1. No Sector L1, na Zona Leste da Guiné, ao tempo da 1ª comissão da CCAÇ 12 (Maio de 1969/Março de 1971), o armamento utilizado pela guerrilha do PAIGC (o IN, para abreviar) era equivalente ou até superior ao nosso.
Esse armamento era praticamente todo de origem soviética, produzido na ex-URSS ou noutros países do bloco soviético. Mas também de origem chinesa. De facto, recordo-me de termos também apreendido material de fabrico chinês (por exemplo, granadas de RPG).
Na época, e pelo menos na Zona Leste, o IN não dispunha, naturalmente, de meios aéreos ou navais nem de artilharia pesada. Não me consta, por exemplo, que tivesse antiaéreas, apenas referenciadas no meu tempo nas zonas fronteiriças, no norte e no sul (Parece que a metralhadora mais usada pelo PAIGC, tal como pela FRELIMO, era a ZPU-4, uma arma de quatro canos, de calibre 14.5, de fabrico soviético, instalada em reboque).
De uma maneira geral, um bigrupo (40 a 50 guerrilheiros) estava equipado com o seguinte armamento ligeiro:
(i) pistolas-metralhadoras PPSH, de calibre 7.62, de origem russa(as famosas e enervantes “costureirinhas"): não tinha equivalente nas NT, já que no mato não usávamos a pistola-metralhadora fabricada na FBP; a PPSH (ou Shpagin) tinha uma cadência de tiro 700/900 por minuto, e usava dois tiposd e carregadores: um circular (tambor) e outro curvo;
(ii) espingardas automáticas Kalashnikov, dotadas de carregadores curvos de 30 munições de 7.62 (com uma cadência de tiro, portanto, superior à nossa G-3, que dispunha de carregadores de 20 munições, de 7.62); era considerada uma arma de elite, pelo que nem todos os combatentes do PAIG a podiam usar;
(iii) espingarda semiautomática Simonov, também de origem russa e do mesmo calibre, dotada de uma baioneta extensível (era vulgar encontrar-se nos acampamentos do IN, sendo possivelmenet mais utilizada por elementos da população em autodefesa, nas áeras controladas pela guerrilha);
(iv) metralhadoras ligeiras Degtyarev, também de calibre 7.62, com tambor (não sei se eram melhores ou piores que a nossa HK-21, de fita, que encravava com alguma facilidade, nas difíceis condições do mato, debaixo de fogo, com o calor, com a chuva, com o pó...);
(v) 2 morteiros de 60;
(v) vários RPG-2 ou RPG-7 (Os RPG são lança-granadas-foguetes antipessoal).
A kalash, a famosa AK-47, desenhada pelo russo Mikhail Timofeevich Kalashnikov (nascido em 1919) equipava na altura todos os exércitos de guerrilha do mundo, além dos exércitos do Pacto de Varsóvia. Até meados dos anos 90 calcula-se que se tenham fabricado mais de 70 milhões de kalash, de acordo com o modelo oficial ou em versões pirateadas.
Esta arma continua no imaginário de todos os ex-combatentes da Guiné. Recordo-me de em Bambadinca, no regresso da operação de invasão a Conakry, alguns tipos da 1ª Companhia de Comandos Africanos andarem a oferecer-nos kalash, que faziam parte parte dos seus roncos, pelo preço de três ou quatro garrafas de uísque velho ou dez de uísque novo (500 escudos).
2. Segundo informações de um prisioneiro feito pelas NT, na região do Xime, de nome Malan Mané, de etnia balanta, em Julho de 1969 o grupo especial de roqueteiros da zona do Poidon que se deslocavam todas as manhãs para Ponta Varela a fim de atacar as embarcações em circulação no Rio Geba e/ou defender a entrada do Rio Corubal, dispunham seis lança-granadas RPG-2.
O RPG (em inglês, rocket-propelled grenade launcher), e sobretudo o RPG-7, era a arma mais temida pelos nossos soldados não só nas emboscadas, nas estradas e picadas, como sobretudo no mato, nas emboscadas em L.
O RPG-2 era uma arma anticarro, de fabrico soviético. O carregamento da granada, de formato cónico, era feito pela boca. O caklibre do tubo, era de 40 mm. E o da granada, 82 mm. O seu alcance, contra pessoal, não ia além dos 150 metros. O RPG-7 era já mais sofisticado do ponto de vista tecnol+ogico: o seu sistema de autodestruição da granada permitaia que fosse disparada para o ar, tal como o nosso dilagrama, provocando uma chuva de terríveis estilhaços.
As mortíferas lâminas de aço dos rockets foram responsáveis pela maior parte das 15 baixas (6 mortos e 9 nove feridos) sofridas pelas NT no decurso da Operação Abencerragem Candente, em 26 de Novembro de 1970, que sofremos a caminho da Ponta do Inglês.
Tanto o RPG-2 como o RPG-7 também eram muito eficazes contra as nossas viaturas, embora não praticamente não utilizassemos viatuars blindas na Guuiné (No Sector L1, havia apenas um PEL REC, praticamente inoperacional...). Contra alvos fixos o RPG era eficaz até 100 metros (O RPG-7 tinha mais alcance: 500 metros).
Muito certeiro e de fácil manejo, o RPG era muito mais adequado àquele tipo de terreno (floresta tropical e savana arbustiva, de capim alto e denso) e de guerra (de guerrilha) do que o nosso lança-granadas, a pesada bazuca americana de 8.9, uma clássica arma anti-tanque... O mais caricato é que as NT só dispunham de munições anti-carro (!). Devido ao seu peso, o transporte das granadas de bazuca, sobretudo em operações no mato, eram um problema, pelo que era frequente recorrer-se a carregadores nativos. Só mais tarde passámos a usar o lança-granadas dos paraquedistas, de calibre 3.7.
