07 junho 2005

Guiné 69/71 - XLIX: Samba Culo II

Texto de A. Marques Lopes, ex-alferes miliciano da CART 1690 (Geba, 1968) e actualmente coronel (DFA) na situação de reforma:

Na Op Inquietar II conseguiu-se o objectivo: a base de Samba Culo foi mesmo destruída... Mas há coisas que não vêm relatadas: diz o relator que "junto à base de patrulhas pelas 14H20, um grupo IN que seguia em coluna por um, detectou as NT abrindo fogo e tendo ferido um Soldado, pondo-se em fuga pela reacção das NT. Pelas 14H45 saiu um grupo de combate em patrulhamento ao longo do R Canjambari e regressou sem contacto".

Não foi assim. O que sucedeu foi o seguinte: o IN encostou-nos ao Rio Camjambari, não podendo nós cambá-lo, porque era muito fundo, nem podendo dali sair porque estávamos cercados. O comandante da peração disse-me:
-Ó Lopes, a minha companhia já está aqui instalada, por isso, você, que tem um grupo autónomo, vá ver se consegue furar o cerco. E lá fui, não só uma mas duas vezes, sem sucesso. Na segunda vez, fiquei sob fogo cruzado do PAIGC e da companhia do comandante, tendo um soldado meu levado um tiro nas costas, dado pelos dos nossos.

Quando o comandante me disse, pela terceira vez, para tentar furar o cerco, disse-lhe que não ia. Que chamasse os T6, o que ele acabou por fazer, e foi assim que dali saímos. Mas o que mais me impressionou nesta operação foi o seguinte: Samba Culo tinha uma escola; quando lá chegámos, vi escrito no quadro preto, em perfeito português: "Um vaso de flores". Tinha desenhado, a giz, por baixo, um vaso de flores.

E o que nunca mais esquecerei na minha vida: quando atacámos a base, uma jovem dos seus 18 anos ficou com a barriga aberta por uma rajada de G3. E mais (coisas terríveis desta guerra!): o Bigodes, o Armindo F. Paulino (que foi, depois, feito prisioneiro pelo PAIGC e que acabou por morrer em Conakri), quis saltar para cima dela. Tive que lhe bater. Esta é uma situação que nunca me sai do pensamento... e da minha consciência. Tinham muitos livros em português, que era o que estavam a ensinar aos alunos (miúdos ou graúdos?). Trouxemos também (imaginem!) uns paramentos completos de um padre católico! Lembranças que se me pegaram para toda a vida.

«6. Op Inquietar II. 4 a 7 de Julho de 1967"

"Situação particular:

Há notícias que o IN tem un acampamento em Canjambari, além de outros espalhados pela mata do Óio. Tem-se revelado durante operações realizadas e implantado engenhos explosivos nos itinerários.

"Missão:

Executar uma acção em força sobre o acampanento IN de Canjambari em coordenação com forças do AGRP 1976.

"Força executante:

Dest A - CCAÇ 1685; 1 Gr Comb CART 1690; 1 Secção CMIL 3

Desat B - CART 1689: 1PEL.(-) /CMIL 3

Dest C - 1 PEL EREC 1578.

"Desenrolara da acção:

04JUL67

Concentração das forças em Banjara pelas 17H00.

05JUL67

Pelas 00H00 iniciaram o movimento em direcção a Samba Culo (050.0p.) seguindo o itinerário Banjara-Gendo-Tambicó-Samba Culo. Pelas 07H00 atingiram Gendo. Um pouco à frente desta antiga tabanca, pelas 08H00 foi detectado um grupo IN o qual tentaram cercar e capturar, só não o conseguindo por alguns elementos da Milícia na testa da coluna, que não entenderam a manobra, terem aberto fogo, pondo-os em fuga.

Entretanto foram avistadas 2 casas de mato (010 OP), que foram destruídas bem como diversos utensílios domésticos. Retomado a progressão e cerca das 11HOO foi detectado um núcleo de 10 casas de mato (050 OP), incluindo uma escola com vinte carteiras, tendo sido totalmente destruídas pelo fogo. Retomado a progressão e ainda perto deste último acampamento, as NT emboscaram um grupo IN não estimado, do qual foi capturado um elemento portador de uma faca de mato.

Reiniciado a progressão, Tambicó (Base de patrulhas) foi atingida às 14H00. Junto a base de patrulhas pelas 14H20, um grupo IN que seguia em coluna por um, detectou as NT abrindo fogo e tendo ferido um Soldado, pondo-se em fuga pela reacção das NT.

Pelas 14H45 saiu um grupo de combate em patrulhamento ao longo do R Canjambari e regressou sem contacto. Pelas 15H20 um grupo IN estimado em 30 a 40 elementos atacou a base de patrulhas com mort 60, LGF, PM e Armas Automáticas, durante 15 minutos sem consequências.

Os T6 que nessa altura sobrevoavam a base de patrulhas para protegerem o heli na evacuação do ferido, fizeram umas rajadas sobre o grupo IN. Nessa altura foi evacuado em HELI para o HM 241 o soldado ferido na acção IN anterior.

Pelas 17H00 saiu um outro grupo de combate para fazer o reconhecimento do itinerário Tambico - Samba Culos. Percorridas apenas algumas dezenas de metros, foi emboscado por um grupo IN de cerca de 60 elementos armados de mort 60, LGF, PM e Armas Automáticas, tendo ferido 2 soldados, evacuados mais tarde para o HM 241, por heli.

Juntamente com a emboscada o IN flagelou a base de patrulhas com 2 granadas de mort 60. Perante a reacção das NT o IN furtou-se ao contacto com baixas prováveis.

06JUL67

Cerca das 11H20, orientado pelo PCV iniciou-se a progressão em direcção ao acampamento de Samba Culo (050.OP.), tendo atingido pelas 15H20. O IN, que estava instalado do lado Sul do acampamento e que tinha reagido fortemente impedindo o Dest B de entrar no acampamento, reagiu à manobra de envolvimento e assalto ao acampamento com Mort 60 e PM, tendo ferido dois soldados, evacuados posteriormente para o HM 241 por heli.

O IN, apercebendo-se do cerco que se preparava, furtou-se ao contacto tendo as NT assaltado e destruído o acampamento composto por 30 casas de mato, sendo algumas cobertas a zinco. Foram destruídos também alguns utensílios domésticos.

Já no regresso o guia conduziu as NT a uma arrecadação de material, que o Dest B conquistou tendo capturado todo o armamento lá existente. Capturado o material foi destruída a arrecadação ouvindo-se então fortes rebentamentos de cartuchos e granadas que se prolongaram por 50 minutos.

Retomado a progressão de regresso para Banjara as NT por alturas de Farim 8H8-44, accionaram uma armadilha tendo ficado ferido um elemento do Dest B.

07JUL67

As NT atingiram Banjara pelas 05H00 após o que regressaram a quartéis. A operação terminou às l6H530.

"Resultados obtidos:

-Foi capturado armamento IN;
-Foram mortos, feridos e feitos prisioneiros elementos IN;
-Foi destruído diverso material e utensílios donéstico;
-Foram destruídos cerca de 10.000 munições e diverso material explosivo algum do qual se supõe encontrar-se enterrado, dado a violência das detonações".

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