1. Recebi na sexta-feira passada, dia 6 de Maio, uma mensagem que me comoveu e que, ao mesmo tempo, me deixou orgulhoso enquanto tuga. Passo a transcrevê-la:
"Dr. Luís Graça
"Descupe-me roubar o seu precioso tempo, mas tomei a liberdade de lhe enviar este e-mail, porque estive a ler o seu blogue e vi que você cumpriu o serviço militar na minha terra, Xime, e logo nas companhias que marcaram a minha infância, CART 2715 e CART 3494. Isso porque há alguém que me ficou na memória para sempre por ter sido meu professor na única escola que lá havia, a PEM (Posto Escolar Militar) nº 14, e de nos ter feito crianças felizes. Essa pessoa é de Viana de Castelo, era furriel [miliciano]enfermeiro, de nome José Luís Carcalhinho da Ponte.
Gostava de falar mais consigo, caso tenha tempo e disponibilidade para me aturar.
Os meus cumprimentos, José Carlos Mussá Biai."
2. Eis a minha resposta, com data de hoje:
"José Carlos: Só hoje de manhã li a sua mensagem. Deixe-me confessar-lhe que me comoveu mas ao mesmo tempo também me deixou uma pontinha de orgulho. Você não é dos guinéus que diabolizam os tugas (o termo depreciativo que, como deve estar lembrado, era utilizado pelos guineenses, em geral, para se referirem aos portugueses que ocupavam a vossa terra). Penso que esse tempo, em que as coisas eram vistas a branco e preto, já passou. O tempo dos ressentimentos já passou. A histórias e as estórias são sempre muito mais compridas e complicadas do que o tempo que a gente tem para as escrever e contar… Além disso, o meu país e o meu povo estão reconciliados um com o outro, e também com a Guiné e com os guineenses, os quais de resto continuam a ter um lugar especial no nosso coração de tugas.
"Dito isto, eu fico muito orgulhoso por saber que você era um menino do Xime, no meu tempo de furriel miliciano da CCAÇ 12 (Maio de 1969-Março de 1971), e que foi um outro furriel miliciano, enfermeiro, José Luís Carcalhinho da Ponte, tuga, minhoto de Viana do Castelo, que o ajudou a aprender a língua de Camões, e que fez de si uma criança feliz. De si e de outras crianças do Xime. A sua mensagem revela uma grande sensibilidade humana, além da gratidão por um homem que, nas horas vagas da guerra, ensinava os meninos da Guiné.
"Claro que eu terei tempo e muito gosto em falar consigo, e daí deixar-lhe os meus contactos. O mais simples é indicar-me o seu número de telefone. Procurei contactá-lo rapidamente. E, se mo permitir, vou pôr o seu nome e o seu endereço de e-mail na minha lista de contactos de pessoas que, por uma razão ou outra, estão ligadas ao triângulo Xime-Bambadinca-Xitole no tempo da guerra colonial. Veja a minha página sobre os Subsídios para a História da Gerra Clonial> Guiné.
"Devo esclarecê-lo que eu não pertenci à CART 2715 nem à CART 3494. Sou mais velho do que os elementos destas companhias. Mas metade da minha comissão passei-o em contacto frequente com a CART 2715 que estava sedeada no Xime. Os camaradas da CART 3494 (que chegou ao Xime por volta de Janeiro de 1972) já não os conheci, mas eles continuaram a trabalhar com a CCAÇ 12 (que era formada por praças africanas, oriundas do chão fula, e em especial dos regulados de Xime, Corubal, Badora e Cossé; todos eles eram fulas ou futafulas, à excepção de um mancanhe, que era natural de Bissau; havia ainda dois mandingas).
"Vou pô-lo em contacto com duas pessoas desse tempo:
(i) o Sousa de Castro (o ex-1º cabo radiotelegrafista Castro, que pertencia à CART 3494, e que curiosamente também é natural de Viana do Castelo, ou vive e trabalha lá);
(ii) o David J. Guimarães, ex-furriel miliciano da CART 2716, aquartelada no Xitole, e do mesmo batalhão da CART 2715, o BART 2917). O seu professor primário, José Luís Carcalhinho da Ponte, deve ter pertencido à CART 2715 ou à CART 3494 (que, por sua vez, estava integrada no BART 3873).
"Presumo que o José Carlos queira encontrar, contactar ou obter o contacto do seu mestre de escola. Talvez estes dois nossos amigos o possam ajudar. Eu, pessoalmente, não conheço nem me lembro desse furriel miliciano enfermeiro. Um ciber-abraço. LG."
3. Fiquei hoje a saber, pelo endereço de e-mail e por uma pesquisa rápida na Net, que o José Carlos Mussa Biai trabalha no Intituto Geográfico Português e é co-autor de um ou mais trabalhos de investigação na área de engenharia florestal onde se formou, relacionados com o seu país de origem.
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