Guiné-Bissau > Saltinho > 2005 > Viúva de Chambel, régulo de Cantabane. Na pessoa desta mulher guineense, fica aqui uma singela homenagem da nossa tertúlia a todas as mulheres, mães, namoradas, esposas, amantes ou companheiras de todos os combatentes da guerra colonial ou da guerra de libertação (como queiram), de 1963 a 1974... (LG)
© José Teixeira (2006)
Texto da Zélia Neno:
Uma vez mais aqui estou, tentando não fugir ao tema generalista do blogue, vou falar de pessoas que também viveram o drama da Guerra Colonial mas tão pouco têm sido focadas em qualquer texto ou livro ao longo do tempo, e porque se está a aproximar o dia 8 de Março que, não sendo o da Mãe, é O DIA DA MULHER.
Porquê? Porque as mulheres que viveram esse período da Guerra Colonial não devem ser esquecidas. Algumas, militares, normalmente enfermeiras paraquedistas, que à época tiveram de ultrapassar certos tabus para seguir essa carreira de resignação (à família e ao meio que lhes era querido), de coragem e amor ao próximo, contribuindo para que muitos feridos sentissem seu sofrimento amenizado ou até conseguissem sobreviver, as quais bem merecem ser lembradas e reconhecidas.
As outras quem eram? - Simplesmente MULHERES. Algumas já esposas, que sofreram nessa qualidada, mas a minha singela e mais profunda homenagem é para todas aquelas Mães que deste lado do Oceano ficavam a orar a Deus e Nossa Senhora para que os filhos regressassem sãos e salvos, o que infelizmente nem sempre aconteceu, e mães houve que por lá tiveram mais do que um filho em simultâneo.
Hoje, como mãe, atrevo-me a perguntar: quem terá sofrido mais? Os filhos lutando naquela guerra, ou suas mães que, a tão longa distância, nada sabiam deles durante semanas e semanas, casos houve de meses e anos (caso dos aprisionados), alimentadas pela Esperança que as fazia aguardar ansiosamente notícias suas ou contando cada dia que ainda faltava para abraçar os seus queridos meninos?
Quantas noites elas não conseguiram dormir ? Quantas lágrimas, algumas de sangue, lhes marcaram os rostos? Será que “as mães desta guerra” também não sofreram ou sofrem (as que ainda vivem) de stress pós-traumático ou de qualquer outra doença mental, provocada por essa situação? Sofrimento num coração de mãe deixa marcas irreparáveis!
Ao percorrer algumas daquelas picadas, onde ainda se vê marcas das minas anticarro que ali deflagraram, decerto causando muito sofrimento, não consegui evitar que as lágrimas me corressem pela cara, nem sequer imaginar qual inferno eu teria vivido se tivesse sido uma dessas mães. Elas tinham “fibra”, eu não (ou penso que não).
Mãe é Mãe, foi e é no seu ventre que se forma (claro, com a ajuda de um pai) e se desenvolve aquele pequenino ser, que desde logo se torna tão importante em nossa vida mais até do que o ar que necessitamos para viver e que, quando crescidos e chegada a ocasião que pensamos ser a oportuna, embora a evolução do tempo nos induza às vezes a errar, temos que fazer como a águia, quando ainda no ninho seus filhotes já estão crescidos e aptos para voar, no mais supremo acto de amor, lhes dá o derradeiro empurrão para que descubram suas asas e aprendam a fazer uso delas, sempre sob a sua protecção, vivendo assim o privilégio de terem nascido.
Esta oportunidade nem sequer foi dada às mães dos ex-combatentes, pois foram obrigadas a vê-los partir, tão jovens ainda, com regresso incerto, ficando sem poder dar um carinho, uma palavra de conforto ou sua protecção quando eles mais precisavam, nem tão pouco saber da sua vivência diária, o que acontecia só quando algum aerograma chegava e casos houve em que nessa ocasião quem o escrevera já não se encontrava no mundo dos vivos.
Não posso nem devo esquecer todas as outras mulheres de raça negra, espalhadas pelas ex-colónias, pois também elas sofreram, como mães de combatentes, quer seus filhos se enquadrassem, como milícias, nas nossas fileiras quer nas do inimigo.
Como viviam em pleno cenário de guerra, mesmo sendo população civil, sofreram as dores físicas de ferimentos e amputações, viram suas crianças chorar e gemer pelo medo ou pela dor e até morrerem em seus braços sem nada poderem fazer para as salvar, pois em situações de ataques, o que viam elas em seu redor? Sofrimento e Destruição!
Estas são as MULHERES E MÃES-CORAGEM do meu país de então, Continental e Ultramarino, e é para elas esta minha homenagem escrita, póstuma para muitas delas mas não em vão.
Zélia Neno
N.B.- Perdoem-me se com estas palavras feri a sensibilidade de alguém, cuja mãe somente esteja viva em seu coração.
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