16 maio 2006

Guiné 63/74 - DCCLXIII: Do Porto a Bissau (17): Finalmente entrámos em Sinchã Jobel (A. Marques Lopes)





Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Sinchã Jobel > 22 de Abril de 2006 > Bombas da Força Aérea Portuguesa que foram lançadas sobre a base do PAIGC, durante a guerra, e que não chegaram a explodir. Na foto de cima, o nosso amigo e camarada A. Marques Lopes.

Fotos: © Xico Allen (2006)

Texto de A. Marques Lopes, coronel DFA, na reforma, ex-alferes miliciano na Guiné (1967/68) (CART 1690, Geba, 1967/68; e CCAÇ 3, Barro, 1968)... Visitou recentemente a Guiné-Bissau, num viagem de grupo organizada pelo Xico Allen...

Pois, camaradas e amigos, eu e o Allen acabámos por entrar na base do IN em Sinchã Jobel, que nunca foi tomada pelas NT, nem quando eu, sem querer, lá fui em 24 de Junho de 1967 (Op Jigajoga) (1), nem em 31 de Agosto de 1967 (Op Jigajoga II), nem em 16 de Setembro de 1967 (Op Jacaré), nem 15 e 16 de Outubro de 1967(Op Imparável), nem em 27 de Outubro de 1967 (Op Insistir), nem em 28 de Outubro de 1967 (Op Instar), nem em 19 de Dezembro de 1967 (Op Invisível) e nem em 21 de Dezembro de 1967 (Op Invisível II), a última que se fez para tomar essa base, comandada durante esse período por Lúcio Soares, como ele próprio me disse (2).

A clareira de Jobel (a tal onde sofri uma emboscada) tem agora uma tabanca (vd. fotos a seguir). Como chegámos lá? Fomos, eu e o Allen, até Sare Banda [vd. carta de Banjara] e aí encontrámos um homem que nos acompanhou, indicando-nos o caminho para Sinchã Jobel.





Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Sinchã Jobel > 22 de Abril de 2006 > Aspectos da actual tabanca, sita no local da antiga base do PAIGC.

Fotos: © A. Marques Lopes (2006)

Durante a guerra, Sare Banda era uma grande tabanca, fruto do reordenamento da zona, e onde esteve um destacamento da CART 1690. É agora pequena, vendo nós pelo caminho já várias outras tabancas, explicando-nos o homem que nos acompanhou que muita gente saíu de Sare Banda para formar outras tabancas. Naturalmente, é claro.

E chegámos a Sinchã Jobel, com alguma dificuldade, é verdade, pois existe para lá um simples carreiro. E eu cheguei à conclusão que seria mais fácil ter chegado à base se as NT tivessem ido por ali, apesar de a mata ser muito cerrada. Lá encontrámos o Dirami e o Mulé (2), dois ex-guerrilheiros daquela base e agora moradores na tabanca de Sinchã Jobel.




Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Sinchã Jobel > 22 de Abril de 2006 > A actual tabanca fica a 200 metros da antiga base do PAIGC.

Foto: © A. Marques Lopes (2006)








Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Sinchã Jobel > 22 de Abril de 2006 > Antiga base do PAIGC. Está-se ainda em plena época seca.

Fotos: © A. Marques Lopes (2006)

Disse o Dirami que conseguiram rebentar várias, mas aquela que vimos não tinham conseguido... e lá está ainda. Muitas delas, eu já sabia, rebentavam nas árvores, outras batiam nelas e caíam sem rebentar, porque já não caíam da forma adequada para rebentarem as espoletas.





Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Sinchã Jobel > 22 de Abril de 2006 > Vestígios ainda bem visíveis, nas árvores, dos bombardeamentos feitos pela Força Aérea Portuguesa.

Fotos: © A. Marques Lopes (2006)

Duas coisas nos indicou o Dirami:

(i) uma, está ele de cócoras, "ali em frente, no tronco daquele poilão era o posto de vigia" (as NT disseram que eles estavam em cima das árvores, mas o que sucedia é que o vigia começava logo a disparar assim que nos via entrar na clareira);



Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Sinchã Jobel > 22 de Abril de 2006 > Local onde se situava o posto de vigia ou sentinela dos guerrilheiros, segundo indicação do Dirami.

