14 novembro 2005

Guiné 63/74 - CCLXXXIX: Op Lança Afiada (IV): O soldado Spínola na margem direita do Rio Corubal

Publica-se a quarta e última do extenso relatório da Op Lança Afiada, que decorreu entre 8 e 18 de Março de 1969, na região compreendida entre a linha Xime-Xitole e a margem direita do Rio Corubal, até então considerada como um "santuário do IN".

A operação, comandada pelo coronel Hélio Felgas (o patrão do Agrupamento 2947, mais tarde comando operacional de Bafatá, COP 7, se não me engano), coadjuvado por dois tenentes-coronéis, Jaime Banazol (liderando o Agrupamento Táctico Sul, com mais de 500 homens que partiram do Xitole e de Mansambo) e Manuel Pinto Bastos (comandante do BCAÇ 2852, Bambadinca, 1968/70), que encabeçava o Agrupamento Tático Norte (com cerca de 750 homens, que partiram do Xime). Ao todo 1300, entre soldados metropolitanos, milícias e carregadores...

Foi uma das últimas grandes "operações de limpeza", realizadas no primeiro ano de Spínola, enquanto Governador Geral e Comandante-Chefe (que fez questão de estar presente, junto das NT, no Dia D + 9, ou seja, 17 de Março de 1969, partilhando inclusive o transporte naval que levou os nossos esgotadíssimos camaradas da Ponta Luís Dias à Ponta do Inglês, no regresso ao Xime.

Apesar dos elevados meios humanos e materiais envolvidos, a correlação de forças não se modificou e, depois de um rápido processo e reorganização, a guerrilha voltava a obrigar as NT a acantonarem-se nos seus aquartelamentos onde flutuava a bandeira verde-rubra (Bambadinca, Xime, Mansambo e Xitole) e destacamentos dispersos. A população civil, sob a administração do PAIGC, foi a grande vítima desta megalómana e descoordenada operação.

Os soldados portugueses serviram, por sua vez, de cobaia num teste de resistência, a que o autor do relatório, sem despudor, chama processo de "selecção natural" (sic)... Num total de 700 e tal homens metropolitanos (o resto eram milícias e carregadores, habituados às duras condições do terreno), conclui-se que um sétimo fora mal seleccionado para o TO da Guiné, já que no decorrer da operação teve de ser evacuado, de helicóptero, por "insolação, ataque de abelhas e doença" (sic).

É o próprio relatório a reconhecer que, nesta época (tempo seco), as temperaturas andarvam entre os 39 e os 44 graus, à sombra, e entre os 55 e os 70º ao sol, e que nesas condições, (i) a guerra tinha que parar das 10 da manhã às 16h da tarde, precisando um soldado metropolitano de 8 a 10 litros de água (!)...

Nesta operação em que os guerrilheiros e a população por eles controlada passaram simplesmente para o outro lado do Rio Corubal (com os cães, os porcos, as galinhas...) (não havia paras, comandos nem fuzos do outro lado...), o verdadeiro inimigo das NT foi, de facto, a desidratação, além dos problemas alimentares: o tipo de rações que deram aos nossos soldados ( a ração dita normal) era tão má que provocava uma sede horrível: ao segundo dia, já não se comia; ao terceiro, começava a haver problemas...

Tratou-se de uma operação onde se foi a lugares míticos, como a mata do Fiofioli, junto ao Corubal, mas ninguém encontrou médicos e enfermeiras cubanas... Hospitais de campanha, sim, mas já abandonados, uns meses antes. Destruiram-se muitas toneladas de arroz, mataram-se milhares de animais, queimou-se tudo o que era tabanca... Em contrapartida, houve 24 flagelações do IN, mas os guerrilheiros seguiram as regras da guerrilha: retirar quando o inimigo, ataca: atacar, quando o inimigo retira... O autor do relatório, irritado, queria que os tipos do PAIGC se apresentasse de peito feito às balas e dessem luta...

O mais caricato e divertido desta operação é que o pessoal deitou fora as rações de combate e desatou a comer leitão assado no espeto!

