15 novembro 2003

Estórias com mural ao fundo - XVII: Quando os Chefes são mais (imbecis) que os Í­ndios

Como era habitual todos os anos, com a aproximação da estação do inverno, os pobres índios da reserva foram consultar o Chefe Cara de Pau:

- Ó Chefe, como vai ser este inverno ? Quais são as ordens ?



O Chefe Cara de Pau que tinha estudado numa escola de brancos já não sabia nada da arte ancestral de adivinhação do tempo. Mas, claro, como chefe não podia mostrar parte de fraco. Fixou os olhos no céu, entoou uma estranha canção irlandesa que tinha aprendido na igreja e estendeu um braço para recolher a resposta. Esta veio rápida e brusca como um trovão, sob a forma de uma voz de ventríloquo:

- Meu povo, vamos ter um inverno muito duro, muito duro... É bom começar a colher lenha! Muita lenha!



Surpreendido pelo resultado mas ainda pouco convicto dos seus novos dotes de adivinho, o Cara de Pau consultou no dia seguinte, pelo telefone, o Serviço Nacional de Meteorologia (SNM). As previsões dos brancos confirmavam as suas:

- Sim, o inverno deste ano vai ser muito frio!



Sentindo-se mais confortável no seu novo papel de meteorologista da reserva, o Chefe reuniu de novo os índios e insistiu:

- Inverno, muito frio, muito frio! Guerreiros, velhos, mulheres, crianças, tudo o mundo, toca a recolher lenha! Muita lenha!



Dois dias depois, ligou novamente para o SNM e ouviu a segunda confirmação:

- Sim, sim, muito frio, muito frio! Como há muito anos não acontecia.



Nova reunião com o povo, e novo aviso:

- Inverno, muito frio, muito frio! O pior do século. Recolham toda a lenha que puderem.



Uma semana depois voltou a ligar ao SNM, para uma última confirmação:

- Vocês podem confirmar a previsão sobre o próximo inverno ?

- O SNM confirma que o próximo inverno vai ser de frio intenso...

- Como podem ter tanta certeza disso ?

- É que esta ano, na reserva dos índios, houve uma inusitada corrida à lenha. Como há muito não se via!... E como diz o provérbio índio, "não há fumo sem fogo"!...



Moral da história:

Quando os chefes são mais (imbecis) do que os índios, coitados dos índios!

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