07 abril 2006

Guiné 63/74 - DCLXXX: CCAÇ 5 - Os Gatos Pretos de Canjadude (José Martins)

Post nº 680 (DCLXXX

Guiné > Região do Gabu > Canjadude > CCAÇ 5 > Brazão da unidade

© José Martins (2006)


História da Companhia de Caçadores nº 5 - Os Gatos Pretos de Canjadude (por José Martins, ex-fur mil transmissões, CCAÇ 5, 1968/70)

Caros amigos

Alguns contributos para a história das unidades da Guiné. Ainda faltam muitos elementos, nomeadamente situados nas datas de 1 de Abril de 1967 a Janeiro de 1970 e após Julho de 1973.

Tenho nomes e factos, mas toda a colaboração é benvinda.

Um abraço

José Martins

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A legislação publicada em 16 de Agosto de 1895 retirou a feição administrativa policial às tropas ultramarinas.

A Conferência de Berlim, realizada entre 15 de Novembro de 1884 e 26 de Fevereiro de 1885, estabelece que nos territórios descobertos e colonizados em África, entre os quais se encontrava o antigo ultramar português, é abolido o direito de posse obtido pelo descobrimento, passando a vigorar o direito de posse por ocupação efectiva, dando voz ao interesse das potências que não tinham territórios no continente africano.

Há referências a diversas unidades existentes na Guiné, constituídas por tropas indígenas enquadradas por oficiais e sargentos pertencentes aos quadros coloniais, e designadas como:
· Exército de Terra
· Companhia de Guerra de Angola e Guiné
· Companhia de Infantaria da Guiné
· 1ª Companhia Indígena de Infantaria da Guiné
· 2ª Companhia Indígena de Infantaria da Guiné
· 2ª Companhia Indígena Mista de Artilharia e Infantaria da Guiné.

A partir de 14 de Novembro de 1901, data da remodelação da Organização Militar do Ultramar, que contemplava as experiências obtidas nas Campanhas de África de 1895, existe diversa legislação que, além de dispersa, se aplicava, normalmente, a uma só Província Ultramarina.

Em 10 de Junho de 1926, o Decreto-Lei nº 11746, na sua Base VI, visa extinguir os quadros privativos coloniais, avançando na unificação dos Exércitos Ultramarino e Metropolitano. No entanto, as forças militares das províncias ultramarinas continuam a ter a sua estrutura assente em quadros oriundos da metrópole que enquadravam militares do recrutamento provincial.
Os Decretos-Leis nºs 425654 e 43351 de 7 de Outubro de 1959 e 24 de Novembro de 1960, respectivamente, definem e desenvolvem o que deveria ser o Dispositivo Militar Metropolitano e Ultramarino.

Para a Província da Guiné, constituída como Comando Territorial Independente, além do Quartel-General, estava previsto a existência de quatro companhias de caçadores e uma bateria de artilharia de campanha. Além destas unidades, as províncias ultramarinas eram reforçadas com unidades expedicionárias, idas da metrópole, de acordo com as necessidades e/ou a situação de cada província.

No início das Campanhas de África (1961-1974) havia a 1ª Companhia de Caçadores e a 4ª Companhia de Caçadores. Para completar o dispositivo previsto faltava constituir, ainda, duas companhias de caçadores.

Em 1 de Fevereiro de 1961, constitui-se um pelotão, adstrito à 1ª Companhia de Caçadores, que viria a ser o embrião de uma nova unidade. Assim, com um dispositivo de 2 pelotões, foi criada a 3ª Companhia de Caçadores Indígenas que, em 1 de Agosto de 1961, foi colocada em Nova Lamego, ficando integrada no dispositivo de manobra do Batalhão de Caçadores 238, estacionada em Bambadinca que tinha à sua responsabilidade o Sector Leste, que abrangia os concelhos de Bafatá e Gabú (Nova Lamego).

Esta nova companhia de recrutamento local, enquadrada por metropolitanos, deslocou efectivos para Piche e Pirada. Posteriormente, deslocou forças para guarnecer as povoações de Buruntuma, Bajucunda, Cabuca e Canquelifá. Efectuou diversas operações de patrulhamento nas regiões de Beli e Madina do Boé, onde instalou dois pelotões em 6 de Maio de 1963. Destacou ainda, em diversas ocasiões e de acordo com as necessidades operacionais, forças para reforço ou guarnição de diversas localidades, além das já referidas, nomeadamente Geba, Contubuel, Canjadude e Cheche.

Em 1 de Abril de 1967 e no âmbito da reestruturação das unidades de recrutamento local já definidas no final da década de 50, passa a designar-se como Companhia de Caçadores nº 5 e fixa a sua localização em Nova Lamego, mantendo forças destacadas em Canjadude, Cheche e Cabuca.

Com a criação do subsector de Canjadude e integrado no dispositivo de manobra do Batalhão estacionado em Nova Lamego e responsável pelo entretanto criado Sector L3, foi a Companhia de Caçadores nº 5 transferida em 14 de Julho de 1968 para este subsector, do qual assumiu a responsabilidade.

Como a Unidade ainda mantinha pelotões a guarnecer os aquartelamentos de Cabuca e Cheche, foi o subsector de Canjadude reforçado pela Companhia de Artilharia nº 2238, que fez deslocar um grupo de combate para reforço da guarnição do Che-che em 4 de Julho de 1968. O dispositivo era complementado com uma Esquadra do Pelotão de Morteiros nº 2105 e o Pelotão de Milícia nº 254 da Companhia de Milícias nº 18.

Com o fim da Operação Mabecos Bravios, realizada entre 2 e 7 de Fevereiro de 1969 e que procedeu à retirada da guarnição do aquartelamento de Madina do Boé e do destacamento do Cheche, junto ao Rio Corubal, a guarnição deste destacamento reuniu-se à sua unidade em Canjadude.