Este é um cínico relato da dura condição da guerra da Guiné, vista pelo lado dos tugas. Por outro lado, há crítricas veladas, do autor do relatório, ao Comandante-Chefe, ao Quartel General e à Força Aérea (que se teria comportado como umas verdadadeira prima dona...).

Há coisas, pouco abonatórias paras as NT, que se passaram neste operação e que eu deixo à atenção e consideração dos tertulianos e demais visitantes deste blogue. Cada um de vós que faça a sua leitura desapaixonada... Aqueles de nós, que foram operacionais, rever-se-ão mais facilmente no cenário que foi o da Op Lança Afiada... Sobre o desempenho dos actores, já não vale a pena assestar as bateria da crítica... Felizmente que a guerra acabou! War is over, baby! (1)

Seria interessante ouvir, entretanto, o depoimento de camaradas do BCAÇ 2852 que participaram na Op Lança Afiada. Infelizmente, ainda não temos ninguém dessa unidade, na nossa tertúlia.

Para uma correcta localização das povoações ao longo da margem direita do Rio Courbnal, consulte-se o mapa, dos Serviços Cartográficos do Exército, relativo ao Xime, disponibilizado, mais uma vez, pelo nosso amigo e camarada Humberto Reis, ex-furriel miliciano da CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71). O mapa do Xime deve ser complementado por outros comop Fulacunda, Xitole e Bambadinca, também disponíveis on line.

Deixem-me só lembrar que, dois meses depois desta operação, o PAIGC retribuiu a visita das NT e apareceu às portas de Bambadinca em força: mais de 100 homens, três canhões sem recuo, montes de LGFoguetes, morteiros... Esse ataque ficou célebre: os tipos de Bambadinca foram apanhados com as calças na mão, faziam quartos de sentinela sem armas; enfim, um regabofe... Claro que no dia seguinte o Caco Baldé deu porrada de bota a baixo, nos oficiais todos, do tenente-coronel (o célebre Pimbas) até ao capitão da CCS...

Um caso exemplar, divertido e hilariante, da guerra da Guiné... A sorte dos gajos de Bambadinca foi os canhões s/r terem-se enterrado no solo e a canhoada cair na bolanha... Quando nós, periquitos da CCAÇ 2590 (futura CCAÇ 12), lá passámos, uma semana depois, vindos de Bissau e do Xime a caminho da nossa estância de férias (Contuboel, um mês e meio de paraíso... seguido depois de18 meses de inferno...quando fomos justamente colocados no Sector L1), os nossos camaradas da CCS do BCAÇ 2852 ainda estavam sem pinga de sangue...

"Podíamos ter morrido todos", dizia-me 1º cabo cripto Agnelo Ferreira, da minha terra, Lourinhã... Fomos depois nós , para lá, com os nossos nharros, e em 18 meses nem um tirinho: que o respeitinho (mútuo) era muito bonito... Porrada, porrada, era só quando a gente se atrevia a meter o bedelho na terra deles, que já estava "libertada"... Eu faria o mesmo, na minha terra...

Na história do BCAÇ 2852, o ataque a Bambadinca é dado em três linhas, em estilo telegráfico:

"Em 28 [de Maio de 1969], às 00H25, um Gr In de mais de 100 elementos flagelou com 3 Can s/r, Mort 82, LGF, ML, MP e PM, durante cerca de 40 minutos, o aquartelamento de Bambadinca, causando 2 feridos ligeiros".

L.G.


Op Lança Afiada (8 a 19 de Março de 1969) (IV e última parte) (2)


Fonte:

Extractos de: Guiné 68-70. Bambadinca: Batalhão de Caçadores nº 2852. Documento policopiado. 30 de Abril de 1970. c. 200 pp. Cap. 64-71. Classificação: Reservado (Agradeço ao Humberto Reis ter-me facultado uma cópia deste valioso documento em formato.pdf).


Dia D + 8 (16 de Março de 1969)

Os Dest A, B e C actuaram entre Queroane e Mangai destruindo tudo à sua passagem. O que sobrara de Mangai ficou reduzido a cinzas. Foram ainda capturados 3 nativos e feitos 2 mortos confirmados.

