18 dezembro 2005

Guiné 63/4 - CCCLXXXIV: Comandos à procura do Amílcar (Virgínio Briote)

Guiné > Brá > 1966 > O Alf Miliciano Comando Briote eo seu grupo, prontos a entrar em acção. © Virgínio Briote (2005)


Texto do Virgínio Briote:


À PROCURA DO AMÍLCAR (1)


No quarto em Brá, o capitão Leão sentou-se numa das camas.

O Amílcar Cabral esteve até ontem no Oio em reunião de quadros, dois ou três dias.

Está a retirar, a caminho do Senegal, para os lados de Sano, presume-se. Certeza é que já passou, está a passar ou vai sair pela zona de Bigene, num dos caminhos para a fronteira.

Está tudo mobilizado na zona, Força Aérea também, todas as tropas disponíveis nos trilhos para a fronteira. Uma boa oportunidade para o apanhar, que tal?

Amanhã, às 5 no aeroporto, nos helis. Vou estar em cima no PCA.

O Alegre teve que se pôr a pé, meteu-se no jeep para Bissau à procura dos furriéis. Reunião com eles, grupo acordado, conferir o material, o costume. Pequeno-almoço na cantina às 4 e meia, grupo ao corrente dos pormenores.

Era apenas uma hipótese em mil na melhor delas e, se os encontrássemos, teríamos que contar com uma larga coluna do IN a servir de escolta.

Levantaram à hora, com a Guiné a acordar, dirigiram-se para norte, pouco mais de meia hora depois estavam próximos da fronteira, T6 a aparecerem, a brilharem ao Sol, vai estar um dia quente.

Do heli viram os trilhos, o tenente Caldas, o piloto, a dizer-lhe para escolher. Onde quer ficar, talvez ali, sim, aí mesmo, OK, vamos baixar mais.

Ouviu a comunicação com o resto da esquadrilha, preparar a formação, por cima das árvores, abrir portas, uma mão no cinto outra na arma, saltar!

Tiros dispersos para os helis, a virarem-se em formação, os T6 lentos, a picarem, fumos a sair das asas, estrondos, mais uma vez o costume, nada que não tivesse acontecido antes.

Reagrupados, correram a abrigar-se, vegetação rasteira, não tinha muito aonde. Os T6, no rádio, diziam estar um pequeno grupo para aí a um km, na direcção da fronteira, iam picar nessa direcção. Coluna por um, trilho fora, o sol em cima deles, pegadas frescas, mais nada a não ser estrondos ao longe, de vários lados.

Pouco tempo depois, o PCA num DO a comunicar que já não havia sinais de movimento, informações agora mesmo a confirmar a presença de Amílcar Cabral no Oio, e que terá passado a fronteira há já algumas horas, por outra zona, mais para leste.

Terá? E as suas instruções, quais são? De momento não pode adiantar mais nada? O que sugiro? Não, nós não, aqui de baixo a vista alcança pouco, e aí em cima vê alguma coisa? Nada? Para procurarmos aqui em baixo, onde, pode dizer? Não sabe, cá em baixo é que devemos saber, OK, terminado.

Uma conversa que já tivera antes, lembrou-se, mas com outro protagonista.

Sempre em frente, a caminho da fronteira, nem tempo tiveram para meter guias da zona, iam por ali como se estivessem a subir a Avenida da Liberdade. A boca seca, borbotos brancos de saliva nos cantos dos lábios colados, uma chuvada agora é que vinha a calhar, nem uma nuvem, um sol muito grande. Ao longe, no caminho para lá, pareceu-lhes ver uma sombra de árvores.

Gigante, arranque com a sua equipa, olho vivo, atenção. Os 5 a andar, parecia um bailado, uma eternidade! Desapareceram na mata, uns minutos. Um sinal deles, lá foi o resto do grupo abrigar-se do sol.

Uma plantação de abacaxi, a crescer meia selvagem. Cortaram o que lhes apeteceu, sentaram-se à sombra, limparam a saliva da boca com fatias cortadas com o punhal. O silêncio, um oásis!

Tinha passado pelo Bento (2) depois de jantar, as pernas doridas a pedirem descanso, mas a levarem-no para a Sé, rua acima, as luzes das janelas a apagarem-se.

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Notas de L.G.

(1) Vd. o post anterior >Guiné 63/74 - CCCLXXXIII: O que diziam os jornais estrangeiros (1): Le Nouvel Observateur no Morès

(2) Café Bento, ou a 5ª Rep, em Bissau, onde se juntavam os militares.

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