Em cada um dos grupos de combate da CCAÇ 12 havia pelo menos um ou dois apontadores de dilagrama (dispositivo de lançamento de granadas de mão). Mas esta arma não gozava das nossas simpatias, por ser perigosa e pouco eficiente: a primeira morte a que assisti, a meu lado, a do Ieró Jaló, do 1º Grupo de Combate foi causada por um dilagrama (Região do Xime, Op Pato Rufia, 8 de Setembro de 1969).
A granada era uma granada de mão defensiva, m/963, sendo montada em suporte com um encaixe oco que se adaptava no cano da espingarda automática G-3. No seu lançamento usava-se um cartucho de salva (sem bala). Para o disparo tirava-se o carregador e introduzia-se manualmente o cartucho de salva. Este compasso de espera, aliado à impossibilidade temporária do uso da G-3 e ao risco do seu manuseamento,
tornaram o dilagrama uma arma muito impopular entre as NT .
Nos ataques e flagelações às nossas posições fixas (aquartelamentos do exército, destacamentos de milícia, tabancas em autodefesa), os guerrilheiros utilizavam frequentemente o não menos temível canhão sem recuo (75, de origem chinesa, e 82, de origem soviética). Por razões logísticas e de transporte, era armas sobretudo utilizadas em ataques planeados. Tal como o morteiro 82, com um alcance de 3 km. EStas armas pesadas equipavam os grupos de artilharia, referenciados em Mangai, junto ao Rio Corubal, e Madina/Belel, no regulado do Cuor, a norte do Geba. (Vd. mapa do Sector L1).
Os grupos especiais do IN, quer de artilharia (canhão sem recuo e morteiro 82) quer de RPG, eram extremamente móveis. Em contrapartida, as NT praticamente não usavam o canhão sem recuo.
Por vezes O IN utilizava também a metralhadora pesada Goryunov, de calibre 7.62, que também podia ser usada como antiaérea. E sobretudo a Degtyarev, de origem russa, mas de calibre 12.7, equivalente à nossa Breda ou à nossa Browning(que estava instalada nalguns aquartelamentos: em Bambadinca, por exemplo, varria a pista de aviação). Pelo menos num dos ataques uma tabanca em autodefesa, Afiá, Candamã opu Camará (já não me lemrbo qual),no regulado de Badora, foram encontrados invólucros de 12.7, portanto da Degtyarev.
Ainda no nosso tempo apareceram, na Guiné, os primeiros foguetões Katiousha, de 122 mm, inicialmente pouco certeiros, é certo, mas com grande poder de destruição e não menos impacto psicológico junto das NT e populações. De fácil manejo e de relativamente fácil transporte, seriam utilizados preferencialmente contra os grandes alvos militares (aeroporto de Bissalanca…) e concentrações urbanas (Bolama, Bissau...).As granadas, com um peso de 18 kg. (dos quais 6.5 de explosivo), tinha um raio de morte de 160 m2, e ao explodir produzir cerca de 15 mil estilhaços.
Só mais tarde, já em 1973, apareceriam os mísseis terra-ar que os egípcios também utilizaram contra os tanques israelitas na guerra do Kippour. Com eles seria posta em cheque a nossa até então incontestada supremacia aérea.
Recorde-se que a utilização dos mísseis terra-ar Strella (SA-7 Grail-Strella) pelo IN, pela primeira vez em 25 de Março de 1973, foi responsável pela queda de um Fiat G-91 (pilotado pelo tenente Pessoa). Esta arma antiaéra embora bastante efeicaz contr as nossas aeronaves (helicópteros, avionetas, bombadeiros T-6, caças Fiat G-91, subsónicos). Este míssil era dotado de um acabeça com detector de infracvermelhos,s endo por isso atraído pela fonte de calor emitida pelos motrortes das aerobnaves. A sua velocidade era impressionante (mach 1,5 ou 1600 km/hora). O seu alcance era contudo limitado: pouco mais de 3 km. Os nossos helicópteros e restantes aeronaves, para não serem atingidos, tinham que passar a rasar a copa das árvores ou voar acima dos 1500 metros de altitude.
O Centro de Documentação 25 de Abril, Universidade de Coimbra, tem uma boa página em que se compara os armamentos das duas partes em conflito. Sobre a artilharia onde, aparentemente, as NT levavam vantagem, o documento diz que "na Guiné, a situação em 1966 era a utilização dos obuses 8,8 cm por pequenas unidades (nove pelotões a duas bocas de fogo cada), mas a partir de 1968 passaram a existir meios mais modernos e mais potentes", a saber: (i) 19 obuses de 10.5 cm, correspondendo a três baterias; (ii) seis obuses de 14 cm, correspondendo a uma bateria; (iii) seis peças de 11.4 cm, correspondendo a uma bateria. "Estes últimos materiais, dado o seu alcance, já permitiam o apoio a vários aquartelamentos a partir de uma posição central, mas a falta de meios de aquisição de objectivos impedia uma contrabateria eficaz. As dificuldades apontadas para os morteiros eram semelhantes às da artilharia, se bem que na Guiné, dada a sua menor extensão e a quadrícula mais apertada das unidades, os problemas fossem menores", pode-se ler-se ainda no documento em referência.
De qualquer modo, da comparação do IN e das NT, tira-se a conclusão da "equivalência" do armamento entre as partes em conflito: "se exceptuarmos a artilharia (com as limitações já apontadas) e as viaturas blindadas (de emprego também limitado), pode dizer-se que o combate terrestre se travou, salvaguardando os efectivos, 'entre iguais' "...
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