Os Dest F, G e I voltaram a bater a mata do Fiofioli mas agora no sentido Leste-Oeste. Inicialmente, porém, deslocaram-se por indicação do guia à zona (C8-71) e aí do lado de lá da bolanha, e portanto já fora da mata do Fiofioli, encontraram espalhado pelo mato, além de novos documentos, importante e valioso material de guerra que deu para encher mais de dois helis.

Os Dest E e H bateram também no sentido Oeste-Leste e Sul da mata e foram acabar de destruir a tabanca de Fiofioli, capturando ainda muitas munições.

Nesse dia, às 10h30 houve nova reunião em Bambadinca com Sua Excia o Comandante-Chefe. Sua Excia informou que em virtude de ter de realizar uma operação noutro Sector, determinava a suspensão do apoio aéreo em 17 [de Março] e o embarque dos Dest A, B e C em Ponta Luís Dias nesse dia com destino ao Xime. Os outros Dest do Agrupamento Sul não seriam reabastecidos em 17. Que o seriam em 18 mas compreendeu-se mal pois, segundo Sua Excia, em 17 o esforço aéreo não poderia ser mantido e só seria deixado o heli de evacuações. No entanto, os Dest do Agrupamento somavam nessa altura mais de 750 homens que seria necessário reabastecer de água e alimentação (os Dest A, B e C somavam entre 450 e 500 homens).

Nessa reunião foram também alteradas as instruções acerca do arroz IN: devia passar a ser todo destruído. Na véspera, porém, de acordo com a ordem recebida, comunicara-se aos Dest que deviam recolher todo o arroz possível, prevendo-se até o seu transporte por meio de colunas de carregadores a serem novamente recrutados. Havia até sido distribuído mais algumas centenas de sacos de linhagem.

Em face desta nova ordem, os helis passaram no regresso do reabastecimento a trazer homens em vez de arroz, afim de aliviar o esforço de reabastecimento. Mas foi só em 16. Neste dia fizeram quase reabastecimento e meio, pois sabia-se que não seriam feitos reabastecimentos alguns em 17.

Foi recebida uma mensagem que dizia: “Confirmação ordens verbais Com-Chefe cessa 17MAR Op ‘Lança Afiada’ Agr Norte (.) Tropas Agr. Norte em Ponta Luís Dias 170600Mar69 (.) Comandante Agr Norte coordena Oper embarque atingido cerca 1000 (.) Com-Chefe desloca-se local partir 170900(.)”.

Dia D + 9 (17 de Março de 1969)

O PCV com o comandante do Agrupamento Táctico Norte sobrevoou os Dest A, B e C cerca das 07H00, verificando que estavam no local que a carta indica como sendo o “Porto” de Ponta Luís Dias. Não conseguiu entrar em contacto rádio com a FN [ Força Naval] , apesar desta força ter indicativo e frequência marcados no Anexo de Transmissões da OOP.

O PCV regressou depois a Bambadinca para se reabastecer. Cerca das 09H20 chegou a Bambadinca o heli de Sua Excia o Comandante-Chefe que deixara Sua Excia junto dos Dest A, B e C. Aparentemente o embarque não podia ser feito onde as NT se encontravam pois via-se uma grande língua de areia. O heli levantou para escolher um local onde a língua de areia fosse mais estreita, o que ocorreu cerca de 1,5 quilómetros a Norte.

Quando a maré subiu, verificou-se que a água cobria toda a língua de areia e que as LDM [lanças de desembarque médias ] e a BOR (1) podiam ter abicado no local onde as NT se encontravam inicialmente. O esforço que a estas foi exigido de caminhar quilómetro e meio pelo lodo podia ter sido poupado se a bordo do PCV tivesse ido um oficial de marinha.

Foi nessa altura que Sua Excia o Comandante-Chefe informou que, por uma questão de marés, as NT não seriam transportadas ao Xime como ficara combinado na véspera mas sim apenas a Ponta do Inglês. A CART 1743, no entanto, seguiria para Bissau. Os Dest A e B, desembarcados em Ponta do Inglês, seguiriam depois a pé para o Xime, o que aconteceu.