Quando em 20 de Abril de 1969, o grupo de combate destacado em Cabuca foi rendido por outra unidade, e a CART 2338 foi transferida para Nova Lamego, o aquartelamento de Canjadude passou a dispor da totalidade dos elementos da CCA5 5, passando a ser a unidade de fronteira com a zona do Boé, a partir de Nova Lamego.

Como todas as unidades em quadrícula, teve a seu cargo o reordenamento da povoação de Canjadude, com a construção de casas em adobe e, no início, cobertas de capim. Em 1969 iniciou, em local construído para o efeito, as aulas para as crianças e escola regimental, que eram leccionadas, respectivamente, pelo sargento enfermeiro e o sargento de transmissões. Posteriormente, e com melhor organização, foi constituído o Posto Escolar Militar nº 45, tendo nele leccionado além de vários oficiais e sargentos, soldados de Acção Psicossocial.

Esta unidade sempre dispôs de praças do recrutamento provincial, não só nas especialidades combatentes mas também em vários serviços, à excepção de transmissões. Só em Junho de 1973 foi aumentado ao efectivo um soldado do recrutamento local com a especialidade de Transmissões de Infantaria.

No que respeita a sargentos, desde o início da unidade até Outubro de 1970, teve ao seu serviço um 2º Sargento Enfermeiro, do recrutamento local, que prestou inúmeros serviços não só aos militares, mas também à população civil. Só em Maio de 1973 é que foram colocados cinco Furriéis Milicianos do rutamento local com a especialidade de Atiradores.

A Companhia de Caçadores nº 5 teve como comandantes:
- o Capitão Miliciano de Infantaria Barros e Silva (Abril de 1967 -Junho de 1968);
- o Capitão de Cavalaria Pacífico dos Reis (Junho de 1968- Setembro de 1969);
- o Capitão de Infantaria Ferreira de Oliveira (Setembro de 1969-Março de 1970);
- o Capitão de Infantaria Gaspar Guerra (Março de 1970- Maio de 1970);
- o Capitão de Infantaria Silveira Costeira (Maio de 1970-Abril de 1972);
- o Capitão de Cavalaria Figueiredo de Barros (Abrild e 1972-Maio de 1973);
- e o Capitão Miliciano de Infantaria Silva de Mendonça (Maio de 1973-Agosto de 1974).

Como comandantes interinos houve vários Alferes Milicianos que assumiam o comando na ausência e/ou impedimento dos titulares.

Apesar da vasta Zona de Acção que tinha de patrulhar, ainda em diversos períodos de 1970 e 1971, destacou pelotões para reforço de Nova Lamego, Buruntuma e Copá, cuja ausência se reflectiu no estado psicológico e de estado de saúde geral, devido ao esforço dispendido, apesar de os patrulhamentos não poderem ser efectuados por períodos longos nem muito para além das áreas adjacentes ao aquartelamento.

Nas diversas operações que efectuou ao longo do período da sua existência, destacam-se a intercepção de um grupo IN que atravessava o Rio Corubal, num barco pneumático, cujos ocupantes foram abatidos ou se afogaram na tentativa de fuga, e outra na região do Siai em que se destaca a captura de 70 granadas de armas pesadas, 10 minas e 650 quilos de munições de armas ligeiras.

De composição maioritariamente da etnia Fula instalada em chão Mandinga, registaram-se alguns atritos com a população civil, nomeadamente após o ataque ao aquartelamento de Canjadude efectuado em 3 de Agosto de 1970 e, quando na época seca, os civis fechavam os poços para que os militares não pudessem utilizar a água, mas que foram rapidamente sanados.

O número de militares que passaram por esta unidade deve rondar o milhar, correspondendo três quartos destes a efectivos do recrutamento local.

Quanto a baixas teve, no período da sua existência, 16 mortos em combate ou por doença, incluindo 5 metropolitanos, sofrendo ainda, no período de Janeiro de 1970 a Julho de 1973, pelos registos existentes, 23 feridos dos quais alguns tiverem de ser evacuados para o Hospital Militar de Bissau.

À Companhia de Caçadores nº 5 foi conferido um louvor pelo Comandante do Batalhão de Caçadores nº 2893, em Ordem de Serviço nº 231 de 7 de Setembro de 1971, tendo o mesmo sido considerado como concedido pelo Brigadeiro Comandante Militar, por despacho de 18 de Outubro de 1971.

Grande parte dos elementos da unidade foram louvados pelo seu comandante em exercício, sendo a maior parte destes considerado como concedidos pelo Comando do Batalhão e muitos destes foram considerados como concedidos pelo Brigadeiro Comandante Militar. Em 1967 um dos soldados africanos foi condecorado com a Cruz de Guerra de 4ª Classe.

Em 20 de Agosto de 1974 e já na fase de retracção do dispositivo, depois de todos os militares do recrutamento local terem passado à disponibilidade, foi o aquartelamento de Canjadude desactivado e entregue aos militares do PAIGC, sendo extinta a Companhia que usou como emblema as armas da Guiné Portuguesa, tendo sobreposto um GATO PRETO e usando a divisa JUSTOS E VALOROSOS.


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Bibliografia:

Resenha Histórico-Militar das Campanhas de Africa (1961-1974) Edição do Estado Maior do Exército – 1º Volumes; 3º Volume, 7º Volume (Tomo II) e 8º Volume (Tomo II – Livros 1 e 2).

Meio Século de Lutas no Ultramar do Tenente-coronel BELLO DE ALMEIDA – edição da Sociedade de Geografia de Lisboa – 1937

C.Caç 5 – História da Unidade - Arquivo Histórico Militar.

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