendo voltado ao Q. G. Aí um Capitão barrigudo, passou-me a um Major nervoso, que me remeteu para um Tenente-Coronel que, quase apopléctico, me descompôs:
- Começa mal! Está a pedir uma porrada. As ordens são para cumprir. Desapareça da minha vista!
Desapareci, e o certo é que fui de avião para Bafatá.
Muitos dias, muitos meses, mais de dois anos passaram e eu continuei no mato. (As cunhas funcionavam na perfeição. Chegados a Bissau, em rendição individual, podiam ser encaixados, sem grande escândalo, em qualquer Repartição.) Tinha porém de ser rendido, e a solução foi encontrada a nível de Batalhão, substituindo-me por um alferes da Companhia de Mansambo.
Entretanto o meu Pelotão foi para a ponte do rio Undunduma e a Missirá voltou o Pel Caç Nat 52, tendo eu permanecido mais três semanas, e entrado ainda numa operação, na qual morreram dois soldados africanos que, indo a fumar o mesmo cigarro, accionaram uma mina anti-pessoal reforçada.
Finalmente, e após uns dias em Bambadinca, embarquei no Xime com destino a Bissau. Recusara à chegada, mas afinal regressava de barco… e ao Biafra. Agora eu era o velhinho e o apanhado.
No dia da partida, eu que cismara aparecer em Lisboa vestido com o grandbubu azul, bordado a ouro, que comprara a um djila senegalês em Missirá, resolvera mandar encurtar a vestimenta a um costureiro de rua. Enquanto esperava, passou por mim um furriel conhecido, que me alertou, o voo havia sido antecipado. À pressa, pego no fato, meto-me num táxi e vou para Bissalanca (toda a minha bagagem, fotografias, o meu diário, os versos que escrevi, ficaram no Biafra).
Chegado ao aeroporto enverguei o meu traje, causando o espanto e o riso dos passageiros, militares. Eis que sou cercado por um Coronel e dois Majores, os quais em coro me determinam:
– Não pode ir assim, é uma vergonha, lembre-se que é um oficial, blá, blá, blá…
Tento contestar:
- Se um fula pode embarcar com um fato europeu, porque não posso eu ir vestido à fula?
Nada feito, se persistir não vou e levarei uma porrada. Obrigado a obedecer, lá entro no avião, no qual segue também o Coronel, o que impediu de me fardar a bordo.
Teimoso porém, mal chego a Lisboa, envergo o grandbubu, e é com ele vestido que abraço a família. Franze o sobrolho o meu pai que me diz que o Carnaval ainda não chegou, que tenha juízo e não o faça passar vergonhas… Quanto à minha mãe, chora, talvez de alegria, mas muito mais de tristeza. Coitado do filho…enlouqueceu.
Num destes dias vou de novo vestir o meu grandbubu. Pode ser que tenha conquistado o direito a um pouco de loucura. Talvez…
Guiné 63/74 - DCCXVII: Estórias cabralianas (9): Má chegada, pior partida (Jorge Cabral)
Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > 1970 > Jovem fula ou mandinga vestido o seu grandbubu, e protegemdo-se da canícula por intermédio do seu inseparável chapéu automático (dois luxos que chegavam à tabancas do interior, graças ao comércio dos djilas do tchon francês e ao patacon ganho na tropa) (LG).
Arquivo pessoal de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71).
Foto: © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados
N/M Alfredo da Silva: foto obtida (com a devida vénia) do excelente sítio Navios Mercantes Portugueses, de visita obrigatória para quem quiser relembrar ou conhecer o nosso passado de potência marítima...
O Alfredo da Silva era um navio misto, de carga e de passageiros, construído pela CUF - Companhia União Fabril, em Lisboa, em 1949 e abatido em 1973. Ostenta de resto o nome do fundador daquele grupo económico cujos interesses, na Guiné, eram representados pela sua subsidiária, a famosa Casa Gouveia. O seu comprimento não chegava aos 103 metros. A sua arqueação bruta era de 3.374 toneladas. Teve dois armadores: Sociedade Geral de Comércio, Indústria e Transportes, Lisboa (1950-1972); e Companhia Nacional de Navegação, Lisboa (1972-1973). Velocidade de cruzeiro: 12 nós. Alojamentos para 20 passageiros em primeira classe e 68 em classe turística, num total de 88 passageiros. Nº de tripulantes: 45. Foi este navio da marinha mercante que levou até à Guiné o nosso amigo e camarada Jorge Cabral, em 1969.