A avaria de uma das LDM obrigou a outra a ficar-lhe ao pé e levou a BOR a transportar 300, isto é, mais do que a sua lotação permite. Como o heli do COMCHEFE não chegou a tempo, Sua Excia tomou também lugar na BOR, com o Comandante da Operação e com o Delegado do QG [ Quartel General ] que viera coordenar o embarque.

Cerca do meio dia as LDM e a BOR abicaram a Ponta do Inglês. Sua Excia tomou o seu heli para Bissau e o Comandante da Operação tomou o das evacuações que entretanto mandar vir para fazer duas evacuações para Bambadinca.

Os Dest A e B chegaram ao Xime cerca das 15h30 depois de terem sofrido novo ataque de abelhas que, tal como em Ponta Luís Dias, de manhã , ocasionou desorganização e levou os carregadores a abandonarem material, recuperado mais tarde.

Ao compreender-se que apenas era deixado o heli de evacuações, deu-se ordem aos Dest E, F, G, H e I para se aproximarem dos respectivos aquartelamentos [ Mansambo e Xitole]. Não se podiam abandonar sem alimentação nem água garantidos. Aliás aqueles Dest haviam saído às 03H30 da tabanca do Fiofioli onde se haviam reunido e, uns por Cancodea Balanta e por outros por Cancodea Beafada, completaram a destruição de todos os meios de vida IN da região. Encontraram vacas que mataram, levando outras consigo. Em Cancodea Beafada capturaram 2 homens, 3 mulheres e 3 crianças.

Estes Dest passaram depois por Mina e por Gã Júlio, utilizando sempre trilhos diferentes dos de ida. Quando, ao fim da tarde, foram sobrevoados pelo PCV, encontravam-se próximos da foz do Rio Bissari, tendo já percorrido nesse dia uns 30 quilómetros. Foram-lhes recomendadas todas as cautelas e autorização para prosseguirem quando quisessem pois não se poderiam reabastecer.

Mal o PCV saiu da área, o IN flagelou o Dest com 2 morteiradas e rajadas, de longe, procedimento este que afinal utilizou durante toda a operação e que revelou impotência [no original, importância] e falta de agressividade.

Dia D + 10 (18 de Março de 1969)

Na [noite] de 17 para 18 os Dest H e I chegaram ao Xitole transportando consigo 4 vacas que em certos pontos tiveram quase que ser levadas ao colo para passarem troncos estendidos sobre os ribeiros. As outras capturadas tiveram que ser abatidas.

Por seu lado, os Dest E, F e G passaram pela margem esquerda do Rio Bissari, atingiram a estrada e chegaram a Mansambo cerca das 08H30. Durante a noite, enquanto pernoitavam, um dos nativos capturados tentou fugir, sendo abatido.


6. Resultados obtidos

a) Baixas infligidas ao IN

O IN sofreu 5 mortos confirmados (contando com o que tentou fugir na última noite) e cerca de 20 feridos.

b) Inimigos capturados

Foram capturados 17 nativos, na sua maioria mulheres.

c) Material e documentos capturados ao IN

1 Carabina “Mosin Nagant”, 7,62 m/m modelo 1944
1 Espingarda “Mauser”, 7,92 m/mm, K98K
Idem 7,9 modelo 904
1 Espingarda sdemi-automática “Simonov” (SKS), 7,62 m/m
2 Metralhadoras pesadas “Goryonov, 7,62 m/m
2 Pistolas metralhadoras “Shpagin”, 7,62 (PPSH)
1 Granada para LG P-27 “Pancerovka”
12 Granadas para LG RPG-7
85 Granadas para LG RPG-2
1 Granada de Mort 60
19 Granadas de Mort 82
1 Mina A/P de salto e fragmentação (Bailarina)
1 Mina A/P de fragmentação PPMI
1 Mina TMB
2 Petardos de trotil de 1,2 kg
24 Cargas suplementares para morteiro (caixas)
42 Espoletas de granada Mort 82
3 Bolsas para carregadores PPZSH
1 Bolsa para carregadores Degtyarev
Cerca de 10 mil cartuchos 7,62 e 7,9 (60% dos quais impróprios)
E ainda outro material diversos bem como livros, cartas, cadernos e objectos de uso pessoal.´

d) Baixas sofridas pelas NT

AS NT não tiveram mortos. Sofreram 22 feridos, quase todos ligeiros. Tiveram ainda cerca de 110 elementos evacuados por insolação, ataque de abelhas e doença