Foto: © Xico Allen (2006)


(ii) outra, está ele a dizer-me (vd. foto do cemitério, tirada pelo Allen), "aqui, por baixo destes arbustos está um poço, para onde lançávamos os mortos, pois não havia tempo para fazer covas individuais", e está lá o poço, coberto de arbustos e já tapado com terra;

(iii) e - eu cá para mim - que "lá estarão os corpos do soldado Agostinho Francisco da Câmara, morto em 16 de Outubro de 1967 (3), e do alferes Fernando da Costa Fernandes, morto em 19 de Dezembro de 1967 de Dezembro de 1967, corpos esses que não foi possível recuperar durante as operações feitas nessas datas" (4).




Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Sinchã Jobel > Local onde se situava o poço, agora tapado, para onde eram lançados os cadáveres.

Foto: © Xico Allen (2006)

E ficou-me também a pena de as cabeças pensantes que mandavam na guerra terem insistido em várias operações, a começar nas bolanhas de Sucuta e Canhagina [vd. carta de Bambadinca] e na travessia do rio Gambiel, quando teria sido mais fácil e, se calhar, eficaz terem feito o caminho que eu fiz agora, tanto mais que em duas daquelas operações entrou a tropa especializada dos comandos. Coisas.

Abraços

A. Marques Lopes
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Notas de L.G.

(1) Vd. post de 30 de Maio de 2005 > Guiné 69/71 - XXXV: Uma estória de Sinchã Jobel ou a noite em que o Alferes Lopes dormiu na bolanha (1967)

(2) Vd post de 16d e Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCLXI: Do Porto a Bissau (16): Encontro com o IN (A. Marques Lopes)

O comandante Lúcio Soares tem agora 64 anos. Copm 25 anos, era o comandante de Sinchã Jobel, base que foi montada em maiod e 1967. O comissário político era o Gazela (que morreu há cerca de dois meses). No princípio de 1968, Lúxio Soares saíu para ir comandar a base do Morés, passando o Gazela a comandar Sinchã Jobel. Em 1970 o Gazela foi para sul, para a zona de Empada.

"Após o 25 de Abril integrou o grupo do Pedro Pires, em Londres, para negociar a formalização da independência. Mais tarde foi Ministro da Defesa no governo de Luís Cabral. Após o golpe de Nino Vieira, em 1980, exilou-se em Cabo Verde, onde esteve durante 14 anos. Regressou depois e está, agora, reformado como coronel (mantem o nome comandante porque é histórico" (...).

(3) Vd post de 3 de Junho de 2005 > Guiné 69/71 - XL: Sinchã Jobel IV, V e VI (A. Marques Lopes)

"17. Op Imparável. 15 de 16 de Outubro de 1967:

(...) "A operação foi comandada do PCV (Posto de Controlo Volante) pelo Comandante do Agrupamento. O Agostinho Francisco da Câmara (e não Camará), morto na operação, era açoriano e do meu grupo de combate; o Armindo Correia Paulino, aqui referido, também era do meu grupo de combate, o Bigodes, como lhe chamávamos, um minhoto que foi, mais tarde, aprisionado pelo PAIGC em Cantacunda e que acabou por morrer no cativeiro, em Conakry" (...)

(4) Vd. post de 5 de Junho de 2005 > Guiné 69/71 - XLV: Sinchã Jobel VII (A. Marques Lopes)

"22. Op Invisível. 16 de Dezembro de 1967

(...) “Começou também nessa altura o IN a fazer fogo com o Mort 82, com que abateu o alferes miliciano Fernandes. Verifiquei que nessa altura já o Dest B tinha as seguintes baixas: Alferes Miliciano Fernandes, 1º. Cabo Sousa da CART 1742 (que estava a fazer fogo com a ML MG-42), soldado metropolitano Fragata e um soldado milícia que não consegui identificar, além de vários feridos.

“Procurei trazer o alferes miliciano Fernandes para a rectaguarda, e quando o puxava pelos pés, fui surpreendido por um grupo IN, que corriam em direcção aos furriéis milicianos Marcelo e Vaz e em minha direcção gritando que nos iriam apanhar vivos. Note-se que neste grupo IN avistei elementos brancos os quais usavam o cabelo bastante comprido (a cobrir as orelhas), facto também confirmado pelos já citados furriéis milicianos. Devido a tal, tive que abandonar o corpo do alferes Miliciano Fernandes e retirar" (...).

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