Texto de Afonso M. F. Sousa , ex-furriel miliciano de transmissões da CART 2412 (Bigene, Binta, Guidage e Barro, 1968/70)
1. A nossa Companhia chegou a Bigene, vinda de Bisssau, em 31 de Agosto de 1968, para fazer o treino operacional (com a CART 1745, e integrada no COP3, cujo comandante era o major de cavalaria Correia de Campos).
Nos primeiros contactos com o IN apanhámos uma emboscada num trilho à saída de uma bolanha. Aí faleceu (com tiro de bazooka) o nosso 1º cabo enfermeiro João Batista da Silva (talvez reconhecido pelo IN pela sua saca de medicamentios, a tiracolo) (1).
Na reacção as NT conseguiram (também como descreve o coronel A. Marques Lopes) neutralizar um guerrilheiro (talvez o que terá abatido o nosso militar) que estava empoleirado numa árvore. Levou uma rajada no baixo ventre e ficou com os testículos praticamente desfeitos. Foi trazido para o aquartelamento. Estava vivo, mas não sei se, posteriormente, veio a safar-se. Pelo seu estado, julgo que não.
Até chego a pensar se desta tão grande coincidência, entre o meu relato e o do coronel, na neutralização deste turra, não estamos a falar do mesmo. Era sinal de que a CCAÇ 3 estava, na ocasião, em Bigene, juntamente com a minha companhia.
Mas talvez não, porque na altura o Correia de Campos era major e o António Marques Lopes reporta-se a ele como sendo tenente-coronel, o que indicia ter este caso ocorrido posteriormente.
2. Esta Zona (Barro - Bigene - Binta - Guidage - Farim) correspondia como que a uma zona-tampão, visando neutralizar os corredores de Tanaf e Samine (Senegal), de grande importância nos abastecimentos do PAIGC e na estratégia de conquista territorial a partir do Senegal.
Repare-se que estes corredores estabeleciam a ligação Senegal-Morés (Óio) (2). Por isso esta zona era vital tanto para as nossas pretensões como para as do PAIGC. O futuro haveria de demonstar isso (leia-se o que ocorreu em Guidage em Maio de 1973).
Por exemplo, o percurso Binta-Guidage era frequentemente emboscado por grupos itinerantes apeados ao longo do trajecto (sobretudo no baixo do Cufeu, alagado por cursos de água superficiais). O objectivo era isolar a tabanca de Guidage que ficava mesmo em cima da fronteira com o Senegal.
Toda esta zona era assim, percorrida frequentemente por estes barrotes queimados do e para o Senegal. Este país quase funcionava como rectaguarda do PAIGC (embora algumas vezes negasse esse apoio, por estratégia concertada com eles).
Foi por isso que, a partir de Barro, bombardeámos o Senegal com potentes obuses. Resultado: este país apresentou queixa na ONU contra Portugal por violação do seu território. Vocês devem-se lembrar disso (1969), pois, na altura, foi noticiado na rádio.
Depois, nos dias seguintes recebemos, dos habituais informadores (nativos) as mais interessantes informações sobre os resultados destes bombardeamentos.
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(1) Quando mais tarde (trocando com a CCAÇ 3), viemos de Guidage para Barro (onde cumprimos a parte final da nossa missão), aqui erigimos um memorial a este nosso companheiro, morto em Bigene, logo no início da nossa missão.
Hei-de perguntar ao coronel A. Marques Lopes se em 1998, quando voltou a visitar Barro, ainda viu por lá esse memorial (em betão), mesmo em frente ao então depósito de géneros. Penso que não. Pelo menos não o vislumbro naquela fotografia que, gentilmente, me enviou o ano-passado - a Este do edífício do comando, secretaria e centro cripto, logo a seguir àquela enorme mangueira, à face do caminho Barro-Bigene.
(2) Morés: Grande base de comando do PAIGC, para a zona Centro-Norte.
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