7. Serviços

a. Rações de combate

As R/C especiais agradaram de uma forma geral. As normais (nº 20, E) são absolutamente intragáveis e mais se tornam em operações tão prolongadas como esta.

b. Recursos locais

Só muito raramente foi encontrada água bebível. Alguns poços foram atulhados pelo IN ou estavam já secos. Outros continham água negra ou meia salgada que só os carregadores conseguiram beber. Quando, junto de Gã Júlio, por exemplo, os soldados metropolitanos quiseram seguir o exemplo dos carregadores tiveram que ser evacuados uns 16 com febre alta.

Centenas de galináceos e cabritos ou leitões foram capturados e comidos em tabancas abandonadas, compensando assim um reabastecimento alimentar que se revelou algo deficiente quer em qualidade quer em quantidade.

c.Pessoal do Serviço de Saúde

As forças levavam o seu pessoal orgânico.

O médico de Bambadinca foi para Mansambo. A CMF [?] dos Serviços de Saúde colocou um médico no Xitole (em permanência) e outro no Xime (só durante a operação). O médico de Bafatá foi a Bambadinca sempre que necessário.

d. Evacuações

Os feridos e os doentes foram evacuados por heli.

8. Apoio aéreo

a.Ligação Ar-Terra

Foi relativamente boa.

b.Resultados da acção aérea

Não houve propriamente acção aérea se por acção aérea se pretende significar: apoio aéreo pelo fogo. Só no dia 12 de Março, o helicanhão actuou na margem oposta do Rio Corubal contra a tabanca de Inchandanga Balanta. E em 14 de Março, a FA [ Força Aérea ] bombardeou a mata de Fiofioli, não tendo as NT notado no dia seguinte quaisquer vestígios deste bombardeamento.

Não se teve conhecimento de outras acções aéreas pelo fogo.

c.Apoio aéreo

Inicialmente o apoio aéreo, no que respeita a reabastecimentos, revelou-se deficiente. O facto de não ter sido cedido o heli ao Comandante da operação, dificultou a acção de comando e influiu nos rendimentos dos meios à disposição, pois previra-se que esse heli colaboraria com o das evacuações e com o dos reabastecimentos.

Além disso, a coordenação levou o seu tempo a rodar, o que é naturalíssimo pois não tem havido muitas operações como esta.

Em terceiro lugar, os meios aéreos não deram inicialmente o rendimento que se esperava, uns por avarias, outros por serem desviados para outras missões e outros por estarem na altura das inspecções e revisões.

A situação quanto ao apoio aéreo era a seguinte em 13 de Março de 1969, às 13H45 (MSG 735/I/BCAÇ 2852):

- 1 DO estava avariado havia 2 dias;
- O outro DO só começou a trabalhar às 10H00;
- O heli trabalhava pouco mais de 1 hora, seguindo para Bissau;
- O outro heli seguira às 08H00 directo de Bafatá para Bissau (parece que podia ter ido ficar a Bissau na véspera);
- O helicanhão saira para Bissau às 10H30, só regressando no dia seguinte às 11H00;
Os helis que haviam seguido para Bissau só foram substituídos cerca das 11H00 ; só depois desta hora, portanto, se regularizou o serviço de reabastecimentos e evacuações.

No dia 13 a actividade dos meios aéreos fornecidos para a operação foi a seguinte:

- A DO levantou de Bafatá para a área 9 [ Mina – Gã Júlio ]às 07H20 com o Comandante do Agrupamento Táctico Sul, o Major Negrão da FA e o Cap Lopes que ia assumir o comando do Dest G e ficou no Xitole; à tarde foi para Bissau;

- Os 2 helis levantarm às 07H30 com o comandante da operação para Bambadinca (serviço normal);

- O helicanhão, saúdo da zona de operações em 11 de Março, às 10H30, e regressado a 12, às 11H00, fez escolta ao heli de Sexa Comandante-Chefe; não prestou serviço à operação, que se tivesse conhecimento;

- A DO chegou de Bissau, foi a Piche buscar o Coronel Neves Cardoso para uma reunião em Bambadincas onde chegou às 11H00; à tarde voltoiu a levar a Piche o mesmo oficial.

