Pergunta o Paulo Dinis, o grande animador da Ergolist:
Então o Decreto-Lei n.º 266/2002 não abria já as portas para a constituição de uma agência nacional em substituição do IDICT ? O próprio acordo sobre condições de trabalho, higiene e segurança no trabalho e combate à sinistralidade, de 2001, também não sugeria, de certa forma, que fossem diferenciadas a área de supervisão das relações colectivas de trabalho e a área técnica da SH&ST ?
Resposta de O Blogador:
O Paulo é um homem atento, como convém, à produção, em grande série, do Diário da República (abreviadamente, DR). Confesso que não é o meu diário preferido: não tem, por exemplo, um livro de estilo como o Público. Além disso, parece um pasquim, daqueles onde se escreve mal e porcamente a língua da gente.
Embora mau leitor do DR e sobretudo distraído, quer-me parecer que o Decreto-Lei n.º 266/2002, de 26 de Novembro, se limita a estabelecer a orgânica da nova Direcção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho.
O novo inquilino da Praça de Londres fez o que todos os novos inquilinos do poder gostam de fazer: mudar a mobília, os sofás, e as cortinas; trocar as fechaduras; substituir a farda do porteiro; reformular o organograma... Em suma, a nova/velha Direcção-Geral, para além das competências anteriormente detidas pela Direcção-Geral do Emprego e Formação Profissional (DGEFP) e pela Direcção-Geral das Condições de Trabalho (DGCT), passou igualmente a deter competências na área das relações profissionais, anteriormente cometidas ao Instituto de Desenvolvimento e Inspecção das Condições de Trabalho (IDICT).
No preâmbulo daquele diploma legal não descortino nenhuma "porta aberta" à criação de uma eventual agência nacional de segurança e saúde no trabalho, embora dessa possibilidade se fale à boca cheia nos "mentideros" dos seminários congressos e demais encontros onde a gente se vai (des)encontrando, em honra e homenagem à Santa Segurança, Higiene & Saúde no Trabalho. O acordo de 2001, por sua vez, já previa a saída, do IDICT, dos famosos especialistas em gestão de conflitos sócio-laborais cuja história está por fazer.
Temos que recuar a 1991 e ao acordo específico sobre SH&ST, assinado pelo Governo e parceiros sociais com assento no então Conselho Permanente de Concertação Social, hoje integrado no Conselho Económico e Social.
Para os mais novos e os menos atentos, é útil recordar que um dos pontos do acordo era justamente a criação de um Instituto Nacional de Saúde e Segurança no Trabalho, de gestão tripartida (Governo e parceiros sociais).
Convenhamos que a ideia em si era boa: pretendia-se prevenir o risco anunciado de governamentalização do Instituto. Com a criação do IDICT, em 1993, a letra e a forma do acordo foram inegavelmente traídos. O IDICT passou a deter três áreas de competências: (i) inspecção do trabalho; (ii) investigação & desenvolvimento na área das condições de trabalho; e (iii) gestão das relações colectivas de trabalho...
Os vários presidentes do IDICT que eu fui conhecendo pessoalmente a partir de então sempre se mostraram hostis à ideia da saída da Inspecção Geral do Trabalho (abreviadamente, IGT). Para eles, o IDICT sem o "abraço armado" (sic) da IGT nunca teria força nem credibilidade dentro e fora das empresas... Mas mudam-se os tempos, mudam-se as vontades.