Texto de Jorge Cabral (ex-Alferes Miliciano de Artilharia, comandante do Pel Caç Nat 63, destacado em Fá Mandinga e depois em Missirá, Sector L1 - Bambadinca, Zona Leste, 1969/71):
Má chegada, pior partida – mas sempre sob a ameaça de uma porrada
Com destino à Guerra, viajei no Alfredo da Silva, quase um cacilheiro, durante doze dias. Em primeira classe, sete oficiais e uma dona puta em pré-reforma habitavam um ambiente de opereta, jantando de gravata, com a estafada dama na mesa do comando. Depois havia a valsa… Cheirava a mofo, a decadência, ao fim do Império…
Cheguei à noite, sentindo logo a África, no calor, na cor, na humidade. A bordo subiram militares, e o putativo marido da senhora, cuja profissão nunca descobri. Um sargento gago carimbou-me a guia de marcha e assinalou:
- Pel. Caç. Nat. 63. - Bem lhe perguntei o significado da sigla e para onde ia, mas não sabia ou não quis dizer.
Desembarcado, apanhei uma boleia num camião militar carregado de batatas, que me deixou no Biafra, depósito de alferes em trânsito por Bissau.
Talvez para impressionarem o periquito, todos se mostraram totalmente apanhados. Quanto ao meu destino foram animadores…
- É pá, vais para um pelotão de nharros. É só embrulhar. Estás lixado.
Apresentado no Quartel-General, ordenaram-me a partida para o Xime. Tinha que tomar um Barco no dia seguinte, às tantas horas. Regressado ao Biafra, aconselharam-me a não ir:
- Recusa-te. Os Barcos são sempre atacados.
Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Fá Mandinga > 1970 > Um dia o Jorge Cabral sonhou que podia ser fula entre os fulas, mandinga entre os mandingas, guinéu entre os guinéus, homem entre os homens e até louco entre os loucos... Afinal, todos nós temos direito a um pouco de loucura e de humanidade, o que implica pôr-nos na pele do outro (LG).
© Jorge Cabral (2005)
Confiante na experiência dos velhinhos, falhei o embarque tendo voltado ao Q. G. Aí um Capitão barrigudo, passou-me a um Major nervoso, que me remeteu para um Tenente-Coronel que, quase apopléctico, me descompôs:
- Começa mal! Está a pedir uma porrada. As ordens são para cumprir. Desapareça da minha vista!
Desapareci, e o certo é que fui de avião para Bafatá.
Muitos dias, muitos meses, mais de dois anos passaram e eu continuei no mato. (As cunhas funcionavam na perfeição. Chegados a Bissau, em rendição individual, podiam ser encaixados, sem grande escândalo, em qualquer Repartição.) Tinha porém de ser rendido, e a solução foi encontrada a nível de Batalhão, substituindo-me por um alferes da Companhia de Mansambo.
Entretanto o meu Pelotão foi para a ponte do rio Udunduma e a Missirá voltou o Pel Caç Nat 52, tendo eu permanecido mais três semanas, e entrado ainda numa operação, na qual morreram dois soldados africanos que, indo a fumar o mesmo cigarro, accionaram uma mina anti-pessoal reforçada.
Finalmente, e após uns dias em Bambadinca, embarquei no Xime com destino a Bissau. Recusara à chegada, mas afinal regressava de barco… e ao Biafra. Agora eu era o velhinho e o apanhado.
No dia da partida, eu que cismara aparecer em Lisboa vestido com o grandbubu azul, bordado a ouro, que comprara a um djila senegalês em Missirá, resolvera mandar encurtar a vestimenta a um costureiro de rua. Enquanto esperava, passou por mim um furriel conhecido, que me alertou, o voo havia sido antecipado. À pressa, pego no fato, meto-me num táxi e vou para Bissalanca (toda a minha bagagem, fotografias, o meu diário, os versos que escrevi, ficaram no Biafra).
Chegado ao aeroporto enverguei o meu traje, causando o espanto e o riso dos passageiros, militares. Eis que sou cercado por um Coronel e dois Majores, os quais em coro me determinam:
– Não pode ir assim, é uma vergonha, lembre-se que é um oficial, blá, blá, blá…
Tento contestar:
- Se um fula pode embarcar com um fato europeu, porque não posso eu ir vestido à fula?
Nada feito, se persistir não vou e levarei uma porrada. Obrigado a obedecer, lá entro no avião, no qual segue também o Coronel, o que impediu de me fardar a bordo.
Teimoso porém, mal chego a Lisboa, envergo o grandbubu, e é com ele vestido que abraço a família. Franze o sobrolho o meu pai que me diz que o Carnaval ainda não chegou, que tenha juízo e não o faça passar vergonhas… Quanto à minha mãe, chora, talvez de alegria, mas muito mais de tristeza. Coitado do filho…enlouqueceu.
Num destes dias vou de novo vestir o meu grandbubu. Pode ser que tenha conquistado o direito a um pouco de loucura. Talvez…
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