Em 14 os helis chegaram a Bambadinca às 08H30 e só aqui é que se abasteceram (pelo menos um). Podiam tê-lo feito em Bafatá. No entanto, a situação melhorou por vários motivos. Primeiro, porque se acabou com os recomplementos. Segundo, porque a selecção natural fez baixar o número de evacuações. Terceiro, porque os meios aéreos ficaram mais tempo na zona da operação. Quarto, porque a coordenação ar-terra ganhou experiência e tornou-se por isso mais eficiente.

9. Ensinamentos colhidos

Dentro do espírito das NEP, este parágrafo “não é uma crítica mas uma análise objectiva que permite obter ensinamentos”..


a) Torna-se evidente que a Op Lança Afiada foi bem sucedida, tendo sido alcançados todos os objectivos e cumprida integralmente a Missão.

Não há dúvida porém que o IN podia ter sofrido muito mais baixas e que as NT podiam ter capturado muito mais população se simultaneamente tivessem sido montadas emboscadas nocturnas na outra margem do Rio Corubal, conforme pedido. Esta margem fica fora dos limites do Agrupamento Leste e, concordo, é difícil de alcançar a partir de Buba. Mas uma companhia de paraquedistas ou de comandos teria operado maravilhas nela e evitado que a maior parte do IN e da população da margem Norte fugisse para a margem Sul como se sabe que fugiu durante as noites.

b) O facto de o IN nunca ter tentado resistir pode levar-nos à conclusão de que ele não era tão forte como se julgava. No entanto, não se tirou desta Operação um tal ensinamento. O que ele se viu foi varrido por todos os lados. Ao descobrir o “furo” da margem oposta passou-se para ela. Mas se tivéssemos podido tapar esse furo, ele teria sido talvez obrigado a resistir e mostraria então uma força que agora não mostrou porque achou inconveniente fazê-lo.

As 24 flagelações sofridas e os documentos apreendidos mostram porém que não devemos subestimar precipitadamente o IN. Nem sobre-estimá-lo, é claro.

c) A inicial deficiência do apoio aéreo podia ter acarretado consequências graves se o IN tivesse reagido com maior agressividade.

Concordamos que o heli é uma arma cara (15 contos por hora). Mas é indispensável neste tipo de guerra.

d) As rações de combate normais voltaram a ser um elemento destruidor do moral das NT. Provocando a sede quando menos água há. Temendo a sede, os homens deixam simplesmente de comer e ficam rapidamente exaustos.

e) A Op Lança Afiada decorreu durante 11 dias. As temperaturas verificadas neste período foram as seguintes: Máxima à sombra – Entre 39 e 43,6 graus centígrados; Máxima ao sol – Entre 70 e 74,5 graus centígrados. Estes números são elucidativos. Por um lado justificam que um homem necessite muita água (entre 8 a 10 litros por dia). Por outro lado aconselham as NT a deslocarem-se e a actuarem ou de noite ou ao amanhecer. Entre as 11 e as 16h, o melhor é parar, se possível à sombra.

10. Não será talvez exagerado afirmar que o IN ficou desorganizado e que as destruições operadas pelas NT vão criar-lhe grandes problemas.

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(1) Título de um poema de L.G., (re)publicado no Blogue-Fiora-Nada... e Vão Dois > 28 de Setembro de 2005 > Blogantologia(s) II - (5): War is over, baby!

(2) Vd. as partes anteriormente publicadas neste blogue:


9 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCLXXXIII: Op Lança Afiada (1969): (iii) O 'tigre de papel' da mata do Fiofioli

9 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCLXXXI: Op Lança Afiada (1969) : (ii) Pior do que o IN, só a sede e as abelhas

15 de Outubro de 2005 > Guiné 63/74 - CCXLIII:Op Lança Afiada (1969): (i) À procura do hospital dos cubanos na mata do Fiofioli

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