25 maio 2006

Guiné 63/74 - DCCXCI: Todos camaradas, mas uns mais do que outros ? A propósito do assassínio de Amílcar Cabral (João Tunes)

Post nº 791 (DCCXCI). Texto de João Tunes, de 23 de Maio último:

Caro Luís,

Julgo que a lista dos fuzilados pelo PAIGC que lutaram, ao nosso lado, pelo Portugal do Minho a Timor, não se deve esgotar nos actos pós-independência.

Porque os crimes contra a humanidade nunca prescrevem. Houve mais fuzilados pelo PAIGC sem julgamento decente. E, na minha opinião, eles devem entrar na lista que porfiamos em recordar para memória futura e homenagem retroactiva.

Em 1973, os mandos de Portugal (comando militar e PIDE) conseguiram o feito de assassinarem Amílcar Cabral, o turra-mor. Foi uma operação urdida com sucesso (ao contrário da Operação Mar Verde). Nesta operação, a PIDE conseguiu infiltrar o PAIGC e explorando os ressentimentos de alguns combatentes guineenses contra os seus camaradas caboverdianos, levou a bom termo a sua missão: Amílcar caiu em Conacri, fuzilado sem julgamento e pelas balas de combatentes ressentidos, preparados e pagos pela PIDE ao serviço de Portugal.

E só por uma unha negra, o sucessor de Amílcar, Aristides Pereira, não foi entregue em Bissau, então nossa, provavelmente para o competente e juridicamente assistido julgamento. Amílcar Cabral foi assassinado mas daí pouco se passou. Nada mau, como saldo. Acontece que os nossos aliados, os nossos infiltrados, ao nosso serviço, ao serviço de Portugal do Minho a Timor, nossos camaradas portanto, falhado o clímax da operação (a liquidação de todos os caboverdianos, o controlo do PAIGC pela facção guineense e a sua integração na Guiné Melhor), foram apanhados pelo aparelho de segurança interna do PAIGC e fuzilados (sem julgamento). Terão sido 50 (cinquenta) esses nossos camaradas em missão de infiltração e aniquilamento que caíram sob as balas da justiça revolucionária, iníqua porquanto não precedida de julgamento segundo as regras da civilização cristã e ocidental que espalhámos pelas sete partidas.

Segundo depoimento de Mário Pinto de Andrade (que, em tempos, publique no meu blogue) terá sido Vasco Cabral (dirigente do PAIGC e homem de Estado da Guiné-Bissau, falecido há pouco tempo e que não era caboverdiano nem familiar de Amílcar) que investigou a conspiração, a desmantelou e depois assassinou todos esses nossos queridos e saudosos camaradas. No mínimo, seria injusto não lhes recordar, pelo menos, os nomes e a missão em que tombaram.

Julgo de elementar justiça que os nomes destes nossos 50 camaradas fuzilados sem julgamento (talvez o Leopoldo, o Jorge e o Pepe nos ajudem a encontrar a lista dos seus nomes), renegados do PAIGC mas combatentes por Portugal, se juntem, na mesma homenagem e recordação, à lista dos comandos, outros militares, milícias e agentes e informadores da Pide caídos em fuzilamentos selvagens na pós-independência às mãos dos mesmíssimos facínoras e gente com aversão a julgamentos juridicamente assistidos.

Ou uns são mais camaradas que outros? Por mim, nem pensar.

Abraços com saudações patrióticas do

João Tunes

Sem comentários: