1. O A. Marques Lopes já fez circular pela nossa tertúlia estas imagens, de reduzida dimensão, sem legenda e que testemunham as ruínas de Có, em pleno chão manjaco:
"Eu e o Allen passámos por aqui, a caminho de Canchungo [Teixeira Pinto]. Para quem lá esteve se lembrar daquilo... como está".
De pé, fantasmagórico, resta, ao que parece, o monumento, em forma insólita mas original de coração, erigido pela CCAÇ 2584, que pertencia ao BCAÇ 2884 (Maio de 1969/Fevereiro de 1971) e que era a unidade de quadrícula de Có, nesta época.
Para mim, estas imagens são tristes e deprimentes: daqui a muitos anos, serão para os arqueólogos guineenses um dos poucos testemunhos de uma civilização, tecnologicamente superior, que passou pela região do Cacheu... Espero que reste, ao menos, aquilo que é imaterial e que é o mais importante nas relações entre os povos: uma língua, o português, que ajudou a construir a identidade nacional da Guiné-Bissau e a preparar o caminho para a independência e o futuro... E em português, nos entendemos hoje, neste blogue e noutros fóruns, falando das ruínas de Có, dos sinistros jagudis que pairam pela Guiné-Bissau de hoje, da ameaça de fome no sul do país, da guerra latente na frinteiura com Casamança, do futuro de esperança que desejamos para os dois povos, dos sentimentos de respeito e de amizade que nos ligam aos guineenses...
2. Comentando estas e outras imagens (sobre Fulacunda), escreveu o Afonso M.F. Sousa o seguinte:
"Estas fotos fresquinhas têm um valor enorme, sobretudo pelo comparativo que imediatamente nos suscita e fazemos com aquelas imagens reais de há cerca de 35 anos.
"Ainda há dias estive num almoço-convívio da CART 2412 e notei a sofreguidão com que todos queriam ver imagens de Barro e Bigene, de Abril de 2006, e compará-las com a memória de 1969/70.
"Parabéns a estes bravos, intrépidos e entusiastas repórteres fotográficos que estão a trazer estes sítios da Guiné de hoje, até ao nossos domicílios! Afonso Sousa".
3. Recorde-se quem esteve em Có, da malta da nossa tertúlia: o João Varanda, que vive hoje em Coimbra e que foi furriel miliciano da CCAÇ 2636 (1969/70). Esta era uma companhia açoreana, fez na primeira parte da sua comissão a segurança à construção da estrada Có- Pelundo - Teixeira Pinto.
Aqui ficam alguns excertos do seu testemunho sobre a passagem da sua unidade por Có (de 4 de Novembro de 1969 a 2 de Abril de 1970):
(i) Post de 19 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXXXIX: CCAÇ 2636 (Có, 1969/70) (5): Gastando o primeiro par de botas e as letras do alfabeto
(...) "A Companhia chegou a Có em 4 de Novembro de 1969, tendo no dia seguinte participado na protecção aos trabalhos em curso na estrada Có-Pelundo, ao lado da CCAÇ 2584, já com alguma experiência.
(...) "Assim foram passados quatro meses, onde por terra fomos a tudo quanto era sítio. Sem conta os kms. percorridos. Gastámos o primeiro par de botas, e no dia 2 Abril de 1970 partimos para nova aventura: o Sector Leste – Bafatá esperava por nós".
Guiné > CCAÇ 2636 > 1969 O João Varanda, lendo o jornal A Bola, na tenda de campanha, montada em Tel, entre Có e Pelundo, em pleno chão manjaco.
Foto: © João Varanda (2005)
(ii) Post de 26 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXV: CCAÇ 2636 (Có, 1969/71) (4): A acção psicossocial
(...) "Construímos ainda um espaçoso e seguro paiol subterrâneo para as centenas de granadas que jaziam praticamente a céu aberto, um sistema de filtragem de águas para beber e para banhos, uma oficina auto com fossa para lavagem e lubrificação de viaturas, com água corrente, para os nossos Unimog - para os grandes Furriel Marques e Teodoro Simões (Nanza) nos proporcionarem transporte seguro -, um heliporto para evacuação de feridos e doentes para a capital Bissau, um sugestivo e elegante monumento alusivo à nossa passagem pela aquela terra, evocando os nossos mortos brancos e africanos. O qual, mais de trinta anos depois, ainda se mantém incólume e erecto conforme me relatou o Capitão do PAIGC Eduardo Sanhá que veio, após o final de guerra colonial, cursar Direito na Universidade de Coimbra" (...).
(iii) Post de 26 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - CCCXIV: CCAÇ 2636 (Có, 1969/71) (3): O espírito de grupo
(...) "Có – e conforme vimos pelo teatro das operações antes da nossa chegada para tampão de zona - foi terra fustigada; no terreno, travava-se então lutas que pareciam eternas, mas a moral da CCAÇ 2636 era muito elevada, já que com os nossos comandos, na pessoa do jovem Capitão Miliciano Manuel Medina Mato e do 2º. Sargento Cruz, em pleno mato, às portas do combate do dia a dia, sentimos sempre o prodígio do apoio dos escalões superiores, traduzido em todas as valências, com oportunidade e eficácia" (...).
(iv) Post de 16 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCXCIII: CCAÇ 2636 (Có, 1969/71) (2): "Periquito vai no mato, que a velhice vai p'ra Bissau"...
(...) "Em Có fomos recebidos pela velhice daCCAÇ 2584, com grande algazarra e desejo de bom regresso. Chegados ao destacamento, o nosso pessoal começou, de imediato, o frenezim da descarga da coluna, e o desenrrascanço de como passar a primeira noite no aquartelamento de Có, já que este era pequeno e não tinha instalações suficientes para nos acolherem na sua totalidade, dado o ajuntamento da nossa companhia com a guarnição normal do aquartelamento da CCAÇ 2584. Mas na guerra há sempre lugar para mais um, e apesar dessa tensão toda a companhia ficou acomodada e tudo correu pelo seu melhor" (...).
4. Quem também por lá passou e de Có tem boas recordações foi o nosso amigo e camarada João Tunes, que originalmente perteceu à CCS do Batalhão, o mesmo a que pertencia a CCAÇ 2584, com sede no Pelundo:
(i) Vd. post de 16 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCXCII: Có ? Isto é comigo!
(...) "Eu li o magnífico texto do João Varanda, no ilustre blogue de que o Luís é Cmdt Chefe, depois li o nº da Companhia dele (2636), o número tocou-me uma campaínha, mais o período de comissão, fixei-me no local: Có.
"Depois lembrei-me as vezes que estive em Có, no mesmíssimo período, enquadrado no mesmo Batalhão (sediado em Pelundo). E como era, então, uma alegria dar um salto a Có, malta bacana, ok sobre rádios e cripto?, vamos aos copos, assegurando (eles) a segurança da construção de uma nova estrada asfaltada (que já não lembro se ia para Teixeira Pinto ou para Bula ou para a puta que pariu o Caco).
"Julgo até (outra falha ou confusão?) que a Companhia de Có era comandada por um Capitão Miliciano, já economista com canudo e antifascista, um gajo porreiraço, já com uns cabelos a puxar para o grisalho, com quem punha a escrita em dia, deitando abaixo a porra da guerra, o fascismo, o colonialismo, e, claro, o Caco, o Marcelo e o Tenente Coronel facho do Pelundo que não percebia nada da poda" (...).
(ii) Vd. post de 25 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXI: Pelundo: Nº do batalhão ? Não sei, não me lembro (João Tunes)
"Caro Luís: É como dizes, não me lembro mesmo [não, a bold, como faz questão de frisar o autor, em 2ª via]. BCAÇ 2864? BCAÇ 2854? Por aí..."Pois, o João Varanda nada disse, mas pensando nos dados que ele deu, a sua Companhia açoreana não pertenceu ao meu Batalhão, foi sim em reforço à Companhia do meu Batalhão e que ele chama de velhinhos. O que não invalida, pelas datas, que não tenha estado em Có ao mesmo tempo que ele (eu, de tempos a tempos, pela minha missão, ia até lá).
"Mas de Có, além de me lembrar bem do quartel, memorizei a estrada em construção (Có-Pelundo-Teixeira Pinto), com segurança especial, os copos (muitos copos bebi em Có, o que não admira, eu até bebi copos onde não havia copos, bebendo pelo gargalo) e o tal capitão miliciano, economista e antifascista, lá de Có (também não lembro o nome, mas estou a ver-lhe a cara) que era um compincha do caraças para cortar na casaca do Marcelo, do Caco e das putas que os pariram" (...).
Sem comentários:
Enviar um comentário